Iniciados em junho
último, por primeira vez, a polícia de Hong Kong empregou canhões de água, além
de bombas de gás lacrimogêneo, contra os manifestantes pró-democracia, em um
segundo dia seguido marcado por protestos violentos na ex-colônia britânica.
É sempre oportuno lembrar que a
cidade de Hong Kong, grande centro financeiro na Asia, enfrenta sua
maior crise política desde que foi entregue pela Grã-Bretanha à China comunista
em 1997. Com carradas de razão, os manifestantes declaram que lutam contra a
erosão do modelo "um país, dois sistemas", pactuado
na época, e que, por conseguinte, previa expressamente a continuidade das
liberdades democráticas que inexistem na China continental.
M. Sung, um engenheiro de software de 53 anos, declarou que
participou de quase todos os protestos, e que pretende continuar atuante. "Sabemos que esta é a última chance de
lutarmos pelo lema "um país, dois
sistemas". Do contrário, o Partido Comunista da China vai penetrar
na nossa cidade natal e controlar tudo." E "se nos mantivermos
fortes, podemos seguir com este movimento por Justiça e Democracia. Não
morreremos."
A Polícia, a soldo do poder
chinês, condena veementemente os manifestantes que estão "destruindo o
espaço público" (sic), e,
persistindo na prática repressiva, prendeu dezenove homens e dez mulheres após
os atos de protesto deste sábado, 24 de agosto. No seu obscurantismo
repressivo, desde o início das manifestações a norma é prender os que mais protestam,
e por isso além de setecentos habitantes de Hong Kong já foram encarcerados.
Houve até um segundo protesto,
nesse fim de semana, que reuniu centenas de pessoas, incluindo parentes de
policiais,e que também foi realizado em outro local da cidade, na tarde deste
domingo. Em um primeiro sinal de uma orientação toscamente de intento de
divisão, uma mulher que se disse casada com policial, se "juntou ao
protesto" ... para declarar seu
apoio à polícia...
A polícia do território de
Hong Kong, regularmente criticada pelos ativistas, tem sido alvo há semanas da
ira dos manifestantes. No sábado, essa polícia enfrentou os radicais que
ergueram uma barricada no leste de Hong Kong. Tais confrontos marcaram o fim de
um relativo período de calma de dez dias.
Em consequência, a polícia
disparou gás lacrimogêneo e agrediu manifestantes que atiravam pedras e
garrafas. Por causa desses confrontos, dez pessoas foram hospitalizadas.
Não há negar que tais protestos na relativamente pequena
cidade de Hong Kong constituem um senhor desafio para os líderes do Partido
Comunista, sob a orientação continuista e repressiva do novo líder Xi Jinping, cuja admiração por Mao
Zedong que em outros períodos
recentes fora consideravelmente reduzida, passou novamente às aléias de uma
perigosa idolização, dado o profundo pensamento repressivo que presidira à
longa predominância desse líder chinês, com consequências que muita vez
oscilaram entre o bárbaro, o devastador e o grotesco.
Há semanas, a polícia,
esse símbolo da repressão sob o pensamento de Mao Zedong (e hoje de seu fervoroso discípulo Xi) de novo enfrentou os ditos
radicais manifestantes, que haviam erguido mais uma barricada no leste de Hong
Kong. Tais confrontos, por conseguinte, marcaram o fim de um período de calma de cerca de dez dias. Mas será sempre
oportuno ter em mente que, diante da repressão policial, toda calma será sempre
ilusória, enquanto houver manifestantes que tenham lúcida e corajosamente bem
presente o lema da reunião de 1997 - um país, dois sistemas.
Os líderes chineses que,
na virada do século, lograram recuperar a velha Hong Kong para o abraço de sua
mãe China, pertenciam decerto a outra grei assaz diversa da atual. No entanto, a História,
essa velha e caprichosa senhora, preparou uma espécie de journée des dupes para a corrente liberalizante encabeçada pelo
então Primeiro Ministro Zhao Ziyang,
e já antes prenunciada pelo líder comunista, Hu Yaobang, que
trabalhava na então chefia do PCC, em um engajamento por viés mais
liberalizante para o comunismo chinês. Caro por isso aos estudantes, a sua
morte, ao cabo de longa enfermidade, desencadeara as primeiras manifestações universitárias
que abraçavam a democracia e a lembrança
do então já saudoso Hu Yaobang.
Quem
poderia prever que um obscuro e medíocre chefe de corrente dita conservadora, Li Peng, se prevaleceria naquele
momento capital da política chinesa, ao lograr que o dito supremo líder Deng Xiaoping assinasse um editorial no
jornal oficial do Partido Comunista, que censurava os estudantes então
empenhados em manifestações que convergiam para a Praça da Paz Celestial ? Tal somente se tornaria uma realidade
política porque Zhao Ziyang se
achava ausente, como representante
oficial da China, nas comemorações da data nacional da Coreia do Norte,
presença esta que era indispensável, protocolar e politicamente, pelos estreitos laços de Beijing com Pnom Penh?
Ao
assinar, no principal jornal do PCC, Deng precipitava, sem o saber, uma
corrente de eventos que afastaria o futuro líder Zhao, com a sua tendencia liberalizante já definida, e condenaria o
velho Deng Xiaoping a ser manipulado
pelo medíocre, mas oportunista Li Peng. Nunca uma tal ausência - a de Zhao -
teria tantas nefastas consequências para a progressão na China, com o massacre
dos estudantes e toda a caudal de nefastos resultados negativos. Há, de resto,
um pensador argentino, José Ingenieros, de fins do século passado que frisa com oportunidade a
importância dos medíocres na História. Li Peng é um triste exemplo disso.
O passado - é um dito
corrente - tem grande poder sobre a História, e tal pode ser muito acentuado em
regimes como o do atual Xi Jinping, em que o autoritarismo prevalece em um
isolamento que o torna presa das piores pulsões e tendências. O lema de Hong
Kong "um país, dois sistemas"
torna-se de progressiva quase impossível implementação, diante do autoritarismo
de Xi Jinping - que idoliza o
monstro Mao Zedong - e de sua inexorável e inevitável confrontação com a
realidade da pequena cidade de Hong
Kong, que no entanto lá abriga importante centro comercial, cuja défaillance traria relevantes prejuízos
ao comércio e intercãmbio chinês, como a própria revista Economist tem enfatizado. Daí a preocupação da liderança chinesa e
de seus chefetes com ingerência direta no drama em evolução dessa pequena
grande cidade que luta pela própria preservação, tanto no aspecto ideológico
que presidiu à respectiva reintegração, quanto no seu apreço por uma democracia
que inexiste na China Continental.
E aí está o principal
problema que os corajosos manifestantes da pequena grande cidade de Hong
Kong colocam para os subservientes servidores do atual grande líder, Xi
Jinping, que armado do pensamento do seu ídolo Mao Zedong verá com crescente irritação essa atitude pró-liberdade,
para ele de todo inadmissível...
( Fontes: O Estado de S. Paulo, Prisoner of the State
(The secret Journal of Premier Zhao ZiYang) , Mao - The unknown Story, por Jung Chang e Jon Halliday, de Anchor Books, a division of Random House, Inc., José Ingenieros )
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