Se
houvesse nos Sínodos e demais reuniões vaticanas uma espécie de previsão de
tempo e de possíveis reações de correntes vaticanas, veríamos nas críticas de
cardeais alemães ao Instrumento de
Trabalho do Sínodo para a Amazônia como que um sofisticado movimento de
censura ao próprio sínodo, que, na verdade, dirige tais animadversões à Sua
Santidade.
Como o despacho vindo da Santa Sé se reporta às mal-disfarçadas críticas
de Cardeais alemães ao referido Instrumento de Trabalho do Sínodo para a
Amazônia parece oportuno notar que esse encontro de trabalho - de seis a vinte
e sete de outubro vindouro - que reúne alguns dos principais nomes da Igreja
Católica, promete igualmente virar cenário de confronto interno em relação ao
presente Pontificado.
Para começar as opiniões do prefeito-emérito (i.e, aposentado) da
Congregação para a Doutrina da Fé (a antes temida Inquisição) Gehard Muller, de
71 anos, e seu colega Walter Brundemuller, de noventa anos, um dos signatários
da Carta Dubia - que pede esclarecimentos sobre a exortação apostólica Amoris Laetitia, na qual se discutem
situações como a comunhão dos divorciados - disseram que o documento em tela, a
respeito do próximo Sínodo, contém (sic)
heresia, estupidez e apostasia.
No livro recém-publicado Roemische
Begegnungen ( Encontros Romanos) , Muller chega a acusar Sua Santidade de
trabalhar pela dissolução da Igreja. No texto, há amplas críticas a aproximações com 'política" e "intrigas",
além de discursos sobre uma suposta secularização da Igreja ao modelo
protestante. Nesse sentido,são amplas as queixas, v.g., à celebração dos
quinhentos anos da Reforma (em 2017), que teve em seu final a presença do Sumo
Pontífice.
Em relação ao encontro de outubro, Muller concentra suas objeções aos
conceitos de cosmovisão (com acenos a mitos e rituais evocando ' mãe natureza ', ecoteologia,
cultura indígena e ministério sacerdotal
com a possibilidade de ordenar padres casados. Muller também tenta rebater as
críticas que lhe são dirigidas como defensor do eurocentrismo. Para
defender-se, alude a seus iterados contatos com Gustavo Gutierrez, principal
teórico da Teologia da Libertação.
Dentro das caracteristicas
repressivas que marcam a Congregação para a Doutrina da Fé, de que foi
Prefeito, Muller adverte que a tarefa
dos cristãos não é preservar a natureza como ela é, mas ter a responsabilidade pelo progresso da
Humanidade. Por isso, para ele os homens, incluindo os índios na Amazônia,
são chamados a colaborar com a vontade
salvífica de Deus.
No contexto de um permanente alerta para os alegados propósitos do
Pontífice, deve-se ter igualmente presente mais um estranho aviso: É ímpossível esconder o fato de que esse sínodo é
particularmente adequado para implementar dois dos projetos mais
ambiciosos e que nunca foram implementados até agora: a abolição do celibato e
a introdução de um sacerdócio feminino, a começar por mulheres diaconisas,
afirma o mesmo prelado alemão.
O sínodo da Amazônia terá cerca de 250 participantes, dos quais 61
brasileiros (sem contar os convidados do Papa). Estarão presentes os bispos
titulares dos nove estados da Amazônia Legal: Acre, Amapá, Rondônia, Roraima,
Amazonas, Pará , Maranhão, Tocantins e Mato Grosso. Os países estrangeiros cortados pela floresta
são Bolívia, Equador, Peru, Colômbia, Venezuela, Guiana, Suriname e Guiana
Francesa.
O cardeal-arcebispo emérito de São Paulo, d. Claudio Hummes, presidente da Comssão Episcopal Especial da
Conferência Nacional dos Bispos do
Brasil (CNBB) e nomeado pelo Papa relator-geral do Sínodo, não
comentou para o Estado as críticas dos
cardeais alemães ao Instrumento de Trabalho. Mas seu pensamento está em uma
entrevista concedida ao padre Antonio Spadaro, diretor da revista Civiltà
Cattolica, e agora publicada no semanário alemão Stimmen der Zeit (Vozes
do Tempo).
Para Hummes, o foco da
próxima reunião está em criar "uma
Igreja indígena para as populações indígenas" e "inculturada".
Ele ainda destaca que o evento responde a um desejo de Papa Francisco, sobre o qual conversavam - e "rezavam" -
desde 2015.
( Fonte: O Estado de S; Paulo )
Nenhum comentário:
Postar um comentário