domingo, 10 de fevereiro de 2019

O bom General Mourão


                                            

        O governo Bolsonaro terá de fazer escolhas e aprender que nem todas são fáceis. A última se liga a uma eventual transferência da embaixada do Brasil de Tel Aviv para Jerusalém. Se nos últimos dias, líderes de igrejas que durante a campanha apoiaram explicitamente o candidato do PSL, assim como representantes do segmento evangélico expuseram a sua insatisfação com o Vice-presidente, sobretudo após o general  Hamilton Mourão se manifestar contra a transferência da embaixada brasileira em Israel para Jerusalém, a política internacional do Brasil tem de continuar a seguir os seus ditames tradicionais. Será muito pela circunstância de que a diplomacia do Brasil não é feita de afogadilho, que o Barão do Rio Branco construíu sua reputação de estadista, além de seus inúmeros triunfos em laudos arbitrais internacionais, riscando de forma segura e indelevel as nossas fronteiras, em vitórias memoráveis, conseguidas,  pelo estudo e a habilidade diplomática, no que não pouco ajudaram ao patrono da nossa diplomacia, os seus grandes precursores, como o maior deles, Alexandre de Gusmão, que é citado nas linhas abaixo.
           Nos últimos tempos, a corrente evangélica tem desejado flexionar os músculos políticos, intentando modificar posições tradicionais em matéria de política externa do Brasil. Se o Brasil reconhece Israel, tal não equivale, no entanto, à nossa denegação do tradicional apoio à parte politicamente mais fraca nesse embate, que é causa árabe-palestina.  Nesse aspecto, a tradição diplomática do Itamaraty sempre se pautou em promover o entendimento entre as Partes, mas nunca esquecendo  o apoio devido à parte palestina.
            Nesse contexto, as ruinosas modificações introduzidas na posição americana pelo Presidente Donald Trump no que tange a um desequilibrado apoio à causa israelense, só tem contribuído para enfraquecer a posição de Washington em termos de intermediário entre essas duas partes do processo.
              Daí, é de entender-se (e apoiar-se) a postura do general Mourão de defender o lado árabe-palestino nesse conflito, que é também uma postura tradicional da política externa brasileira.
              Perder o senso do equilíbrio nesta matéria é cortejar o desastre em termos de nossas exportações para o mundo árabe.  Tampouco é da tradição diplomática brasileira as mudanças de posição, dada a circunstância de que atualmente o Brasil tem trânsito em ambas as partes, e isso não é fato de momento, mas uma consequência de nossa política diplomática equânime, que defende a Paz e o entendimento entre as partes. Tampouco desconhecemos, como o próprio Papa Francisco tem afirmado, a importância de um trato equânime em matéria tão sensível.
                 O Brasil - e o Itamaraty - tem guardado através dos tempos uma postura de equidade e de apoio à Paz no Oriente Médio. Não será através de posições que quebram o equilíbrio de situações que gozem de amplo respeito que venha porventura a ser contrariado através de iniciativas como as adotadas por Trump sem o necessário apoio internacional e da própria tradição presidencial americana, inclusive dos presidentes estadunidenses que o precederam - medidas essas que são combatidas pelo seu caráter radical e desequilibrante da atual situação - que o Brasil deva modificar a sua postura diplomática tradicional. Até o presente, cultivamos - com êxito e respeito - as duas vertentes, que refletem o caráter moderado e equilibrado - com diálogo aberto às duas Partes - da diplomacia brasileira, dentro da tradição multissecular do Itamaraty do Barão do Rio Branco. Com efeito, não se constrói um país com tantos milhares de km de fronteiras internacionalmente respeitadas sem a presença de figuras diplomáticas exponenciais como o precursor de nossa diplomacia, e o principal idealizador  do Tratado de Madri que desenhou os traços atuais do Brasil moderno, i.e.  o santista Alexandre de Gusmão (1695-1753), o moço de escrivaninha de D. João V, rei de Portugal (1689 - 1707 - 1750).    

( Fontes: Folha de S. Paulo; obras de Jaime Cortesão, existentes na Biblioteca do Itamaraty )       

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