quarta-feira, 6 de janeiro de 2016

A Encruzilhada Brasil


                      

                  A quem tem olhos para ver e  cabeça para entender, não escapará o que está afinal acontecendo na América Latina. Depois da longa noite do regime militar, da  luta comprida para trazer a alvorada da democracia, surge entre os rivais por adentrar as cálidas, sedosas promessas na alcova do poder o assistencialismo sindical.

                  A vaga populista  passará por  movimento do proletariado, açulado pelos demagogos de plantão, supostamente sem preconceitos quanto aos meios e modos de chegar às instâncias dos meios do poder, se possível sem limites, e se for o caso, com a flexibilidade necessária para concluir arreglos e contubérnios, meros biombos democráticos, de que a seu tempo pensam desfazer-se.

                  A história da América Latina continua triste. Nesse vasto e fértil campo, eles deixam por um tempo arar a lavoura democrática. Dentre os pretendentes à cobiçada alcova, à falta do campeão dos muitos enganos e do certeiro golpe, poderá empolgar a dama de turno do poder aquele que diante dos obstáculos melhor saberá ou envolvê-los, ou superá-los, atendido e sopesado o desafio que se lhe depara.

                 Há três histórias pelo menos nas Américas: ao norte, cresceu o poder anglo-saxônico, que se alargou do Atlântico ao Pacífico, levando de cambulhada os avanços à oriente de Espanha; no meridião, nas Américas do Centro e do Sul, Espanha e Portugal lançaram suas pretensões,  e ali se implantaram os herdeiros de portugueses e espanhóis. Na América do Sul e Central, coube o Pacífico aos descendentes de Castela, com as numerosas culturas indígenas, que decairiam diante dos conquistadores; e no Atlântico, o português, com seu engenho e pertinácia, além do extenso litoral do continente Brasil, avançaria pelas entradas e bandeiras, à cata de ouro e pedras preciosas. Pelos imensos sertões o forte bandeirante, além do intrépido Pedro Teixeira que, em entrada grandiosa, assustaria aos meio-adormecidos súditos de Espanha nas alturas quitenhas.

                Dessarte, no ingente Sul e ao pé do Setentrião, os filhos de Portugal e Espanha criariam as nações respectivas. E ao Brasil, por graça da argúcia lusa, caberia a conquista de uma só Nação, que se estende do Oiapoque ao Chuí. Pelas aleias do governo, coube à fundação luso-brasileira, um país imenso e unido pela força inicial da legitimidade do regime dinástico. Enquanto aos filhos de Espanha e das civilizações maia, asteca, inca e aymará, couberam diversas regiões divididas pela tradição respectivas, e pelas sucessoras repúblicas, o prêmio alcançado pelo sagaz e providente colonizador luso seria o continente-Brasil, que o sangue de Pedro I e a pertinácia dos brasileiros saberia manter unido, no embate das porfias intestinas e nas levantadas cabeças de ocasionais regionalismos.  

                Mas na república brasileira que no lusco-fusco do século dezenove nasceria de um parto imprevisto, pela mão de um militar que organizaria a quartelada do quinze de novembro - e que estadista argentino deploraria como o passamento da "última república americana” - nas vascas da agonia da mais longa ditadura castrense que nos coube no imenso latifúndio de Latino America, repontaria  a cabeça do assistencialismo, encimado com as letras do Partido dos Trabalhadores.

                 O PT, jacobino sem sabê-lo,  foi anunciado com o abraço da intelligentsia e a bênção de corrente igrejeira. Pretendia falar pela voz de jovem dirigente sindical - que já tivera o batismo do cárcere - e foi por isso saudado com o antegozo de conquistas futuras. O nascente petismo prezava os gestos de efeito, como quando se recusou a assinar a Constituição de 5 de outubro de 1988, a Constituição Cidadã. A sua bancada era então diminuta, mas em postura que repetiria no futuro, negou-se a subscrever a Carta Magna. A facilidade com que enjeitava a nossa alforria democrática refletia um zelo que mais tarde se desfaria, quando o seu líder e a pequena bancada lograriam ser introduzidos, a posteriori, entre os subscritores que haviam na devida data, com a tinta ainda úmida do compromisso assumido, após a longa noite da ditadura militar.

                 O Brasil progredirá mais no bom caminho, quando os gestos valerão por si mesmo. É muito fácil dar-se ares de zeloso e intransigente, negando-se a firmar documento que correspondera ao desejo da Nação, para depois da noite do jeitinho, pedir a alforria de uma escusa, e firmar a Carta, como se nada fora, quando a jogada do zelo intransigente fora cercada pela indiferença geral. Quem nega apoio na hora do perigo e da decisão, está decerto intitulado a exibir a sua intolerância de princípio, mas não tem direito a vir depois adentrar os signatários da primeira hora, como se o vazio gesto da recusa fosse apenas para a arquibancada. Quando o Brasil deixar de ser a terra do jeitinho teremos avançado em termos de responsabilidade e de respeito aos nossos concidadãos.

                 A demagogia desses regimes, filhos ilegítimos do poder sindicalista e da corrupção, atravessa, graças à crise do chavismo, um momento difícil, que esperemos, pela felicidade de Latino-América, possa conduzir à vitória da democracia.

                 Na Venezuela, aquele povo sofrido - qual não é nessa América Latina? - votou plebiscitariamente por dar enorme maioria à oposição na Assembleia Nacional.  Maduro, esse caricatural caudilho, que arremeda o primeiro homem-forte daquele país, Hugo Chávez Frias,  tenta valer-se de seus serviços ilegais de segurança para arrochar de novo o poder.

                 No Brasil, o petismo, dentre os seus muitos crimes, está a entrega do Itamaraty a oportunistas e aos seus supostos intelectuais, como Marco Aurélio Garcia Lograram fazer, com ministros fracos, muita vez apenas máscaras de proa, que a diplomacia brasileira se adulterasse em uma versão sindicalista.  O que os militares tiveram a sabedoria de manter - como carreira de estado sabiam que não era inteligente intrometer-se na diplomacia de Rio Branco - o PT de Lula e, pior ainda, com Dilma Rousseff - que rebaixou a Casa do Barão (a mais baixa verba entre os 39 ministérios do regime petista) a funções lamentáveis, como aliar-se a Putin na conquista da Crimeia, abstendo-se na Recomendação da Assembleia Geral, no que contrariou a nossa Constituição (que proíbe guerra de conquista).

                  Ao abraçarmos o sindicalismo à outrance do PT,  e a cair nesses enormes déficits,  crianças abandonadas pela incompetência de Dilma, o Brasil com o governo petista está no mesmo plano dos ditadores Rafael Correa (Equador), Evo Morales (Bolívia) e até há pouco Cristina Kirchner.  O povo argentino recusou o peronismo, ao eleger o democrata Macri.

                  No Equador e na Bolívia, o braço do homem forte - que se eterniza em reeleições sucessivas - está aí, como mais um avatar da ditadura sindical.

                  Essa noite da demagogia do poder sindical cujas teias se estendem à Justiça e a um ambiente em que se cultua o medo como gerenciador de condutas, se apresenta tanto na Nicarágua sandinista, no Equador de Márquez, na Bolívia de Morales, assim como e  a fortiori no corrupto desgoverno de Maduro. O seu emproado Diosdado Cabello já não é mais presidente da Assembléia Nacional, e ele teme pela sua entrega à Justiça Americana, para que explique o que tem a ver com o Narco-tráfico.

                Já o incrível Maduro construíu a sua própria cova. Não podendo mais, como era costume chavista, estufar as urnas, no lusco-fusco das eleições (porque até mesmo as populações das favelas se recusam a permitir esse truque comum nos países árabes e africanos, com que se debocha das maiorias que condenam os desmandos dos ditadores),  se a aliança democrática que assumiu a direção da Assembleia Nacional tiver juízo o fim do chavismo está escrito naquela enorme parede que a História mantém sob os seus cuidados desde que Baltazar leu o mene tekel nas paredes da própria derradeira orgia.

                 Começa a soar a hora de que o Brasil não mais achincalhe sua gente, seu governo e  sua diplomacia com um regime que abre as portas para a inflação, e que pensa cavalgar a corrupção.

                 O Brasil, a começar pela própria antiga diplomacia, tem muito a orgulhar-se. Vamos fechar esse parêntese que só nos tem trazido inflação, corrupção e tráfico de influência. Pela sua condição, o regime petista a tudo corrompe.

                 O Brasil é grande demais para sucumbir às tentações de imitações rasteiras.

                 Vamos ter governo com capital maiúscula. Não carecemos de imitar regimes que só trazem a fraude, tanto nas eleições trucadas, quanto nos contubérnios com a mala vita e a corrupção.

 

( Fontes:  O Globo, Folha de S. Paulo )  

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