Já me havia surpreendido a postura
apática do porta-voz da Polícia Militar (PM) na Rocinha. O surrealismo esteve
muito presente nessa entrevista do major Ivan Blaz. Questionado acerca da inação da PM - mesmo
dispondo de informações dando conta da iminência da invasão da Rocinha por um
grupo de traficantes - o dito Major da
PM declarou que a polícia não agiu com mais força (para acabar com o confronto)
porque uma intervenção "poderia expor a população a risco ainda
maior".
De o que se tratou e que a PM ignorou
foi a invasão na Rocinha de um bando de cerca 50 traficantes ligados a Antônio
Francisco Bonfim Lopes, o "Nem", ex-chefe do tráfico de drogas na
Rocinha, preso hoje na Penitenciária
Federal de Porto Velho. Esse bando - que seguira em direção à maior
favela do país para retomar-lhe o controle da venda de drogas no local - que
hoje está em mãos de Rogério 157
(Rogério Avelino da Silva), que é o antigo lugar-tenente de Nem.
A batalha a céu aberto - que deixou um
morto e três feridos- causou pânico geral em moradores, pedestres e motoristas,
que circulavam pela Gávea, e por São Conrado, bairros divididos pela Rocinha,
durante mais de seis horas! Ruas e túneis foram fechados.
A PM se omitiu completamente de seus
deveres elementares. Para frisar a extensão da crise de autoridade no Rio de
Janeiro, há uma anti-efeméride a assinalar esse "evento". Diante de um poder que se omite, não surpreende
que os bandidos tenham ignorado solenemente tanto a UPP, quanto a circunstância
de que ela completava naquela data cinco anos de implantação (20 de setembro de
2012). Isso diz muito da completa desmoralização das UPPs como instrumentos de
controle nas favelas. A ideia do ex-governador Sérgio Cabral, hoje trancafiado
na cadeia, está morta, e tal não pode ser melhor símbolo do sistema inaugurado
pelo Secretário Beltrame que já partiu faz muito, na mais clara admissão do
fracasso do controle da bandidagem no Rio, iniciado com as fanfarras do morro do
Alemão, mas pontuado de forma premonitória com o bando de cerca de trezentos
meliantes que naquele dia de hasteamento de bandeira e de festejos mil saiu
do morro e fugiu pela estrada de terra rumo à cidade baixa, sem que lhe fosse
oposta a menor ação seja de repressão, contenção ou detenção. Para bom
entendedor aquela debandada geral do crime - em carros puxados a cavalos ou
burros, e todo o tipo de movente que imaginar-se possa escrevia já u'a mensagem
que a mor parte dos assistentes da liberação do Alemão não entendeu - já
pressagiava o que viria a ocorrer, seja a reviravolta em favor do statu quo,
vale dizer do crime, organizado ou não.
Agora o Rio, sem verbas e o que
é pior, com a sua principal corporação de combate ao crime acuada e desmoralizada - há
uma obnóxia campanha dos criminosos para a eliminação física dos PMs, e o
número de PMs mortos impressiona deveras. Estamos diante de macabra campanha
física de eliminação dos PMs, e apesar de tudo, o número continua a crescer. Com a partida de Beltrame, um honesto homem
em uma administração em que paira ainda a sombra do mega-corrupto, já condenado pela Lava-Jato a dezenas e dezenas de anos de prisão, que é o ex-governador Sérgio Cabral, e
sob a insegura liderança do vice-governador Pezão, a situação do Rio de Janeiro é precária em
muitos campos, a ponto do roubo generalizado de cargas de caminhão, conivência
de parte do comércio com esse novo "fornecedor", e as crescentes
dúvidas e reticências da alternativa da presença militar.
O Rio, a Cidade-Maravilhosa do passado,
virou um enorme campo em que a carantonha do crime se mostra sanhuda e
provocante, já que as UPPs que seriam os comandos avançados da lei nas favelas,
se transformaram na prática como se fossem esqueletos de uma presença antes temida
e organizadora do Estado, hoje sem verba para nada. A PM está retratada nas
explicações dadas por seu porta-voz, na tentativa de explicar a vergonhosa
omissão na defesa do cidadão e da gente do bem, forçada a refugiar-se como
ratos sob a invasão da bandidagem, que age de acordo com a realidade do governo
Pezão. Inação do Estado, abandono do cidadão, domínio do crime.
Trazer as gloriosas forças
armadas para cá, segundo a bula do Ministro da Defesa, mas onde está o comando
da autoridade civil ? Para resgatar uma
pistola roubada, mega-operação é montada. Mas para impedir que dois bandos de
traficantes, que não somam cem pessoas, nem PM, nem Exército estão disponíveis!
Quantas milhares de pessoas eles ameaçaram com o seu tiroteio? Que brutal desrespeito pelos direitos do
cidadão, que obedece as leis e que ganha o sustento com o suor de seu rosto, e
não com a venda de entorpecentes ?
Será que ordem pública merece
menos atenção que a posse de uma simples pistola?
(
Fontes: O Estado de S. Paulo; Rede Globo )
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