A crise européia aberta pelo Brexit - a escolha do Reino Unido pela saída da União Europeia - desagradou a muitos países na Europa,
especialmente na Organização de Bruxelas e não só pelas dificuldades que vai criar.
Há um líder europeu, no entanto, que
não é membro da U.E. mas que gostou muito do êxito do Brexit. E esse líder, que não participa do organismo em Bruxelas, e
cujo país, embora considerado europeu, por sua extensão seja também asiático,
contemplou com grande satisfação o enfraquecimento da velha potência, que
tantas vezes no passado lhe contrariara os respectivos anseios.
Como terá demonstrado Andrew Foxall, esse líder - Vladimir Vladimirovich
Putin - teve um de seus objetivos principais - o enfraquecimento do
Ocidente - realizado em um dia. Dentro
desse enfoque, Putin passou cerca de dezesseis anos tentando desestabilizar o
Ocidente, através de política externa com o fim de intimidar muitos dos países
na órbita do gigante russo, aqueles que o Kremlin designa como estando no estrangeiro próximo.
Putin abriu uma união aduaneira que é
oferecida - de forma quase compulsória - para os seus vizinhos. O senhor do
Kremlin estabelece uma linha divisória para aqueles que se conformam ao morno
futuro disponibilizado por tal união, como a Bielorrússia, e o pesadelo de
intervenções em países como a Geórgia e
a Abkhazia do Sul.
Como a revolta de Maidan escorraçou do poder o filo-russo Viktor Yanukovich, não tardaria que a
Criméia seria invadida e 'devolvida' à Rússia, assim como iniciada a guerra
não-declarada contra a Ucrânia, grande demais para que ele permitisse a união
com Bruxelas.
Se essa guerra que fomenta o
separatismo na Ucrânia oriental persiste até hoje e as sanções contra o
agressor russo continuem de pé, a economia russa tem sofrido com tais medidas
decretadas pelo Ocidente, a que o Reino Unido vem dando o seu apoio.
Mas como afirma Foxall, quando em um
dia 17,4 milhões de súditos britânicos
votaram para sair da UE. a 23 de junho, eles lograram em uma jornada o que
Putin não havia conseguido em mais de década e meia. Foi, decerto, decisão apertada, mas tudo indica que
irreversível em um prazo breve.
Dos países que integram o Reino Unido,
tanto a Escócia quanto a Irlanda do Norte preferiram manter a união com
Bruxelas. No entanto, com o
desaparecimento do Reino Unido da União Europeia, fica em dúvida se a Escócia
de um lado manterá os seus liames com Bruxelas, assim como a Irlanda do Norte.
É interessante também notar que esse
resultado desastroso passou a ser visto com desconfiança por muitos que tinham
sufragado o Brexit. Repetia-se assim
aquele velho dito: não desejes muito uma coisa, porque ela pode acontecer. Tal
mudança de opinião ocorreu demasiado tarde. Aquela decisão levianamente tomada,
ora lhes caía mais pesada.
Como assinala Foxall, o Reino Unido
era um dos mais fortes apoiadores das sanções contra Moscou, por causa da
guerra na Ucrânia. Há muitos países na União Européia - como Chipre e Eslovênia
que estão prontos a levantar tais sanções, mesmo que com a tênue base dos
acordos de Minsk II (o acordo entre Moscou, Kiev e os ditos
'separatistas'). Moscou também cultiva o jardim de Grécia, Aústria e Hungria,
países que vêem o Kremlin com
simpatia. Também balançam a Eslováquia, e o próprio Ministro do Exterior da
Alemanha, Frank Walter Steinmeyer declarou que "as sanções não são um fim
nelas mesmas".
Foxall inclui o dubitativo
Steinmeyer, mas me parece difícil que a Chanceler de Ferro concorde com
isso. Se as sanções cairem, a U.E. terá
concedido à Russia o direito de invadir ou intervir em qualquer território que
porventura deseje. A única condição é que o país em causa seja fraco, ou sem
poder suficiente para contra-arrestar o monstro russo...
Daí, se compreende o temor do
chamado efeito dominó na Europa. Países que têm a memória longa são
menos suscetíveis das tolas ilusões supra-referidas. A esse propósito, o
Presidente da Polônia, Andrzej Duda disse no mês passado que "tudo deve
ser feito" para prevenir que outros países saiam da UE.
Gospodin
Putin sabe dessa dificuldade muito bem, e por isso dedica substanciais
somas para cultivar e financiar grupos euro-céticos através do
Continente europeu.
Dentre esses, se alinham o Front Nacional (extrema direita
francesa) que recebeu empréstimo de onze milhões e setecentos mil dólares de um
Banco russo (em 2014). O Kremlin cultiva relações com os partidos
de extrema-direita e ultra-nacionalistas como Jobbik, na Hungria, o Partido do Povo na Eslováquia, e o Ataka, na Bulgária.
A esse respeito, sublinha Foxall
que os Estados Unidos estão tão preocupados com a determinação de Moscou de
fomentar a desunião na Europa, que neste janeiro o Diretor de Informações (Intelligence) James R. Clapper Jr.
encetou revista dos fundos clandestinos destinados pela Rússia a partidos
europeus.
O articulista Foxall chama a
atenção para os principais partidos da
Escócia e da Irlanda do Norte, que se preparam a submeter novos
referendos para deixar o Reino Unido.
Que o futuro da Grã-Bretanha esteja em jogo, não parece haver dúvidas,
com as defecções da Escócia e da Irlanda do Norte. Esses pequenos países
contam, no entanto, com o ingresso na União Européia. Aqui Putin ganharia através da fragmentação.
É, no entanto, para lá de
duvidoso que a França e a Itália sigam essa corrente. Encontra-se gente que
tenha simpatias pelo Brexit na extrema direita, como Geert Wilders, o político holandês, que prevê que os Países Baixos
se unirão a essa corrente.
Foxall sublinha que a UE pode
ser um ator hesitante em termos de política externa, mas através da OTAN a
Europa é uma das principais integrantes da arquitetura militar e de segurança.
O peso do Reino Unido é que
tenderá a cair, pela perda de populações importantes. Na argumentação de Foxall
com Brexit Bruxelas terá perdido a
sua mais importante ligação com Washington.
Nesse aspecto, a argumentação
do articulista me parece claudicar, porque a Inglaterra manterá o peso nuclear
do atual Reino Unido. O seu veto no Conselho de Segurança das Nações Unidas há
de perdurar, posto que tenha perdido um tanto de seu peso relativo. Mas isso me
parece discutível.
Vladimir Putin, ao invadir
a Ucrânia e ao arrancar-lhe a Criméa, terá detido a expansão para leste da
União Européia.
O presidente russo tem
seguido política autoritária também na política externa, mas nesse campo
devemos ter cuidado em aumentar-lhe as supostas possibilidades. São conhecidas
as limitações da Federação Russa em
diversos campos, como no do petróleo. É a sua principal mercadoria de
exportação e por ora sofre com a queda na cotação do barril, fomentada por
países que nessa área dispõem de muito maior poder do que Moscou. Se Vladimir
V. Putin apresenta a chamada doutrina
eurasiana, uma mescla de diversas políticas, inclusive até do nazismo, a
Rússia como potência pode ter o material atômico herdado da União Soviética (e
também de alguns outros países que caíram na tolice de ceder-lhe os arsenais),
mas a sua força - ainda que aumentada por grandes dispêndios do Kremlin - não se compara à da antiga
URSS.
O erro principal do artigo
- decerto importante - de Andrew Foxall é presumir que o Reino Unido, com o Brexit, deixou de ser uma grande
potência. Releva notar-se que o U.K. faz muito perdeu o peso da grande
potência, que tinha logo depois do fim da segunda grande guerra. Assim como a
França tampouco possa ser considerada no mesmo nível da superpotência
americana, convém lembrar que há outro integrante desse seleto clube, i.e., a
República Popular da China. Enquanto esta se aproxima dos Estados Unidos para a
eventual sucessão, é preciso que nos afastemos das coordenadas européias - que
desde muito deixaram de determinar essas colocações - para que se tenha visão
realista da política internacional.
Será que Moscou continua,
como declarou o Presidente Barack H. Obama,
um fator
regional na política externa e militar?
Há muita pressa de Vladimir Putin,
e muito problema na Rússia em termos de crescimento econômico, além de
considerável corrupção instalada no poder.
Por isso, cuidemo-nos de tomar as ambições de gospodin Putin como expressão de um poder realmente efetivo e
existente.
No caso em tela do U.K.
semelha importante não ter as coordenadas de observação afetadas por um
movimento histórico que em muitos aspectos, máxime na diminuição do respectivo
poder, tanto econômico, quanto militar, já certamente constituía a realidade.
Ao ver de mais de perto o fenômeno, sem guardar a necessária distância de
observação, pode ser que se caia no erro de achar que as antigas ilusões e a fortiori
as lembranças do passado imperial ainda permaneçam com a mesma força que tinham
anteriormente.
Mas pode-se imaginar que
a Inglaterra no auge da potência tivesse um lider com o intelecto e as falhas
de David Cameron ?
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