Conduzido por
anacrônico avião, que levou mais de hora para transportar Lula da pista de
Congonhas para a do aeroporto Afonso Pena, em Curitiba, muitos terão engolido
em seco ao serem informados pelas locutoras da Globo que se tratava de monomotor, que voava, como antigamente,
com o trem de aterrissagem à mostra, e
não recolhido, como usam as aeronaves modernosas.
Não é só pelos presos que
transporta, mas também pela própria tripulação da Polícia Federal, que faria
por merecer substituição por outra aeronave que aproxime passageiros e
policiais por um transporte mais moderno e que, por conseguinte, inspire mais
segurança tanto aos infelizes que carrega para o xilindró, quanto ao pessoal da
Federal (inclusive o nosso conhecido Japa da Federal, cuja presença teria sido
vetada pela entourage, do
ex-presidente).
Como o leitor desse modesto blog já terá percebido seu autor não é
um partidário enragé do ex-presidente
Lula, mas tal não equivale a dizer que no seu modesto mister tenha outro
compromisso que não seja com a verdade.
Por isso, a posteriori folguei com o meu longo e voluntário plantão diante da
televisão. Apesar de as câmeras e os locutores pertencerem à Rede Globo, pude
verificar que, enquanto a cobertura do magno evento tenha tido uma característica
fleuve, vale dizer as câmeras tudo (ou
quase tudo) retratavam e filmavam, o que decerto ajuda a termos um quadro
da realidade. E com o passar das horas,
querendo ou não, muita coisa vai caindo na metafórica rede do telespectador,
que é, por vezes, recompensado na própria paciência em lograr captar, aqui e
ali, alguma informação que, em geral, tende a desaparecer nas apressadas redes
da compressão dos informes televisivos.
Pode ser labuta de beneditina
paciência, mas sempre algum enquadramento ou disparatada visão das câmeras - ou
eventual comentário de algum jornalista de passagem ou não - tudo isso pode
cair na tua, por vezes cansada, por vezes um pouco mais espevitada guarda - e
quem sabe vá virar farinha na episódica moedura que, quase sempre devagar, nos
vai ajudando a melhor entender essa por vezes confusa, e por outras algo
estranhamente distinta, de o que dona
informação tanto se empenha, seja de maneira sinuosa, seja com a suavidade do paralelepípedo, em informar-nos ou até
doutrinar-nos.
Será que sentar-se diante da
tevê é modo recente de deformação da realidade, como que para alimentar a
própria suspeita de plano geral de ludibriar o grande público, no que pareceria
um sinistro projeto de mórbida interpretação da realidade, como sofrem os
acometidos de paranoia? Não me parece o
caso, embora os armados da necessária paciência - como o atento minerador a
escrutinar a sua velha peneira à cata de alguma especial pedra que possa
modificar-lhe a existência dura e sofrida - podem colher prêmios inesperados,
pelos voice over de já uns cansados
repórteres televisivos.
Daí que a imersão na verdade
- ou na aparente modorrenta rotina do operador
televisivo - pode ajudar o eventual
cansado telespectador a colher aqui e ali, quase sem dar-se conta, uma pedrinha
da observação que poderá - quem sabe? - ajudar-te a cotejar com alguma outra
informação, essa demasiado burilada nas oficinas do faz-de-conta, para que te
regalem com algo que brilha um tanto mais, e de certa maneira - se tens a mente
alerta e não sejas estranho aos quebra-cabeças - poderás até intuir que tens em
mão qualquer coisa de concreto, que discrepa do leit-motif que a grande imprensa quer ou impingir-te, ou, de algum
modo, abalar-te a própria segurança.
Ao cabo dessa ingente e por
tantas vezes improfícua busca, alguém que quer saber, e se vê ao cabo tangido a
reservar a própria opinião, qual deverá ser a sua postura: ou investir, como novo dom Quixote, a lança
em riste contra os ameaçadores gigantes - que na verdade eram moinhos - ou
então, diante do circo amedrontado, exigir, como o fez o Cavaleiro da triste
figura, que abrissem, e de imediato, o
cadeado com que encerravam na jaula o pobre Leão - no que o magro cavaleiro
acaba prevalecendo, a despeito da
resistência encarniçada de quem tinha o molho de chaves. E a despeito do terror dos guardas e do
fremir das gentes, não é que o Leão se levanta lentamente, fareja o entorno das
grades abertas, e ao cabo, se deixa cair junto das leoas, como se cruzar o
portão da liberdade não fosse agora a melhor solução?
(
Fontes: Rede Globo; Dom Quixote, de
Miguel de Cervantes )
A
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