sábado, 9 de fevereiro de 2019

O Presidente Enfermo (3)


                              

        Sobre a complicação  do estado presidencial,  médicos ouvidos pela Folha afirmam  que a detecção da pneumonia integra um quadro de complicação da situação clínica do  presidente Jair Bolsonaro que inspira cuidados.
          A infecção do presidente - no caso, a pneumonia - é agravo que sói manifestar-se depois de 48 horas da internação, geralmente com mais de sete dias.
           Contudo, ainda não há elementos para apontar-se com precisão o que estaria ocorrendo de fato.
            Hipóteses: (a) o fato de estar com o intestino parado e o estômago com acúmulo de líquido pode ter levado a micro-aspirações do conteúdo gástrico, que teria ido direto para o pulmão, causando a infecção.
              (b) outra possibilidade é a  chamada pneumonia por contiguidade, ou seja, relacionada ao abscesso que ele teve diagnosticado no sábado. Se o foco infeccioso estiver na parte superior do abdômen, perto do diafragma, por proximidade pode afetar o pulmão.
               (c) outro meio de causar pneumonia é por via sanguínea - a bactéria entra no sangue e vai parar no pulmão.
                (d) a internação prolongada é outro fator de risco. Um organismo debilitado, recém-operado, com cateteres, sonda, nutrição parenteral, tem portas de entrada para bactérias.
                 Três médicos consultados pela Folha estranharam o relato de pneumonia viral feito pelo porta-voz da Presidência, por avaliarem que não haveria razão para mudar o antibiótico, que mata bactéria.
                 Pelas previsões iniciais, Bolsonaro já deveria estar em casa, retomando trabalhos burocráticos, sem esforço físico.
                 O imprevistos começaram na própria cirurgia. O plano original da equipe médica era religar as duas pontas do intestino grosso, que estavam separadas. A previsão era que isto duraria três horas.
                   Ao cabo, porém, por causa da grande quantidade de aderências (partes do intestino que ficam coladas), foi retirado o cólon direito e construída uma ligação direta entre o intestino delgado (ileo) e o intestino grosso (cólon transverso). A cirurgia durou sete horas.
                    No sábado, 2 de fevereiro,  ele teve episódios de náuseas e vômitos, causado por infecção intra-abdominal, que necessitou de drenagem.  O quadro levou à paralisia do intestino delgado.
                     A assessoria da Presidência tentou amenizar a gravidade do episódio, tratado como se fora reação "normal" do organismo. O cirurgião Antonio Macedo, que operou o Presidente, alegou que era resultado da manipulação cirúrgica.
                       Na avaliação do cirurgião Carlos Sobrado,professor de coloproctologia da Faculdade de Medicina da USP, a causa da infecção pode ter sido duas: (a) um pequeno vazamento na costura cirúrgica (fístula), feita com a técnica do grampeamento. "Algum pontinho pode ter aberto e vazado um pouco de secreção.Isso acontece com frequência."
                         A segunda causa pode ter sido eventuais micro-perfurações ocorridas no momento de desfazer as aderências encontradas durante a cirurgia. "Separar uma alça da outra é muito difícil, mesmo em mãos em extremo habilidosas. Isso é muito comum também."
                          Para Sobrado, o fato de o presidente ainda estar usando sonda nasogástrica doze dias depois da cirurgia indica que a situação inspira cuidados.
                          Se fossem só questões referentes à manipulação cirúrgica, só um abcessozinho, se as alças estivessem totalmente íntegras, qual o problema de se dar para ele um suco, canja, sagu, gelatina, sopa ? É sinal que deve ter alguma coisa que não está tão bem", afirma.  Ele diz que a distensão abdominal pode ter comprimido o diafragma, for-mando secreção na base do pulmão.
                           Para o cirurgião Diego Adão Fanti Silva, da Unifesp, a maior preocupação agora são infecções hospitalares.
                            "O fato de o paciente estar recebendo antibióticos de amplo espectro e internado em um ambiente onde existem bactérias resistentes e fungos aumenta o risco de apresentar uma infecção adquirida no hospital por germe multirresistente. Esse risco é ainda maior quando o paciente possui dispositivos  invadindo seu corpo, como sondas e cateteres".
                              O risco de infecção adquirida no hospital é próximo de 10% em internações que passem de sete dias, sendo maior quando maior for o tempo da internação, os dispositivos invasivos e a fragilidade do sistema imune do paciente.
                                Mesmo que tudo evolua bem e Bolsonaro receba alta, ainda há mais riscos pela frente. O de aderência (alças intestinais grudadas), v.g., ficará com o presidente para sempre.
                                "Toda vez que o abdômen é aberto, o paciente passa a ter risco de desenvolver  uma aderência no intestino delgado ao longo da vida. Estima-se que esse risco seja de 10% em três anos. Não existe nenhuma medida profilática agora para evitar que isso aconteça", diz Fanti Silva. A maioria dos quadros de aderências pós-operatórias tem resolução espontânea, não necessitando de nova cirurgia.
                              Nos próximos seis meses, há risco de 15% de hérnia incisional na parede abdo-minal,consequência do tecido fragilizado em razão de três operações seguidas. Será fundamental que Bolsonaro evite grandes esforços nessa fase inicial, como levantar peso.


(aut. Cláudia Collucci -  Folha de S. Paulo ).

Nenhum comentário: