O
governo Bolsonaro terá de fazer escolhas e aprender que nem todas são fáceis. A
última se liga a uma eventual transferência da embaixada do Brasil de Tel Aviv
para Jerusalém. Se nos últimos dias, líderes de igrejas que durante a campanha
apoiaram explicitamente o candidato do PSL, assim como representantes do
segmento evangélico expuseram a sua insatisfação com o Vice-presidente,
sobretudo após o general Hamilton Mourão
se manifestar contra a transferência da embaixada brasileira em Israel para
Jerusalém, a política internacional do Brasil tem de continuar a seguir os seus
ditames tradicionais. Será muito pela circunstância de que a diplomacia do
Brasil não é feita de afogadilho, que o Barão
do Rio Branco construíu sua reputação de estadista, além de seus inúmeros triunfos
em laudos arbitrais internacionais, riscando de forma segura e indelevel as
nossas fronteiras, em vitórias memoráveis, conseguidas, pelo estudo e a habilidade diplomática, no que
não pouco ajudaram ao patrono da nossa diplomacia, os seus grandes precursores,
como o maior deles, Alexandre de Gusmão,
que é citado nas linhas abaixo.
Nos
últimos tempos, a corrente evangélica tem desejado flexionar os músculos
políticos, intentando modificar posições tradicionais em matéria de política
externa do Brasil. Se o Brasil reconhece Israel, tal não equivale, no entanto,
à nossa denegação do tradicional apoio à parte politicamente mais fraca nesse
embate, que é causa árabe-palestina.
Nesse aspecto, a tradição diplomática do Itamaraty sempre se pautou em
promover o entendimento entre as Partes, mas nunca esquecendo o apoio devido à parte palestina.
Nesse contexto, as ruinosas modificações introduzidas na posição
americana pelo Presidente Donald Trump no que tange a um desequilibrado apoio à
causa israelense, só tem contribuído para enfraquecer a posição de Washington
em termos de intermediário entre essas duas partes do processo.
Daí, é de entender-se (e apoiar-se) a postura do general Mourão de
defender o lado árabe-palestino nesse conflito, que é também uma postura
tradicional da política externa brasileira.
Perder o senso do equilíbrio nesta matéria é cortejar o desastre em
termos de nossas exportações para o mundo árabe. Tampouco é da tradição diplomática brasileira
as mudanças de posição, dada a circunstância de que atualmente o Brasil tem trânsito
em ambas as partes, e isso não é fato de momento, mas uma consequência de nossa
política diplomática equânime, que defende a Paz e o entendimento entre as
partes. Tampouco desconhecemos, como o próprio Papa Francisco tem afirmado, a
importância de um trato equânime em matéria tão sensível.
O Brasil - e o Itamaraty - tem guardado através dos tempos uma postura
de equidade e de apoio à Paz no Oriente Médio. Não será através de posições que
quebram o equilíbrio de situações que gozem de amplo respeito que venha
porventura a ser contrariado através de iniciativas como as adotadas por Trump
sem o necessário apoio internacional e da própria tradição presidencial
americana, inclusive dos presidentes estadunidenses que o precederam - medidas
essas que são combatidas pelo seu caráter radical e desequilibrante da atual
situação - que o Brasil deva modificar a sua postura diplomática tradicional.
Até o presente, cultivamos - com êxito e respeito - as duas vertentes, que
refletem o caráter moderado e equilibrado - com diálogo aberto às duas Partes -
da diplomacia brasileira, dentro da tradição multissecular do Itamaraty do
Barão do Rio Branco. Com efeito, não se constrói um país com tantos milhares de
km de fronteiras internacionalmente respeitadas sem a presença de figuras
diplomáticas exponenciais como o precursor de nossa diplomacia, e o principal
idealizador do Tratado de Madri que
desenhou os traços atuais do Brasil moderno, i.e. o santista Alexandre de Gusmão (1695-1753),
o moço de escrivaninha de D. João V, rei de Portugal (1689 - 1707
- 1750).
(
Fontes: Folha de S. Paulo; obras de Jaime Cortesão, existentes na Biblioteca do
Itamaraty )
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