terça-feira, 29 de setembro de 2015

Para quem gosta de água fresca

                   
         Conhece acaso o reservatório do Funil, em Resende? As suas águas integram o sistema do Paraíba do Sul e contribuem para o abastecimento do Rio. Se vistas à distância, apresentam coloração amarela, verde ou azul. Não se iludam com a eventual beleza da vista. Análises da UFRJ revelam que o Funil apresenta índice de contaminação de infestamento por cianobactérias (bactérias tóxicas) que é, pelo menos, 25 vezes superior ao máximo determinado pela Organização Mundial de Saúde (OMS), para água de abastecimento.

         Essas bactérias cianofíceas (alusão ao seu tom azulado) produzem toxinas que atacam fígado, rins e pulmões. Se a seca se agravar neste ano, a situação vai-se agravar, porque o esgoto se manterá estável, ao passo que o fluxo de água pluvial cairá.

         O que é que determina a OMS? A contaminação não deve ultrapassar vinte mil células de cianobactérias por milímetro de água. Segundo a prof. Sandra Azevedo, diretora do Instituto de Biofísica Carlos Chagas Filho, “no Funil, a média é de quinhentos mil células por milímetro. Essa água pode se tornar impossível de ser tratada. É puro esgoto concentrado e contém bactérias tóxicas para homens e animais”.

          A Dra.Sandra define a situação como alarmante. Ela, que há 20 anos estuda a qualidade da água do reservatório, garante que essa água está imprestável para consumo humano, pesca e irrigação. No máximo, serviria para navegação e geração de energia. Segundo a doutora, as chamadas florações tóxicas existem há vinte anos. Quando o nível da água baixa, como agora, a concentração dos microorganismos cresce significativamente.

          Coletamos água para análise todos os meses. A situação só piora, devido ao descaso. O esgoto continua a ser lançado (sem ser tratado) , ao passo que a seca impede a reposição do volume d’água.

           Só um trabalho sério que impeça o lançamento de esgoto sem tratamento poderá eventualmente mudar a situação.

           A Dra.Sandra e seu grupo divulgaram recentemente um estudo, que traça o cenário da ameaça para a saúde que o Funil representa. Publicado em revista científica – Algas Perigosas – o artigo analisa as concentrações  de cianobactérias que proliferam no Funil. Esses micro-organismos proliferam em ambientes ricos em nutrientes, como o fosfato e o nitrogênio, abundantes nos milhões de litros de esgoto sem tratamento lançados no Rio Paraíba do Sul dia após dia.  Eles liberam toxinas que envenenam peixes e outros animais, e permanecem em alta concentração na água. O resultado é uma sopa viscosa, malcheirosa e tóxica.

             Criado por Furnas em 1969 para o complexo da Usina hidrelétrica do Funil, o reservatório tem 40 km quadrados. Recebe não só o esgoto das cidades e propriedades rurais  vizinhas, assim como grande volume de poluentes originados em São Paulo. Após passar pela usina, para a geração de energia, as águas são despejadas no Paraíba do Sul, onde entram no sistema de abastecimento.

              Segundo a Dra. Sandra “O Paraíba do Sul é um rio maltratado. A seca só piorou o cenário sujo que o descaso histórico com o esgoto e a qualidade da água produziram.”

               A meteorologia aponta para o avanço da seca. E conclui a pesquisadora: “Vemos claramente a mudança do clima na região. E, mais nítido do que ( tal mudança), só o esgoto, que continua a ser lançado impunemente.”   

                Por sua vez, inquirida a respeito “a Cedae afirmou ontem (dia 28 de setembro) que não existe risco para a população.” Segundo nota da empresa, o que “importa não é a qualidade da água encontrada no Funil, e sim a que chega à captação do Guandu.”   

               Com o descaso do poder público, descaso este presente no aumento dos despejos de esgoto cru, sem qualquer tratamento, nos cursos d’água e não só no sistema do Guandu, mas também em São Paulo, onde estão sufocando um grande rio como o Tietê, em quem você acredita, leitor? Na Dra. Sandra e na sua gente, ou na CEDAE, do Rio de Janeiro ?

               Nesse sentido, temos outros exemplos ainda mais próximos, como a Baía de Guanabara, em que a água desaconselha a realização de provas náuticas nas próximas Olimpíadas, tal o nível da poluição. Até os simpáticos golfinhos – e eram trinta até há pouco – vão morrendo aos poucos, vítimas mais do descaso, do que da poluição.

               Mas quanto ao controle dos esgotos e a despoluição da Bahia, Pezão e Eduardo Paes preferiram enfrentar o vexame da Baía da Guanabara poluída (não obstante as comoventes promessas de despoluí-la quando se tratava de emplacar o Rio de Janeiro como sede...)

 

( Fonte:  O Globo: Pesquisa revela alta contaminação no Funil )

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