Sobre
a complicação do estado
presidencial, médicos ouvidos pela Folha
afirmam que a detecção da pneumonia
integra um quadro de complicação da situação clínica do presidente Jair Bolsonaro que inspira
cuidados.
A
infecção do presidente - no caso, a pneumonia - é agravo que sói manifestar-se
depois de 48 horas da internação, geralmente com mais de sete dias.
Contudo, ainda não há elementos para apontar-se com precisão o que
estaria ocorrendo de fato.
Hipóteses: (a) o fato de estar com o intestino parado e o estômago com
acúmulo de líquido pode ter levado a micro-aspirações do conteúdo gástrico, que
teria ido direto para o pulmão, causando a infecção.
(b) outra possibilidade é a chamada pneumonia por contiguidade, ou seja,
relacionada ao abscesso que ele teve diagnosticado no sábado. Se o foco
infeccioso estiver na parte superior do abdômen, perto do diafragma, por
proximidade pode afetar o pulmão.
(c) outro meio de causar pneumonia é por via sanguínea - a bactéria
entra no sangue e vai parar no pulmão.
(d) a internação prolongada é outro fator de risco. Um organismo
debilitado, recém-operado, com cateteres, sonda, nutrição parenteral, tem
portas de entrada para bactérias.
Três médicos consultados pela Folha estranharam o relato de pneumonia
viral feito pelo porta-voz da Presidência, por avaliarem que não haveria razão
para mudar o antibiótico, que mata bactéria.
Pelas previsões iniciais, Bolsonaro
já deveria estar em casa, retomando trabalhos burocráticos, sem esforço
físico.
O imprevistos começaram na própria cirurgia. O plano original da equipe
médica era religar as duas pontas do intestino grosso, que estavam separadas. A
previsão era que isto duraria três horas.
Ao cabo, porém, por causa da grande quantidade de aderências (partes do
intestino que ficam coladas), foi retirado o cólon direito e construída uma
ligação direta entre o intestino delgado (ileo) e o intestino grosso (cólon
transverso). A cirurgia durou sete horas.
No sábado, 2 de fevereiro, ele
teve episódios de náuseas e vômitos, causado por infecção intra-abdominal, que
necessitou de drenagem. O quadro levou à
paralisia do intestino delgado.
A assessoria da Presidência tentou amenizar a gravidade do episódio, tratado
como se fora reação "normal" do organismo. O cirurgião Antonio Macedo,
que operou o Presidente, alegou que era resultado da manipulação cirúrgica.
Na avaliação do
cirurgião Carlos Sobrado,professor de coloproctologia da Faculdade de Medicina
da USP, a causa da infecção pode ter sido duas: (a) um pequeno vazamento na
costura cirúrgica (fístula), feita com a técnica do grampeamento. "Algum
pontinho pode ter aberto e vazado um pouco de secreção.Isso acontece com
frequência."
A segunda causa pode
ter sido eventuais micro-perfurações ocorridas no momento de desfazer as
aderências encontradas durante a cirurgia. "Separar uma alça da outra é
muito difícil, mesmo em mãos em extremo habilidosas. Isso é muito comum
também."
Para Sobrado, o fato
de o presidente ainda estar usando sonda nasogástrica doze dias depois da
cirurgia indica que a situação inspira cuidados.
Se fossem só questões
referentes à manipulação cirúrgica, só um abcessozinho, se as alças estivessem
totalmente íntegras, qual o problema de se dar para ele um suco, canja, sagu,
gelatina, sopa ? É sinal que deve ter alguma coisa que não está tão bem",
afirma. Ele diz que a distensão
abdominal pode ter comprimido o diafragma, for-mando secreção na base do
pulmão.
Para o cirurgião Diego
Adão Fanti Silva, da Unifesp, a maior preocupação agora são infecções
hospitalares.
"O fato de o
paciente estar recebendo antibióticos de amplo espectro e internado em um
ambiente onde existem bactérias resistentes e fungos aumenta o risco de
apresentar uma infecção adquirida no hospital por germe multirresistente. Esse
risco é ainda maior quando o paciente possui dispositivos invadindo seu corpo, como sondas e
cateteres".
O risco de
infecção adquirida no hospital é próximo de 10% em internações que passem de
sete dias, sendo maior quando maior for o tempo da internação, os dispositivos
invasivos e a fragilidade do sistema imune do paciente.
Mesmo que tudo
evolua bem e Bolsonaro receba alta, ainda há mais riscos pela frente. O de aderência (alças intestinais grudadas),
v.g., ficará com o presidente para sempre.
"Toda vez
que o abdômen é aberto, o paciente passa a ter risco de desenvolver uma aderência no intestino delgado ao longo
da vida. Estima-se que esse risco seja de 10% em três anos. Não existe nenhuma
medida profilática agora para evitar que isso aconteça", diz Fanti Silva.
A maioria dos quadros de aderências pós-operatórias tem resolução espontânea,
não necessitando de nova cirurgia.
Nos próximos seis
meses, há risco de 15% de hérnia incisional na parede abdo-minal,consequência
do tecido fragilizado em razão de três operações seguidas. Será fundamental que
Bolsonaro evite grandes esforços nessa fase inicial, como levantar peso.
(aut. Cláudia
Collucci - Folha de S. Paulo ).
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