segunda-feira, 11 de janeiro de 2016

O duplo desafio da Guerra na Síria


                                  
         Estados Unidos e Rússia se sentaram à mesa de negociações, e pensam atender aos próprios interesses. Ao mesmo tempo, como feliz consequência de seus trabalhos diplomáticos, quem sabe Washington poderá dispensar, ainda que colateralmente, e com a boa vontade do Kremlin, a necessária atenção à situação humana nos núcleos populacionais cercados pelo tirano Bashar al-Assad. Este senhor, é bom que se lembre, pela sua rigidez, é o principal causador desta longa, plurianual guerra civil. A ela prestantes acorreram, além das duas principais potências (após a conveniente espera), outras menores como o Irã, dos ayatollahs, bem como a milícia Hezbollah, de Nusrallah. Essas últimas pensam menos na gente envolvida, mas sobretudo na sustentação do presidente alauíta, próximo dos xiitas e peça para elas importante, que não desejam abandonar no embate com os sunitas da Arábia Saudita, e a seus aliados da Liga Árabe.

        E o que pensa o povo sírio,  ao se ver dilacerado, transformado em carne de canhão e em reféns de conflito sem quartel, que os condena - aos que podem escapar - à fuga para o Ocidente, como se acaba de presenciar nesta debandada para bem além do cinismo e da impiedosa caça que os senhores da guerra tentam impor-lhes, ao  visitar-lhes  sem mercê através de longa rota de desterro quase sem esperança.

       De tudo lhes ocorreu. Do bebê de colo, afogado e morto em praia oriental, por capricho das precárias embarcações de malograda travessia, aos infelizes trânsfugas, metidos em carro frigorífico e mortos nas cercanias de mais um homem forte, este Orbán, da Hungria, que, como tantos outros, não esconde a própria xenofobia.

       Em todo o Ocidente, dos Estados Unidos para as Nações da União Européia, cuja lembrança dos refugiados não está assim tão fria, eis que o círculo de Bruxelas não teve imunes os próprios povos no último grande conflito - de que os respectivos avós poderão lembrar se perguntados - pensou-se mais nos respectivos comodismos, do que em um instante de atenção a povo fustigado por conflito alheio, em que grandes e pequenos projetos se defrontam.

       Em toda a União Européia, no jogo de empurra de Bruxelas, somente uma solitária governante assumiu o respectivo humanitário compromisso. Como presciente o afirmou o professor Michael Ignatieff - V. blog 'A questão dos refugiados', de 2/01/16 - a Chanceler Angela Merkel se dispôs de forma incondicional a acolher a massa de fugitivos do inferno sírio.  Fê-lo consciente do risco em que incorria, ao respeitar os direitos humanos de toda a massa de gente tangida por desgraças determinadas por outrem.

       Esses riscos se tornaram patentes ao ensejo da entrada do Ano Novo, com os distúrbios e os abusos e crimes cometidos por alguns  refugiados com mulheres alemãs. Como assinalado pelo articulista, a Alemanha - posto que sem responsabilidade alguma pelo drama na Síria, não se negou a acolhe-los - ao contrário de quase todos os demais, nisso incluídos os EUA e as principais potências, que dispensaram muito pouca guarida a tais infelizes, malgrado a circunstância de que tenham, em vários casos, muito a ver com o agravamento da situação.

         O Ditador al-Assad tem a proteção de Vladimir Putin, e a sua recepção pelo Tribunal Penal Internacional parece hoje postergada para as calendas gregas. No entanto, não é pequena a própria responsabilidade em termos de direitos humanos. Exemplo disso é a cidade de Madaya, bastante cerca da fronteira libanesa. Os 42 mil habitantes de Madaya vem sendo punidos pelo cerco das forças pró-Assad, com a consequente falta de alimentos e remédios, eles que são transformados em massa de manobra por estarem em cidade sob controle dos rebeldes. Eles nada têm a ver com isso, mas pagam o pesado preço de serem reféns virtuais.

         Entrementes, prosseguem as negociações entre o Ministro John Kerry, do State Department, e o Ministro do Exterior Russo, Sergei Lavrov, sobre as condições de paz. Para Assad, os infelizes habitantes da Síria, dilacerada pela infinda Guerra Civil, são meros peões, que podem ser úteis, dentro do cínico cálculo, apenas através da chantagem humanitária do Ditador de Damasco. Para quem se serve de doenças como a poliomielite, e de outros problemas sanitários como assistentes nessa guerra suja, não há de estranhar que Assad vá deter-se um só momento para tratar de inocentes (quando esses lhe podem servir negativamente, através da chantagem humanitária).

            Entre outras lembranças úteis, há vários países - e dentre esses, a Jordânia, do Rei Abdullah II - cuja situação sanitária se vê ameaçada, e, por conseguinte, a própria estabilidade política, eis que essa pequena nação se viu forçada a acolher afluxo de refugiados muito superior à própria  capacidade. Nesse contexto, a situação política do governo jordaniano se vê um tanto periclitante, pelos desafios de atender massas para as quais as próprias redes de apoio do reino hashemita não estão preparadas.

 

( Fontes:  The New York Times,  The New York Review )

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