Há, no
entanto, outro cenário para o drama enfrentado por Dilma Rousseff. Ele está retratado, em grandes traços, na coluna
hodierna de Merval Pereira.
É forçoso
reconhecer que a atual situação em que encontra a Presidente foi por ela mesmo
criada. O colunista de O Globo
atribui ao próprio governo ‘um erro de cálculo inacreditável’ ao enviar ao
Congresso um projeto de Orçamento com déficit de R$ 30 bilhões para pressionar
o Congresso.
Mas os
supostos ‘erros’ da Presidente não param por aí. Forçoso será, no entanto,
reconhecer que lhe são imputadas falhas de julgamento, em matérias cuja
importância para a solução do problema fiscal é demasiado grande para ser
ignorada.
A prudência é uma virtude indispensável,
e no caso em tela não parece ter sido observada. Dilma não é do ramo, e não só
ela, mas também o Brasil está pagando caro pela sua presença no Palácio do
Planalto. O incrível disso tudo é que, depois de um governo desastroso, que
trouxe a inflação de volta entre otras
cositas más, ela conseguiu reeleger-se com base no mago Santana, no
aparelhamento do Estado (não dando direito de resposta sobretudo à Marina) e
com um montão de mentiras. Toda a quota de ousadia e cara-de-pau foi empregada
nos debates televisivos e na propaganda. Com base em um balão de vento e de
atochadas ‘verdades’, ela conseguiu superar Aécio Neves em três e meio por cento.
Reeleita,
estoura o ‘petrolão’ e lhe batem à porta todas as mentiras de que se utilizara,
com a desenvoltura de quem nunca teria que lidar com elas.
Criaram-se,
assim, as piores condições para o seu segundo mandato. A sua popularidade
começou a cair e ela assistiu a esse filme como se fora espectadora, e não a sua
protagonista.
Surgiu,
assim, uma situação de descalabro político, que tornou na prática natimorto o
próprio governo. O seu antigo mestre e criador dela se afastou, e como ainda
nutre esperanças para 2018, passou a defender um receituário oposicionista.
Mesmo um ás
da política – como Lula se crê – não teria condições de com baixíssima
popularidade (sete dígitos!) virar esse jogo. À confiança do Povo não se ilude
impunemente.
Por outro
lado – e não por sua culpa – aprendeu tarde e, portanto mal, o instrumental
político de que carece no Brasil a nossa mais alta autoridade. A
responsabilidade disso é imputável ao carismático Lula da Silva, e agora que
ela se acha em voo solo, com medíocre assessoria política, as coisas tendem a
complicar-se ainda mais.
É verdade que
se ela gostasse um pouquinho de política e dos políticos, se tratasse melhor a
gente, e não só aqueles mais próximos, mas também tivesse a arte de cultivar
possíveis substitutos do torneiro
mecânico, junto com o jeito de ouvir e de agradar as pessoas (e, se
factível, não só as que contam), ela formaria um círculo maior a seu torno. O
bom político precisa gostar de gente, ter temperamento não só afável, mas que
saiba dosar atenções, tratando cada um como se ele fosse depositário de experiência importante. O que ela tem passado
é um chorrilho de grossuras e palavrões, a ponto de já haver um longo histórico
de ofensas gratuitas e até de brigas com todo tipo de servidor, de altas
hierarquias a populares. Com a sua maneira de ser, ela destrata do general à
tarefeira, além de criar um ambiente pesado e tensionado à sua volta. Agindo
desse modo, é forçoso convir que a Presidenta trabalha contra ela mesma,
afastando de si pessoas que podem ter valor. Ninguém gosta de ser espezinhado e
destratado, e quem chefia não pode esquecer que está cercado de seres humanos e
não de robôs ou servos da gleba.
Sei que ela
passou por horas difíceis, foi presa, espezinhada, torturada, mas nada disso
justifica que se vá despejar sobre a gente à volta os maus humores, a tensão do
ofício e os eventuais dissabores, que costumam às vezes ser grandes para quem
tem a fortuna – sem esquecer o mérito - de subir mais alto que os demais.
Os grandes
políticos no Brasil – e os há poucos – deveriam procurar imitar o controle
emocional de Getúlio Vargas (carisma
não se ensina, nem se transmite) e a simpatia e o dom de criação de Juscelino Kubitschek. A este último
tive a felicidade de conhecer no apogeu, ao dele receber o diploma de Consul
classe K, como então se chamava os jovens diplomatas que terminavam o Curso do
Instituto Rio Branco. Com o seu jeito mineiro e maroto, JK me disse ‘Você é
muito moço, rapaz!’. Mais tarde, para minha honra, descumpri ordens e, como
segundo secretário da Embaixada em Paris recebi e guiei até o Jardin de l’Acclimatation (no Bois de Boulogne) o modesto Simca em que JK circulava com dona
Sarah. Ele, um dos nossos maiores presidentes, não se apequenou diante das
perseguições e dos interrogatórios dos IPMs.
E se uma lição dele aprendi, é que as pessoas devem ser respeitadas pelo que
são, e não pelo posto que ocupem.
A senhora
enfrenta hora difícil. Mas a vontade faz a hora, e não deixa acontecer.
Eleita pelo povo brasileiro, a senhora tem por missão preservar o Brasil, acima
da demagogia e dos interesses de partido, muitos inconfessáveis. É manifesto
que o nosso país não tem condições de arcar com as pautas-bomba que políticos
irresponsáveis tentam tramitar na Câmara e no Senado Federal. Todas essas
criaturas levantam as respectivas cabeças pensando valer-se da oportunidade de
sua suposta fraqueza.
A Senhora
pode mostrar o melhor de sua personalidade expondo sem medo para a Nação o que está agora
em jogo. Nenhum país tem condição de suportar essa coalizão da demagogia e de deslavado
oportunismo, que não trepida em pisar sobre os interesses maiores da Pátria
brasileira.
A Senhora tem
a oportunidade de transformar o desafio ao Brasil de uma aliança de interesses
inconfessáveis em ação firme de preservação de nosso Tesouro, e de sua
capacidade de atender os interesses dos brasileiros. Dentre todas as nossas
entidades tutelares, o bom senso e a preservação do Estado se acham acima do
clientelismo e dos interesses de facção.
Acima de tudo, está o bom senso e o sentir
patriótico do Povo brasileiro. Em poucas, mas firmes palavras, a Senhora poderá
levar essa mensagem à nossa gente. A adversidade é apenas um obstáculo e a
Senhora terá presente que a sua vida lhe indica o caminho que deve tomar nesta
hora.
É pensando
nisso que em comunicação anterior – a Rainha Fraca – lhe encareci “que não se
esqueça que a Senhora é a Presidente do Brasil, e se tiver isso bem presente, e
agir em consequência, terá o meu apoio e quero crer que o de muitos outros brasileiros que mais alto
põem o interesse nacional.”
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