sábado, 23 de janeiro de 2016

O petróleo e a economia russa


                                 
       Seria previsível que o ambicioso Vladimir V. Putin, com planos para recuperar o antigo status da União Soviética - e não mais ouvir de líderes estrangeiros, como Barack H. Obama, que a Rússia é um poder regional - fosse topar com dificuldades, eis que os grandiosos projetos da Federação Russa estão indo bastante além dos meios disponíveis.

       Desde os tempos da União Soviética que o petróleo representa a mola mestra na sua economia. Quando o preço do ouro negro despencou nos anos oitenta do século passado, e permaneceu nesse patamar,  tal constituíu um dos principais fatores para a dissolução da URSS, que surpreendeu o mundo e se completou em 1° de janeiro de  1992.

       As virtuais monoculturas - países que se sustentam em grande parte por um só produto ou commodity - tendem a sofrer séria crise se desaba o valor de mercado da referida mercadoria.

       É o que está acontecendo com a Rússia. Tal se deve precipuamente à circunstância de que o orçamento federal do Kremlin é alimentado em 50% pela exportação de petróleo e gás.

       Depender de uma fonte externa em tal montante representa limitação enorme às possibilidades da respectiva economia. O preço do petróleo - que é a commodity que mais recursos movimenta na economia mundial - está submetido a verdadeira gangorra entre a planície das baixas cotações e as alturas estonteantes dos preços do barril na barra dos três dígitos.

         Agora deparamos uma guerra de preços em que a Arábia Saudita - a maior produtora mundial  - através da respectiva produção maciça almeja tirar do mercado - ou aparar-lhe as asas - concorrentes com produtos elaborados com sucedâneos do petróleo (xisto, v.g.)[1].  Sofrem, por conseguinte, países cuja produção é relevante para as respectivas economias, mas que não tem magnitude para influenciar o mercado, como acontece com a monarquia saudita. Este é problema típico das monoculturas - e nós podemos dizer algo a respeito, visto que, no passado, nossa economia dependeu deste tipo de regime econômico (pau-brasil, açúcar, ouro e café).

          Compreende-se, assim, os problemas de Nicolás Maduro, dado o sufocante predomínio do petróleo na economia venezuelana, os recursos decrescentes, a hiperinflação, y otras cositas más da incompetência dos regimes sindicalistas como o chavismo. Também a Rússia de hoje lembra a fábula da formiga - que poupava - e da cigarra - que cantava e gastava...

          A ambição de gospodin Vladimir Vladimirovich Putin - e a respectiva arrogância - parecia não ter limites. Além de desestabilizar a Ucrânia - com longa guerra de usura, através da coordenação de antigas veleidades secessionistas na parte oriental desse importante país (a que o Ocidente e a União Européia deveriam tratar com mais respeito, dado o seu significado estratégico), explosão essa que foi coordenada por Putin, logo após a derrubada do corrupto presidente filo-russo Viktor Yanukovich (2013-princípio 2014), pela sublevação da Praça Maidan, em Kiev.

           Depois de assenhorear-se da Criméia, em operação que seria elogiada pelo seu admirado modelo, o Duce Benito Mussolini, se vivo estivesse, Putin partiu para ulteriores desestabilizações. Além das sanções que lhe foram impostas pela ilegal anexação da península da Criméia, o Senhor do Kremlin seria indiretamente responsabilizado pela derrubada por míssil de fabricação russa de voo MH17 da Malaysian Airlines com 298 pessoas a bordo.

           Ultimamente, Putin interveio na interminável guerra civil na Síria. Essa presença se realiza sobretudo por ataques de caças russos contra os rebeldes que se defrontam com a ditadura de Bashar al-Assad, mas tem igualmente colaborado em incursões contra o Estado Islâmico, que se apoderou de terras da Síria. Além de bancar de certa forma o seu protegido Assad, Putin constrói outra base militar russa no litoral sírio do Mediterrâneo oriental, e nada disso (intervenção aérea, apoio a Bashar, construção de bases) é de graça.

           É de notar-se que tais cometimentos financeiros - na política de grandeza da potência russa - foram assumidos em dezembro de 2015, quando o barril de petróleo valia US$ 50.

           Em função do déficit orçamentário - afinal os recursos são finitos, mas os dispêndios pelo visto não o são. Compreende-se que, nesse quadro financeiro, a inflação ande pelos vinte por cento, ou talvez mais.

           Entende-se, igualmente, que as aventuras no estrangeiro - mesmo aquele ominosamente descrito pelo governo russo como o estrangeiro-próximo, custam preciosos rublos (ou até mesmo dólares!) - sangrem o Tesouro do ambicioso Vladimir Putin. E tampouco se podem ignorar as despesas de prestígio, como os cinquenta bilhões de dólares gastos para realizar as Olimpíadas de Inverno em 2014, em Sochi, além da construção de estádios de futebol para a Copa do Mundo de 2018 (também a ser sediada na Rússia).   

             Seria, decerto, benesse para Kiev, capital da Ucrânia, e para seu atribulado presidente, Petro Poroshenko, que os azares da bolsa petrolífera determinassem - junto com as sanções que ainda perduram - relativa carência nos fundos do Tesouro do Kremlin. Cessariam ou diminuiriam de forma sensível os recursos à disposição de gospodin Putin, que se veria, dessarte, cerceado nas próprias fumaças de poder, com que até o presente não pouco tem atazanado alguns de seus infelizes vizinhos.

 

( Fontes: The New York Times, The New York Review, George Soros )



[1] e portanto com custos de produção necessariamente mais elevados.

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