Base Nacional Comum Curricular
Marco Antonio
Villa publica em O Globo de cinco de janeiro corrente, mais do que um artigo,
um alerta. Sem qualquer preaviso, sem assomo de exame para valer, a turma do
PT, com a assinatura do então Ministro da Educação Renato Janine Ribeiro -
posteriormente afastado sem qualquer cerimônia por Dilma para dar guarida a
Aloizio Mercadante, que precisava ser escanteado da Casa Civil, com vistas a
fazer lugar para Jaques Wagner - e "sob o disfarce de consulta pública,
pretende até junho aprovar uma radical mudança nos currículos dos ensinos
fundamental e médio - antigos primeiro e segundo grau".
Como sublinha
Villa, "nem a União Soviética teve coragem de fazer uma mudança tão
drástica como a 'Base Nacional Comum Curricular' ".
A arrogância
intelectual ou talvez melhor, a ligeireza conceitual dos senhores comissários
culturais do PT - talvez sob o signo da urgência de brusca interrupção que já
seja discernível no previsível curto prazo de sua localização na 'stanza dei
bottoni'[1] da
governança - assumem tarefa de arrogância intelectual sem parâmetros, como se
fossem colonizadores a dispor das errôneas bases da cultura programática de
algum soba em África.
E é com a
desenvoltura dos ignorantões - aqueles que se lixam para o saber de outrem, legado de nossos antepassados e que não
saberiam identificar conexões como 'a última flor do Lácio, inculta e bela' -
que se propõem uma 'reforma' reminiscente dos vândalos ou, nos tempos
contemporâneos, do anticulturalismo do Exército Islâmico para quem a vinda do
Profeta é sinônimo do começo dos tempos. Tudo o mais, história antiga (Egito,
Mesopotâmia, Grécia, Roma) é jogado como se fora inço, para as grandes
fogueiras da ignorância.
Para esses burros
dinâmicos são demasiado fáceis esses largos gestos que dispõem de um passado
que ignoram. Tampouco terão presente que tudo aquilo que não apreenderam, muita
vez estarão condenados a repetir, como diz de que se utilizam pela rama. Já
tenho minhas dúvidas sobre os alicerces do conhecimento desse senhor. Que
apedeutas, como Lula da Silva, e trapalhonas culturais, como a 'economista'
Dilma aprovem sem pensar tais bestialógicos, não deve surpreender.
Querem substituir
com uma larga espadanada um legado que desconhecem. Sabem, por acaso, esses
ignoramus que eles se propõem denegar uma herança tão sólida, a ponto de que
não conseguirão pronunciar um parágrafo sequer de nossa língua sem nele inserir
termos de origem helênica? E como Monsieur Jourdain estarão, sem o saber,
falando em prosa ?
Não há nada de
mais danoso para um povo que se deixa dominar por um grupelho de supostos de
ideólogos de esquerda, quando na verdade não passam de ignorantes com o boné
frígio de largos, vandálicos gestos que semelham odiar o patrimônio de nossos
maiores, pelo simples fato de serem dominados pelo desejo de mudar da mesma
forma hoje praticada pelo E.I. Põem abaixo as ruinas das civilizações antigas,
pelo simples fato de antecederem o que consideram a única revelação. Essa
cultura da ignorância é o endeusamento da negação do saber, e só conduz ao
deserto da intolerância.
Como não é
aconselhável que nos ponhamos a discutir com energúmenos, essa negação da
História que é o propósito dessa anti-reforma não merece o nosso tempo. Pois
como disse um dos shamanes do comunismo, quem ignora o passado, está condenado
a repeti-lo. A dinâmica ignorância
desses comissários - cujas 'propostas' refere o artigo de Marco Antonio Villa -
deveriam ser lançadas à lata de lixo da História, dentro dessa apósita idéia de
intelectual famoso que, talvez por sê-lo em demasia, o Comissário Stalin mandou
mais tarde matar por um capanga seu.
As Reformas Ortográficas
O português
vem sofrendo iterados ataques de parte de suas 'academias de letras'. Esse afã de mudar a ortografia constitui uma
sarna que semelha difícil determinar-lhe
as causas, quando na verdade elas sabem bem simples, corriqueiras mesmo, à
altura de quem as pratica com tanto afã.
Como se
verificou na ultimíssima reforma - que são sempre empreendidas a pretexto de
adequar o vernáculo a um modelo comum - na verdade, por mais empenhados que
estejam os senhores reformadores, eles não lograrão atingir o próprio objetivo,
dada a impossibilidade prática.
Diz-se
por exemplo que se fala o português em Angola, quando na verdade a língua se
adapta aos dialetos tribais. Assim, por mais que se esforcem as Academias
respectivas, o que se fala em África - e não adianta valermo-nos da velha e
procrusteana cama para exibir a própria
conformação - tudo não passará de um cumprimento superficial aos vezos de
culturas que podem ser irmãs, mas que guardam inegáveis diferenças.
Como se
viu na última 'reforma' de que se encarregou a nossa Academia de enfiar-nos
goela abaixo, cada vez essas propaladas revoluções culturais tratam de menos
como se fora o mais.
Os
governos civis de turno - quiçá porque o exercício lhes pareça despropositado,
mas esotérico - dão autonomia às instâncias das Academias - tanto a nossa,
quanto a lusa - para que levem a cabo a reforma. O poder civil se curva ao
suposto conhecimento das instâncias acadêmicas, e o que vemos é que esses
senhores, sob o pomposo título de reforma ortográfica, legislam cada vez em
menor tempo de intervalo sobre questiúnculas que, amiúde, sequer mereceriam uma
nota de pé-de-página introduzida por secretário perpétuo dessas academias.
O
português parece um réptil que tem de se livrar de formas ortográficas que,
supostamente, seriam errôneas ou, o que é ainda pior, cediças. Tenho para mim
que menos de um truque para viajar a ultramar, tais reformas surgem como ânsia
de glória acadêmica para as diretorias respectivas, embora a lusa venha
mostrando muito mais comedimento do que os seus estouvados êmulos em além-mar.
Se os
governos civis, ao invés do menosprezo de turno - deixe que se ocupem de tais
ninharias - tivessem presente que esse mudancismo só ocorre com intermédio
de gerações nos grandes idiomas, as chamadas línguas franca (o inglês nos dias
que correm, como o foi o francês no passado - e fiquemos por aí, malgrado não
desconheçamos os parentes ilustres - que já tiveram maior presença - como alemão,
italiano, latim e grego) poderiam constituir o padrão a ser seguido, e não essa
ânsia de estulto reformismo que cada vez semelha mais inapropriado, por cobrir
um campo de aplicação cada vez menor.
E não é
que existe mesmo gente que explica essa sarna do reformismo como decorrente da
vontade de viajar das instâncias acadêmicas, ao inventar esse poder que em
outras plagas é tratado com tanto bom senso e respeito ao patrimônio linguístico
dos respectivos antepassados.
Ao
baratear esse reformismo de ocasião, nós, os cultores da última flor do Lácio, estamos condenando à multiplicação não dos
pães, mas dos dicionários e a gordura das editoras, trabalhando cada vez mais
sobre o que é menor, desvelando o respectivo provincianismo cultural.
( Fontes: O Globo, Folha de S. Paulo, Olavo Bilac )
[1] Stanza dei bottoni (a
câmara dos botões) é o modo com que os partidos italianos designam as instâncias do poder.
Um comentário:
Extremamente oportuna a abordagem crítica sobre as modificações previstas, tanto na Base Nacional Curricular, como no Sistema Ortográfico Brasileiro.
Ninguém é contra adequações ou alterações na base curricular do ensino brasileiro, desde que representem evoluções, novas abordagens, tendo sempre, na valorização e reconhecimento do passado, a base para olhares futuros.
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