O Impeachment desta feita
enfrenta obstáculos imprevistos, que objetivamente pouco têm a ver com as
condições objetivas que parecem determiná-lo.
Vamos por
partes. O que configura o(a) candidato(a) ao impeachment? A existência de um quadro de parte da mais alta
autoridade da República que recomende o recurso a esse instrumento utilizável
em casos extremos do ordenamento democrático.
Que quadro
é esse e quais são as condições que o tornam mandatório? Como premissa está o
desrespeito à legalidade constitucional. Não se presumem falhas aleatórias,
independentes da vontade do(a) primeiro(a) mandatário(a), mas sim comportamento
que não deixe dúvidas sobre esse animus
da alta autoridade.
Hors la loi (fora da lei) é um conceito
da legislação francesa que configura autoridade que conscientemente se afaste
dos parâmetros legais. Determinada tal situação, a autoridade não mais pode servir-se
das prerrogativas e garantias legais. Tal se baseia na simples razão de que,
quem desrespeita a lei, não pode dela valer-se para blindar-se posteriormente.
Deve
entender-se como a ultima ratio[1] da democracia. No
regime parlamentarista, a assembleia, pela moção de desconfiança, determina a
saída do governo de um primeiro ministro e de seu gabinete. O parlamentarismo,
que, no Brasil, vigorou no Segundo Reinado, e por um curto período na república,
é um regime mais flexível, e portanto mais aconselhável a países com as nossas
características.
No
presidencialismo, sendo o primeiro mandatário eleito pelo voto popular para
mandatos fixos (hoje, de quatro anos), desembaraçar-se de um chefe de governo é
tarefa mais complexa. Por essa razão, a nossa história recente só registra um
caso de impeachment.
Facilitou,
na época, que se chegasse a tal decisão, a circunstância de que o primeiro
mandatário atingido não era respaldado por um grande partido, como é atualmente
a Presidente.
Por motivos
bem conhecidos, adentrou o Brasil uma
vez mais nesse processo. As condições que criaram tal situação são, segundo o
apontam fortemente as aparências, a existência de uma coleção ilegal de fundos baseada na
principal companhia estatal, e que era realizada em detrimento dela e em favor
seja de seus 'operadores' , seja do próprio partido (dentro de mentalidade
voltada para o aparelhamento do estado).
Outra razão
para o impeachment está em governança que se afasta das normas legais, seja por
incompetência, seja por fins inconfessáveis.
Para este
segundo caso de impeachment
republicano, o Tribunal de Contas da União, após longo exame, e dada toda a
oportunidade de defesa à acusada por intermédio de sua representante, a
Advocacia Geral da União, optou por acolher o parecer do relator, quanto a
existência das chamadas pedaladas nas prestações de conta, pedaladas essas que
importam em desrespeito da Lei de Responsabilidade Fiscal, eis que se propõem a
mascarar o não-cumprimento dessa Lei. Pedaladas são empréstimos ilegais tomados
a bancos estatais (como o B.B., a CEF, o BNDES).
Uma das
características da administração Dilma Rousseff foi o pouco respeito aos
critérios fiscais. Despreparada para o ordenamento fiscal e o controle da
inflação, a Administração Dilma se pautou por uma gestão irresponsável dos
fundos públicos, que se caracterizou por uma cultura de déficit fiscal e de
pouca atenção às contas estatais e a seus recursos, com o surgimento de
déficits pesados e do reviver de uma cultura inflacionária. O maior responsável por isso não é Dilma
Rousseff, mas quem a indicou para a presidência, sem que ela reunisse as
condições mínimas necessárias para a exação de tal magno empenho.
Infelizmente, com o assistencialismo do Bolsa Família, e de uma Região a
ele dependente, havia tristes condições
para que a dita 'Mulher do Lula' fosse eleita, batendo um candidato muito mais
preparado e habilitado para o cargo, embora
se deva declarar que a sua chapa foi boicotada pelo seu principal rival
dentro do partido, e preenchida por um candidato a vice que não tinha o
gabarito para tal. Também houve inegável cristianização desse candidato no
importante estado de onde provinha o seu adversário interno. Tudo isso, junto
com a popularidade do principal chefe do PT, determinaria a eleição de alguém
que objetivamente não era a melhor candidata, nem estava preparada para tão
importante missão.
No
momento, as razões técnicas que fundamentam a condenação das pedaladas já estão
estabelecidas igualmente pelo corpo técnico da Câmara dos Deputados.
Há óbvias
condições políticas para o acolhimento das razões técnicas para o impeachment. No entanto, existe um óbice político de ordem
personalista. Determina a Constituição e dispõe, por conseguinte, o Regimento
da Câmara que cabe ao seu Presidente dar início ao processo de impeachment, uma
vez determinada a sua procedência. Não poderia haver signatário de maior peso
ético, moral e intelectual de que o Dr. Hélio Bicudo - que deixou o PT por
imperativo ético da crise do Mensalão. No entanto, um processo fundamentado e
baseado outrossim no sentir de larga faixa da opinião pública nacional, chega
às mãos de alguém que ocupa alto posto constitucional e que deveria ter a necessária
isenção para uma decisão republicana.
Sem embargo, há muitas dúvidas quanto à
condição de parte da autoridade constitucionalmente investida de uma decisão
pautada no direito e no interesse nacional. Com o aval do corpo técnico da
Câmara, o que pode impedir Sua Excelência o Deputado Eduardo Cunha de
desincumbir-se desse dever legal e constitucional?
Correm a
respeito rumores de que o Governo de Dilma Rousseff, temeroso das consequências
do dito procedimento, teria acenado à referida autoridade sobre a possibilidade
de uma combinação que não corresponde aos interesses da Nação, vale dizer criar
condições para alegadamente isentar a
referida autoridade dos processos legais a que deveria responder. Além da
verificação simples de que seria no caso 'un marché des dupes' (um negócio de tolos), ou traduzindo em
linguagem cabocla, um 'conto do vigário' porque a presidência não pode prometer
o que não está no seu poder, é de esperar-se que Sua Excelência o Senhor
Deputado, Eduardo Cunha, acolha a petição e a encaminhe ao Plenário da Câmara,
como determina a Lei.
( Fontes: O Globo,
Folha de S. Paulo )
Nenhum comentário:
Postar um comentário