Por vezes, o cidadão tem de
abeberar-se em cláusulas como o artigo 2º da Constituição, que estatui:
"São
Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o
Executivo e o Judiciário."
"O confuso voto da
presidente do Supremo Tribunal Federal,
Cármen Lúcia, no julgamento sobre a necessidade de aval do Legislativo sobre a
imposição de medidas cautelares contra parlamentares por parte do STF reflete,
antes de mais nada, o absurdo desse debate na mais alta Corte do País. O que havia
começado como uma inacreditável afronta à Constituição só podia terminar, no
voto decisivo, em melancólico tartamudear de teses excêntricas, que igualmente
não encontram amparo em lugar nenhum do texto constitucional.
"Vai mal a nação cuja Suprema
Corte, a propósito de limpar o país dos corruptos, se permite cogitar, com ar
pomposo, o atropelo do Estado Democrático de Direito e das prerrogativas
exclusivas de outro poder, sem nada a sustentar tal conduta senão o
voluntarismo militante de ministros que se julgam com o poder de acabar com
todo o mal da política."
"O voto de Cármen Lúcia decidiu
a votação de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIN) que, na prática,
terá efeito direto sobre o caso do Senador Aécio Neves (PSDB-MG)."
Como é notório, o Supremo ordenara o
afastamento desse Senador de seu mandato e ainda lhe impôs restrições de
movimento, e de direitos políticos. Tal decisão causou natural reação do Senado, que julgou que suas
prerrogativas haviam sido subtraídas pelo Supremo, eis que, como reza a
Constituição nenhuma medida legal pode ser tomada contra parlamentares sem o
aval do Legislativo.
Como em todo o colegiado, há
ministros na Corte Suprema, que têm interpretação mais ampla sobre os
respectivos poderes. Dessarte, a
observação do editorial de hoje do Estadão: "Parece (...) que o texto
constitucional é, para alguns ministros do Supremo, uma espécie de obra aberta,
a ser emendada conforme crenças subjetivas, ideologias abstrusas e peculiares
programas políticos. Aquela Corte, nesses
tempos esquisitos (meu o grifo) chega a se confundir com uma assembleia
constituinte, sem ter um único voto popular a sustentar essa pretensão."
Esta é, no entanto, uma premissa
perigosa, que justificaria votos - como o do Ministro Luis Roberto Barroso - em
favor do afastamento de Aécio Neves, sem a consulta constitucional ao Poder
respectivo. No entender do editorialista, seria também "em nome dessa
guerra que a Procuradoria-Geral da República oferece denúncias baseadas apenas
em delações e em flagrantes armados, e o Supremo se permite tratar como
criminoso já condenado um parlamentar que ainda nem foi formalmente acusado."
Para o editorialista do Estado,
"na votação de anteontem no Supremo, prevaleceu a intenção de colocar
panos quentes na relação com o Senado, evitando um confronto que poderia
adicionar tensão entre os Poderes." E por isso conclui que "o
Supremo, principal responsável pela guarda constitucional, converteu-se
definitivamente em fator de grande insegurança jurídica. Afinal, se o que está
escrito na Constituição não vale para vários ministros daquela Corte, salve-se
quem puder."
( Fonte:
Estado de S. Paulo )
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