domingo, 17 de setembro de 2017

Festival Anual de abertura da AGNU

                    
       Estamos no mundo das siglas e das tradições. Algumas são para valer, e outras, menos. Tome-se, por exemplo, a praxe (ou diríamos, tradição) de o Brasil - através de seu chefe de delegação, seja ele presidente, ministro, ou até quem encabece a delegação para esta nova assembleia das Nações Unidas) de abrir o debate dos chefes de delegação nesta nova e ritual reunião.
      No passado, vinham em geral os Ministros de Relações Exteriores que, por primeiro, discursavam perante os delegados do mundo reunidos. Quando Oswaldo Aranha, em uma das primeiras assembleias gerais, no grande anfiteatro em que o lápis genial do arquiteto Oscar Niemeyer participara - e lá estava também o mural Guerra e Paz de  Portinari  -, mais falavam os Ministros de Relações Exteriores, com a representação do Brasil abrindo o debate.
        Se todos esses grandes já foram - e  pela tribuna passou uma coorte de monoglotas - os trabalhos seriam sempre abertos pelo chanceler do Brasil. Com o avançar dos anos, o nível linguístico da chefia da delegação foi baixando, e a pretexto de não desmerecer da última flor do Lácio[1], os monoglotas como Tancredo Neves e Lula da Silva se apegaram ao português. Tudo aparecia com destaque nos jornais do Rio e de S. Paulo, não importa se as manchetes fossem em geral reservadas na imprensa nova-iorquina ao presidente americano (que falava em seguida). Tudo isso, muito de acordo com o dramaturgo italiano, Luigi Pirandello (Cosi è si lui pare - assim é se te parece), eles se vestiam com o auriverde pendão, para suprir a própria ignorância e alto manter o pendão nos então inúmeros jornais da imprensa de Rio e São Paulo.
         Se correm os tempos, e por sua condição de Superpotência está preservado o direito ao próprio idioma, o que lhes vem a calhar, aí se assistirá ao monoglota Trump despejar falação na própria língua.
         O que fará? Uma advertência a Kim Jong-un?  O que ouvirão acaso os chefes de delegação que não lhes haja já chegado por artes dessa estranha corneta que é o twitter, o meio preferido de comunicação do novo e surpreendente locatário da Casa Branca, Mr Donald J Trump?
        Depois do longo inverno petista, voltam os paulistas com o Senador Aloysio Nunes Ferreira Filho a encabeçar a delegação do velho Itamaraty. Em geral, então as comitivas brasileiras levavam instruções, que são  espécie de carta de scaramanzia[2] para que o chefe tenha na ponta da língua a resposta apropriada. Vale dizer que naqueles tempos as comunicações soíam ser difíceis e hoje tudo pareceria demasiado fácil.
         No entanto, para manter a imagem teatral, nem tudo o que parece corresponde à realidade. Vejam, por exemplo, o falastrão Trump. Se o levarmos em demasiada conta, se corre o risco - como antes se dizia - de cair em maus lençóis.  
          De qualquer forma, o carrossel está montado. Ele gira e gira, mas saberiam os basbaques que se, na verdade o mundo gira, só a Lusitana roda...

( Fonte: The New York Times )


[1] português, como diria Olavo Bilac
[2] Scaramanzia (ital.) palavra ou gesto que livram do mau-olhado;superstição popular.

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