Não se poderia dizer que The Economist seja grande
amigo do Brasil. Mas na mídia, em termos de economia e política, as amizades ou
não contam, ou contam muito pouco.
Os fatos e os números não são cartas,
nem conchas que jogadas em mesa ou tabuleiro, possam encerrar esotéricos
números e composições, só abertos e legíveis para os luzentes olhos de magos e
videntes.
Por isso se a câmera do fotógrafo trouxe
para a capa da revista o rosto da Presidente Dilma Rousseff, com rugas nos
olhos, face e pescoço, na cruel, demasiada cercania da objetiva, a composição
se encaixa nas brancas letras do título A Queda do Brasil, e em tipo menor, Dilma Rousseff e o desastroso ano pela
frente.
No par de
gordas colunas de página inteira, se repetem as palavras da capa, e bastam duas
na concisão do inglês. Se em 2016 o Brasil deveria estar com disposição
exuberante à espera da primeira Olimpíada na América do Sul, ao invés disso enfrenta desastre político e econômico (o Economist não menciona o flagelo do zika
porque a revista é da primeira semana deste ano). Segue pequeno resumo dos
percalços: a agência Fitch rebaixa a dívida do Brasil para o status de lixo
(junk), o Ministro Joaquim Levy, designado por Dilma para estabilizar as
finanças públicas, abandona o barco em desespero. A previsão da economia é que
encolha 2.5-3% em 2016. Até a Rússia, apesar das sanções, deve sair-se melhor.
Ao mesmo tempo, a coalizão governante está desacreditada pelo escândalo do
Petrolão. E a Sra. Rousseff, acusada de ocultar o tamanho do déficit
orçamentário, enfrenta um processo de impeachment no Congresso.
Como o B do acrônimo Brics, se
presumiria que o Brasil esteja na vanguarda das economias emergentes. Ao invés,
defronta a disfunção política e talvez a volta para a inflação descontrolada.
Apenas escolhas difíceis poderiam recolocar o Brasil, mas a Sra. Rousseff não
parecer ter estômago para enfrentá-las.
O sofrimento do Brasil, como o de
outras economias emergentes, provem em parte da queda mundial nos preços dos
produtos de base. Mas Dilma e o seu esquerdista Partido dos Trabalhadores
tornaram muito pior uma situação ruim. No primeiro mandato, gastou de forma
extravagante e despropositada em pensões
mais altas e improdutivas vantagens tributárias para certas indústrias
(de bens de consumo durável). O déficit
fiscal inchou de 2% para 10% em 2015.
A gerência da crise não se
pode dar ao luxo de esperar por tempos melhores. A Dívida Pública está em 70% do PIB, o que é
muito grande para um país de renda média que queira crescer rápido. Por causa
de altos juros, o serviço da dívida corresponde a um pesado 7% do PNB. Por
outro lado, por causa do alto nível dos juros, o Banco Central não pode
recorrer com facilidade à política monetária para combater a inflação (hoje em
10.5%). Nesse sentido, o Brasil não tem outra escolha que a de elevar os
impostos e cortar as despesas.
Levy cortou as despesas discricionárias
em R$ 70 bilhões em 2015 e tornou mais estritas as exigências para o
seguro-desemprego. Mas não bastou. A recessão derrubou os rendimentos
tributários. Dilma pouco apoiou o seu Ministro da Fazenda, e o PT lhe foi
hostil. A oposição, cujo escopo é
derrubar a presidente, não tinha condições de cooperar.
O Economist tem esperanças de que Nelson Barbosa possa conseguir
melhores resultados como Ministro da Fazenda. Tem apoio do PT, e também poder
de barganha, porque a Sra. Rousseff não se poderia permitir perder outro
Ministro da Fazenda. O primeiro teste seria a CPMF.
Outro objetivo prioritário
seriam as pensões. Como não podem ficar abaixo do salário mínimo - e deve
notar-se que o mínimo subiu em 90% na última década o peso nas pensões aumenta
com as mulheres se aposentando aos cinquenta e os homens aos 55 - o Brasil paga
quase 12% do PIB para os aposentados, uma parcela maior do que o Japão, que tem
média mais alta de idade na população e é mais rico.
Mas o que precisa ser feito é muito
mais. O código tributário brasileiro exige que empresa manufatureira brasileira
gaste 2.600 horas por ano para cumprir com as obrigações desse intricado e
pouco manejável regime legal (o tempo exigido por seus equivalentes na América
Latina é 356 horas ). O código trabalhista brasileiro, baseado no fascista de
Mussolini, torna dispendioso para as empresas demitirem até mesmo empregados
incompetentes. Outro aspecto negativo é
a blindagem que a legislação nacional confere às firmas brasileiras, em termos
de concorrência. E o resultado é que,
entre 41 países com performance medida pela OCDE, a nossa produtividade manufatureira é a quarta
- se contarmos a partir do último...
São previsíveis, por
conseguinte, as dificuldades a serem enfrentadas para reformar o código
trabalhista e as pensões. Cerca de 90% das despesas públicas está protegido de
cortes, a começar pela Constituição de 1988. Dada a extrema dificuldade para a
reforma, o Brasil rivaliza no tamanho do setor público com os Estados europeus
pela própria ineficiência. O Estado no Brasil, pelo seu tamanho, é a principal
causa da crise fiscal.
Modificar essas
práticas enraizadas seria difícil para qualquer governo. No Brasil, isto fica
ainda mais difícil, por um meio aloucado sistema político, que favorece a
fragmentação partidária e a compra de votos (sic) além de atrair mercenários políticos que tem poucos
compromissos seja com o partido e o
programa. É baixo o limite para que um
partido entre na Câmara; hoje 28
partidos estão representados no Congresso. No entender do Economist, as intricâncias no sistema político-partidário podem
tornar muito caras as campanhas políticas, o que seria uma das razões porque os
políticos subtraíram somas tão grandes de dinheiro da Petrobrás.
Para o Economist, portanto, não há boas
perspectivas, apesar das qualidades de Nelson Barbosa, de ser otimista quanto a
uma reforma profunda. Os cidadãos votantes sentem
desprezo pelos políticos. A oposição deseja aprovar o impeachment de
Dilma, que o Economist considera uma batalha pouco razoável, e que poderia
dominar a agenda política por meses. O PT não tem apetite por austeridade e
lograr os três quintos de apoio necessário
nas duas Casas do Congresso para reformas constitucionais será
objetivo muito difícil de atingir.
A Imprudente Rousseff
Ao cabo, o Economist se pergunta e se a Sra. Rousseff falhar em implantar a
mudança? Como a maior parte da dívida do
Brasil está em moeda nacional, isso torna o default
(incapacidade de pagamento) improvável. Ao invés, o país poderia se livrar das
dívidas através da desvalorização inflacionária desse débito. A realização do Brasil tem sido tirar dezenas
de milhões de pessoas dos andrajos e das inconstâncias da pobreza. A recessão
poderá deter tal processo, ou mesmo começar a revertê-lo.
A esperança está em que o Brasil, que
alcançou estabilidade econômica e democrática, não caia de novo em crônica
desordem e mal-gerenciamento econômico.
(a continuar)
( Fonte: tradução do artigo principal de
'The Economist', datado de 2.01.2016 )
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