sexta-feira, 18 de outubro de 2019

Beau Geste ?


                                          

        Há um filme americano de muito tempo atrás em que o âmago de película está em um belo gesto praticado por um soldado, se não me engano da Legião Estrangeira, que ele deixa como uma espécie de legado, que pela elevação da intenção que o motivara dá sentido à sua existência.
            Agora que o triste episódio provocado, seja pela insensatez, seja mesmo pela própria indiferença, ou até falta de qualquer mínima sensibilidade, que em meio à caleidoscópica visão de um presidente pudesse, se bem compreendido, dar um sentido adicional à própria trajetória política, se aproxima daquele estágio que o espectador tenda a considerar como conclusivo, creio que, com a compreensão do leitor se se esteja acercando de uma fase em que as características do episódio já se afirmam na sua brutal e cínica realidade.
              Em muitos aspectos, mas, sobretudo pela imagem de cruel frieza e pela consequente falta de empatia ou mesmo de reconhecimento dos valores intrínsecos da lealdade e da coragem demonstradas pelo contingente curdo, pode-se chegar a um juízo, ainda que tentativo, das enormes limitações na capacidade de liderança dessa alta personalidade.
                 É de sentir-se pena dos Estados Unidos em que se veja com um comandante supremo com uma tal falta não só de sensibilidade quanto ao potencial evidenciado pelo soldado curdo, que chega ao extremo de ignorar-lhe os serviços  prestados por tanto tempo e com tal validade e mérito, e o que é ainda mais lamentável e, por conseguinte, que reveste ulterior relevância, chegar ao ponto extremo de tratá-lo com brutal indiferença. 

                    Em todos os aspectos, o presidente Donald Trump falha, mas sobretudo enquanto comandante. Na sua insensibilidade, não demonstra nada que se avizinhe da correta avaliação do bom soldado curdo, seja na própria confiabilidade, seja na coragem e respectiva destreza no seu mister. Existem atos e atitudes nas autoridades e, máxime, nos líderes militares, que são duplamente reprováveis. Como eventual lição para quem careça de ser instruído no que deve ser o comportamento correto de um alto comandante militar está na realização de que existem determinados atos que pela sua própria ínsita estupidez podem ser interpretados - o que é sem dúvida o caso em tela - como um duplo erro do comandante militar. A sua indigência como líder é duplamente evidenciada: além de desvencilhar-se de um válido aliado, com o que perde já bastante, dado o comportamento da tropa, mostra outrossim completa e perigosa inaptidão de valorizar a lealdade e a capacidade assinalada em tantos episódios pelo soldado curdo. Se a falta de sensibilidade na avaliação já constitui erro grave em um comandante presidencial, a sinalização para o futuro é ainda pior, enquanto demonstra uma relação marcada pela inconfiabilidade. O que pode esperar o soldado curdo ao ser tratado com tal insensibilidade, a ponto de que a própria lealdade e confiabilidade no exercício das respectivas e muito válidas prestações militares venha a  receber como retribuição a sua eventual  entrega ao inimigo turco ?  

( Fonte: O Estado de S. Paulo )

Nenhum comentário: