A África do Norte e o Jihad
Cresce e se intensifica a
cooperação entre os movimentos jihadistas no Norte da África. Nesse sentido, o
general David M. Rodriguez, que está à frente do Comando estadunidense para a
África, advertiu em declaração para o Congresso em março último da "existência
de uma larga rede, cuja coesão aumenta com afiliados e aderentes do Al Qaida"
que "continua a valer-se de regiões africanas subgovernadas e de
fronteiras porosas para treinamento e condução de ataques".
Meses
antes do ataque de 20 de novembro último, contra o Hotel Radisson Blu, que
matou, pelo menos, 19 pessoas, em
Bamako, na Capital do Mali, já se alertara sobre a atividade de
"terroristas com filiações a
múltiplos grupos" que "estão expandindo a sua colaboração tanto no
recrutamento e financiamento, quanto em treinamento e operações, seja dentro da
África, seja de forma transregional".
Tal
transferência de conhecimentos técnicos pode ser observada no aumento dos bombardeiros
suicidas (ou homens/mulheres bomba) na Líbia, Tunísia e Chade, e no
incrementado emprego dos i.e.d.s
(artifícios improvisados explosivos) no Mali, que, como se sabe,
surgiram na segunda fase da guerra do Iraque, com o emprego intensivo desses
mortíferos artefatos pelos rebeldes islamitas contra o Exército americano (cujos
veículos não dispunham então de blindagem adequada). Para o Pentágono a guerra
seria breve.
Há
varias formas e modalidades nessas alianças de circunstância, em que os grupos
mudam de forma, e por vezes se unem, ficando sob a asa de chefes mais poderosos e distantes.
Nesse contexto, verificou-se a
reunião - depois de cisma bastante difundido - entre os grupos norte-africanos
do Al
Qaeda e do Al-Mourabitoun. Esses
grupos atuam no Magreb, i.e. o Norte da
África, incluindo Marrocos, Argélia e Tunísia. A sua primeira anunciada
operação foi a já citada do Hotel Bamako.
Os
chefes dos dois grupos - Abdelmalek Droukdel e Mokhtar Belmokhtar, ambos
argelinos - segundo assinala a matéria
do New York Times têm lealdades que
se estenderiam além da África.
Como
se sabe, a sublevação de grupos radicais islâmicos na Argélia, começara nos
anos finais do século passado, e como os recentes ataques contra refinarias no
Saara o demonstram, continuam bastante vivos e com extensa rede de alianças.
Também
na Tunísia, os ataques contra estrangeiros e turistas continuam. O líder do
Ansar al-Shariah, Seifallah Ben Hassine, seria responsável pelo massacre de 38
pessoas (turistas na maioria) em centro praieiro turístico em junho último, e do
ataque ao Museu Bardo em Túnis, em março último, com a morte de outras vinte e
duas pessoas.
Os
dois argelinos e o tunisiano são veteranos do Afeganistão nos anos oitenta,
durante os quais no combate ao invasor russo se realizou o macabro treinamento
de tais futuros terroristas - como aqueles que voltaram para a Argélia e
estabeleceram rede de extermínio sobretudo no interior desse vasto país
norte-africano.
Os
três homens, antes leais a Osama bin
Laden, mantêm a sua professa lealdade para o presente líder do Al-Qaida, Ayman al-Zawahri, que tem igualmente base no Paquistão, como o seu antecessor que
foi morto pelos comandos da Marinha americana.
Como
se verifica, parte não-negligenciável da atividade terrorista desses grupos é de
atacar o turismo - sobretudo na Tunísia - e os museus de nomeada, como o Bardo,
em Túnis. O escopo precípuo de tais investidas contra turistas nas praias da
Tunísia - na Argélia, não há praias turísticas - assim como contra entidades culturais
tem a fria objetividade de quem deseja abalar bases e rendas desse país magrebino, o que deu
início com o auto-sacrifício de um vendedor ambulante à revolução da Primavera
Árabe, que tirou de seus pedestais os ditadores da Tunísia, da Líbia e do
Egito.
A Primavera
Árabe - que desencadearia também a insurreição e posteriormente a guerra contra
Bashar al-Assad, na Síria - se é apresentada como movimento malogrado, dada a
força de seu simbolismo se me afigura mais uma extensa vaga que tem derrubado
ou enfraquecido vários ditadores. No entanto, só um tolo poderia imaginar que
terras, como a argelina, submetidas há longos anos à aliança entre as forças
armadas e a corrupção, poderiam ser presa fácil para as legiões libertárias.
São vagas imensas essas que percorrem o Magreb, a África Subsaárica e a dita Arábia felix. A democracia virá mas,
infelizmente, ela não se implanta sem muito sangue e luta, e não só contra os
ditadores de plantão, mas tambem contra roubocratas que infestam a África
negra.
Droukdel, cujo bando foi desbaratado no Mali
em 2013, está escondido nas montanhas do desértico sul da Argélia. Por sua vez,
Belmokhtar e ben Hassine estão homiziados na Líbia - que, nos dias que correm,
infelizmente é viveiro de terroristas e de chefes de facções armadas, defronte
de um governo impotente e ineficaz (forte candidato a estado-fracassado).
A
França mantém na África negra laços de cooperação com cinco paises vulneráveis - Mauritânia, Mali, Níger, Burkina Faso e Chade.
Se foi cortado o laço colonial, persiste a presença das forças francesas como barreira
contra a subversão dos grupos guerrilheiros islâmicos. É um esforço ponderável do Estado francês,
haja vista os ataques sofridos por outros grupos, como a operação do Bataclã. Nessa área do Sahel e do próprio Saara, a
presença francesa se traduz em caminhões de 30 toneladas, com suprimentos de combustível
e alimentos, acompanhados por veículos blindados com canhões de 80 mm e um
caminhão médico.
A
presença do Ocidente não se restringe apenas à França. As Forças de Operações Especiais
estadunidenses atuam no Níger, bem como agora nos Camarões (batalhão com
trezentos homens) para defender o regime legal contra o Boko Haram, que se
infiltrou no país vindo da Nigéria.
O
trabalho principal do Ocidente é o de quebrar as comunicações e as linhas de
fornecimento do contrabando e do terrorismo, que provêm da Líbia, a qual virou,
após a queda do ditador Kadafi uma espécie de entreposto terrorista.
Tampouco é por acaso que o exército francês patrulhe essas linhas de
comunicação dos jihadistas com a Líbia.
A rota do contrabando de armas e droga vem do sul da Líbia, que as
forças francesas consideram como enorme 'autoestrada'
(os gauleses gostam muito de sua rede de autoestradas) para abastecer-se nesse 'super-mercado'
para armas.
Esta estrada atravessa regiões que testam a
capacidade humana de sobrevivência. São áreas desérticas remotas e sem qualquer
vestígio de implantação humana, com insuportável calor no verão e despojadas de
poços e quaisquer cursos d'água, em ambiente lunar, excetuada a insuportável canícula.
E, sem embargo de tais obstáculos, pequenos grupos de contrabandistas tentam atravessá-los várias vezes por semana.
Essa
operação anti-contrabando e de busca e apreensão, se assemelha segundo o
próprio comandante, o ten.cel. Étienne
du Peyroux, a missão no oceano. A área de operações é de quarenta mil km2, do
tamanho da Holanda, para os trezentos homens da dita missão.
Outras comparações que vem à mente são as
das forças da Legião Estrangeira, que atravessava os imensos espaços do Saara,
nos seus vários avatares - seja o rochoso, seja o arenoso.
Malgrado os esforços, os militares franceses raramente logram apreender
um comboio contrabandista. No entanto,
as suas operações provocam graves transtornos nos movimentos dos jihadistas (a
última apreensão foi em junho de 2015).
As
possibilidades de êxito são muito fracas. O chamado terrorismo tem crescido na
África e muito por causa da corrupção generalizada dos regimes, e do caos
relativo produzido por tais condições, que, no entendimento do coordenador do
comitê que monitora a atuação da Al-Qaida
"levam sempre ao terrorismo".
O que
mais preocupa é a atração que tais condições fornecem à vinda de combatentes
terroristas estrangeiros, sempre com a marca da Al Qaida. O Norte Africano e o Sahel é área com a extensão dos
Estados Unidos. A sua vulnerabilidade é evidente, fundada na pobreza das
populações, nos estados fracos, em que prevalecem as eleições trucadas. A base
da propaganda está pré-feita, dada a sua enorme vulnerabilidade, a indigência
de grande parte da população (que a
torna campo fértil para a pregação islamista).
A
corrupção abrangente, as eleições trucadas apontam para a extensão da presença
da al-Qaida e as crescentes possibilidades de formação de Estados islâmicos.
O Boko-Haram é um gritante exemplo disso.
A insurgência dura há seis anos, matou dezessete mil pessoas e deslocou mais de
um milhão. No entanto, o Boko-Haram e
seu líder, Abubakar Shekau, receberam substancial aporte do Al-Qaida a partir
de 2010, e se reforçou em consequência. Sob tal influência, o Boko-Haram, em 2015, aderiu à fórmula do
Estado Islâmico. Desde o ano passado, ele se estende ao Chad,
Camarões e Niger.
O
compromisso francês - que se comparado a outros países é muito maior, se
atendidas as bases respectivas de recrutamento - tem levado suas forças também
ao norte, de onde contemplam o imenso espaço arenoso que separa tais frágeis
países ao presente entreposto do terrorismo islâmico, i.e., a Líbia. A raiz do problema estaria em boa parte nesse
desértico e igualmente imenso país, hoje
transformado em quase terra de ninguém,
dominada pelos grupos que derrubaram Kaddafi e implantaram o chamado caos, que
muito tem favorecido o desenvolvimento de laços humanos com o continente
europeu (a ver a perigosa travessia do Mediterrâneo em barcos disfuncionais,
que muito rendem para os traficantes dessa carne humana).
A pobreza, miséria e consequente ignorância são as parteiras da
corrupção e não só em África. Há muitos países envolvidos na criação de rede de
sustentação militar desses estados em torno do Sahel, em que a praga da
corrupção se alarga. Em seu entorno - que é gigantesco, como o referido artigo
apenas esboça - progridem de forma mais do que preocupante a al-Qaida e as suas concorrentes (como o
novo bicho na floresta, o ISIS), que
em muitos casos se multiplicam como se fossem verdadeiras franquias da receita
islamista. A África negra, com o al-Shabab
sediado em uma Somália que vive bem-obrigada como Estado fracassado (desde a
última década do século vinte), trazendo para a pós-modernidade o constrangedor
desafio de um núcleo da pirataria, modelo de governança que já atazanava os
cônsules romanos do final da República, com os conhecidos piratas da Cilícia...
Ao ver a corrupção em África, com os seus laços envolventes - que são
encontradiços, oh! surpresa, com visitas de dignitários de diversos países,
inclusive de Pindorama - e em certas estranhas práticas, como o perdão de
empréstimos tomados pelos gerarcas africanos até mesmo no dílmico Brasil (com o
nosso questionável perdão de divida de ditador corrupto africano) não serve só
de contraponto a essa luta ingente contra a invasão da África subsaárica pelas
franquias do mal.
Deveria também forçar uma luta mais pontual e incisiva contra a corrupção
e os desmandos (V. o presidente do Sudão, que escapa regularmente do encontro
com o Tribunal Penal Internacional, graças às conivências de tantos outros
governantes africanos) e não apenas essas heróicas expedições de militares
ocidentais, que intentam secar esse imenso e pútrido lago da corrupção.
Seria mais fácil de acreditar no real empenho do Ocidente em desmantelar
essas franquias do mal, se a corrupção institucional - de que Mobutu seria a
entidade protetora, dados os seus íntimos laços com o mesmo Ocidente - fosse
atacada com real firmeza pelos demais países. Não ignoro que há muitas
quintas-coluna (como antigamente se dizia) nesta força do bem.
Com menos hipocrisia e mais firmeza, se daria apoio muito mais forte à ingente
luta contra as forças bem-intencionadas, mas com objetivos malignos, ao invés
de recorrer a essas patéticas expedições de dedicados militares a cruzarem um
dos espaços mais inóspitos do planeta Terra.
E não é que com um pequeno passo se encetaria o comovente embate entre o
Bem e o Mal? Continuar-se-á a lutar
contra sombras, como dizem ser prática em Java, enquanto se continua a sangrar
o continente africano (entre outros)? E como fazer definhar as franquias do
Mal, com as suas leis de talião e respectiva hipocrisia, se não começamos a
escorraçá-los de suas bases. Principiemos a brincadeira mandando para a Haia no
TPI os bandidos com altos coturnos. Depois se pensa nos outros, enquanto a raia
miúda pode afinal respirar e viver como gente.
A Crise no Cofre carioca
A Terra da Cuccagna (a mítica paragem em que tudo está à disposição de
todos) não existe só na imaginação italiana.
O nosso governador Pezão terá pensado que o petróleo poderia continuar a
representar a fonte paratributária especial para o Rio de Janeiro. O pobre Sérgio Cabral muito sofreu com as invasões de privacidade e saíu do
poder com certa antecipação, acossado talvez pelas armadas das passeatas
(geradas por outras, em junho de 2013). Soaram então os primeiros epicédios
pela morte prematura do regime petista. Nesse sentido, muitos dos gerarcas do
petismo agem como aqueles corpos que andam, pensando estar numa realidade,
quando na verdade as coisas mudaram, com prisões e visitas da P.F. com lanterna
na cara). Não sei se trocar idéias com lábios protegidos por dedos solícitos -
como parece ser o hábito das duas maiores divindades do pavilhão que aqui se
instalou desde 2003 - não traduziria um defeito horrível de comunicação, ou
melhor de falta de.
Mas voltemos ao governador Pezão, que de chapéu estendido corre de Seca
em Meca, à cata de créditos salvadores. Dona Dilma até que ajudaria, mas a sua
situação é penosa mesmo, e, em consequência, milagres não podem ser feitos.
Outras colunistas ora se lembram de que seria melhor fazer fundos de
contingência. Mas desde Pindorama que vivemos assim, com falta de planejamento
e poupança, debaixo do letreiro "Deus proverá".
O que me intriga é que não será de hoje que despencou a cotação do
barril de petróleo. Baltazar se assustou quando viu na parede de o que seria a
derradeira orgia, o aviso da chegada do cobrador-assírio pela manhã.
Já dizia o frade medieval Roger Bacon - no tempo em que toda a Europa
era católica - que "conhecimento é poder".
É estranho que saber já disponível nas trevas da Idade Média - quando a
energia era braçal ou animal, e a luz, a trêmula flama da branca vela - tenha
sido descurado.
Recordo-me das estórias que enaltecem a formiga e denigrem a cigarra. Mas
como se vêem muito mais estas do que aquelas por essas bandas, o que se há de
fazer dentre os parâmetros bastante
flácidos das previsões, que se acreditam até da lavra desse inseto voador e
zoeiro tão adaptado ao ethos do
carioca?
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