domingo, 1 de outubro de 2017

A falência das U.P.P.s

                              
        
       Com a partida da Rocinha da guarnição do Exército,  a edição de domingo de O Globo em sua primeira página assinala melhoras na qualidade de vida  que a violência tende a expulsar das favelas.
        A favela deixa de ser o que as Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs) iriam trazer no plano inicial, conforme exibido na colossal montagem da 'recuperação do Morro do Alemão'  pela unidade da polícia pacificadora.
        Nunca uma mentira teve tanto poder de persuasão. Montou-se um teleférico, comissionou-se uma novela pela tevê e se teve o dúbio privilégio de assistir a uma estória da Carochinha, só que entre os assistentes estava presente a vontade de acreditar que as favelas podiam ser integradas e virarem bairros da cidade do asfalto.
         Como a primeira favela pacificada, a de Santa Marta já era considerada como plenamente integrada, o negócio era pensar grande e imaginar um futuro melhor para todos, moradores do asfalto e ex-favelados, ora destinados a uma existência quase-normal.
          A Rocinha, a maior favela de todas, teria uma estrutura de bairro citadino. Nesse sentido, o programa das UPPs  incluía clínicas de família, agências bancárias, mas também bibliotecas e escolas de musica.
           Não há de esquecer-se que a TV Globo fez várias novelas de que uma parte transcorria em favelas, com serviços de transporte (moto-boys), restaurantes, além de agências bancárias.
           Ao abandonar a segurança nas favelas, o esquema das UPPs cortou a veia principal da esperança e das realizações a ela conexas.
           Estava ali o viço da esperança no aguardo de um tempo novo que virasse a página de tudo de mau e ruim que por lá passara. Ao desestruturar o esquema, ao negar-lhe fundos, a administração estadual brincava com o que não podia sequer deixar entrever a possibilidade.
              Pois se a esperança é uma planta que responde a quem lhe trata com respeito e carinho, ela também - e sobretudo na sua fase primeira, em que vai mostrando que a realidade por feia e bruta que seja,  pode ser mudada com o desvelo, o apoio da comunidade e a sua continuação dia após dia. Ela é delicada e exige apenas de seus jardineiros que eles perdurem na própria atividade. Nada mais belo do que a radicalidade da esperança.
             Como toda a planta, e em especial na sua fase de crescimento e afirmação, a esperança só exige que a comunidade a abrace com força, de forma que as incertezas do crescimento sejam pronto superadas pela certeza do sucesso e desse reforço que vem naturalmente de uma planta sadia, de que se retira com oportunidade o inço dos desvios, das atitudes antissociais.
              Toda a vegetação nasce pequena,   ela carece, como toda criatura, de desvelo, apoio e sobretudo pertinácia.
               Se falta à comunidade essa união na esperança e no trabalho, como poderá ela ultrapassar a fase do crescimento e das dúvidas?
            Por isso, a imagem de tais projetos não pode ser a fogueira, eis que as labaredas vão alto, mas em geral ela se auto-consome.
                 A pertinácia da formiga, da confiança que supera o obstáculo inesperado, a vontade de chegar lá, foi o que faltou.
                  E se falha um elo da cadeia, o seu viço e a sua força irão desaparecendo.
             Crescem as quizílias. A dúvida está em toda a parte. E será assim que os projetos melhores irão se desfazendo, eis que se irão afrouxando os  laços fortes de esperança.
                    Ao sentir-se então que ela partiu, o projeto se desfaz, e como o organismo sem defesas, ele vai ser invadido por toda parte, até que fique irreconhecível.



( Fonte:  O  Globo )  

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