quinta-feira, 19 de maio de 2016

Ainda o Acordo Ortográfico

                              

          As reformas ortográficas, que em países como França, Reino Unido, Estados Unidos e Alemanha exigem gerações para que sejam acertadas e implementadas, se verificam no Brasil em espaços aproximadamente decenais.
          Assim, em nossa terra não é raro que as ditas reformas infernizem a vida de estudantes e estudiosos, além de novas edições de gramáticas e, sobretudo, dicionários.
          Para as editoras e impressoras, decerto, pode constituir preciosa oportunidade de ulteriores reedições de dicionários, manuais e gramáticas.
          Toda essa movimentação que se empenha em rever e republicar o que não carece nem de ser revisto, nem republicado, é um fenômeno tão inesperado, quanto desnecessário, dada a circunstância de que o afã de introduzir pequenas modificações ortográficas, assim como dar nova grafia a vocábulos, pode estufar o ego de linguistas e estudiosos da língua, mas não terá outro efeito que introduzir mini-mudanças na ortografia, assim como na hifenização das palavras.
           Além de criar confusões desnecessárias nos estudiosos da língua e máxime nos pobres estudantes, forçados a reaprender novas regras e novas ortografias literalmente pelo capricho das Academias, e notadamente a nossa, a quem as autoridades do Governo, seja por desdém, seja por resquício de atenção reverencial, delegam essa periódica atribuição.
            Com os nossos duzentos milhões de brasileiros, a Academia Brasileira de Letras se crê em posição favorável para acionar a engrenagem das rituais mudanças na ortografia. Seríamos o grande poder, com o tamanho da população, embora tal magnitude deva ser relativizada, dado o nosso analfabetismo, assim como  o escasso hábito da leitura.
             Por outro lado, o mudancismo se tem incrementado, e os prazos respectivos encolhidos. A ânsia de unificar a língua pode ser trabalho de Sísifo. Não se vê,
por exemplo, na grafia do inglês praticado na Inglaterra a intenção de implantar uniformidade que inexiste na pronúncia e no uso da língua. Para tanto, basta cotejar publicações de Estados Unidos e do Reino Unido, para que o leitor se dê conta de que há pequenas diferenças.  Contudo, não creio que tais variações o levarão a considerar que se trata de dois idiomas distintos.
               Portanto, há um pouco de procustiano na prática imposta pelo Acordo Ortográfico, o que irrita as populações menores dos países envolvidos, quando grafias consagradas na prática local têm de ser sacrificadas na terrível cama do assaltante helênico.
                As dores decerto são menores, mas me pergunto se a raiva diante da legendária maldade por vezes não possa ser comparada com as supostas imposições por esses caminhos do mundo do imperialismo tupiniquim.


( Fontes: Folha de S. Paulo; Dicionário Mítico-Etimológico, de Junito  Brandão)   

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