O título talvez seja longo, mas logo
parecerá mais curto para o olhar do brasileiro.
Assim, não é
de hoje que o dia-a-dia do morador de Pindorama
pode sofrer bruscas mudanças para melhor, se partes de sua realidade diária tiverem
de ser vistas ou vividas pelo estrangeiro.
Se este
estrangeiro, for poderoso - ou até o mais poderoso do momento histórico - o
cotidiano do brasileiro pode receber ou transformações, ou remendos temporários
- que tendem a melhorar ainda que de forma conjuntural a realidade
sócio-política em que vive.
Assim, em
grandes eventos, como bem sabemos, a autoridade brasileira, se ainda não consegue
transformar a realidade nacional para o melhor permanente, tem habilidade em
dois ou até três aspectos a ela relacionados: domina a tecnologia do make-believe (fazer crer) como construir
pavilhões
de Poniatowski (como o primeiro ministro de Catarina a
Grande), só que a versão moderna dos ditos pavilhões ou são filmetes de propaganda com o escopo de enfeitar a realidade nacional para os
olhos dos árbitros dos grandes certamens, ou (b) a organização pelo tempo indispensável
(até por períodos curtos de uma a duas semanas) de cenários que de algum modo
se aproximam da sonhada realidade melhorada. Não estará excluído que cerceado
pelo conluio de contradições aparentes, venha até a recorrer a velhos truques do Barão de Munchausen, i.e.,
a mentirinha, como prometer que vai sanear determinada baía ou até uma lagoa
menor, o que corresponde apenas a reflexo imediato, que não tem a menor intenção
de transportar para a realidade.
O chamado jeitinho brasileiro - que é o
subterfúgio para o truque ocasional e supostamente reservado aos cognoscenti
(conhecedores) é um fato tão
difundido sobre o brasileiro e, em especial, a autoridade brasileira, que
estrangeiros (em geral os menos informados e/ou mais ingênuos) não se pejam de
perguntar diante de dificuldade burocrática, de qual seria o jeitinho que resolveria o caso. Embora a palavra rescenda a corrupção,
sobretudo aquela leve, ou melhor dizendo light, para conformar-se à ânsia de torná-la ou
mais palatável, ou menos feia, o dito jeitinho transmite ideia que me parece
prosaica, mas realista quanto à empulhação pela autoridade.
Não nos deixa mentir a expressão para inglês ver a que no tempo do Império
(século XIX), o brasileiro comum se referia aos arranjos e enfeites
temporários com que a autoridade enfeitava a mui heróica e leal cidade de são
Sebastião do Rio de Janeiro, quando por aqui aportava a grande potência da
época, a pérfida Álbion, de que os mares constituíam um amplo e cômodo lago.
Esse modo um
tanto esquizofrênico de lidar com a realidade nacional e a atitude tanto da
Autoridade, quanto de seus servidores, e até do Povão amigo, há de apelar para
o modo mais simples de relacionar-se com o dito Ambiente, que será sempre a
Mentira, ou, se preferirmos, a sua versão mais educada, a Ficção (o que muda é
o vestuário e a respectiva qualidade na apresentação).
Sabemos que
a lorota ou a caracterização inventiva terá as pernas curtas, no sentido de que
o seu prazo de validade tende a ser extrema e incomodamente fugaz, mas para os
atores do espetáculo a esperança reside nesses prazos bastante exíguos da
encenação, ou, melhor dizendo, competição internacional.
Por causa de
inúmeros aspectos - a preguiça é um deles - mas notadamente a consciência de
que a ameaça - no caso da presença estrangeira obrigatória e, por consequente,
intrusiva - não é permanente nem eterna, e felizmente temporária e
relativamente breve, a solução do breve enganoso (realidade enfeitada)
constitui uma das soluções preferidas.
Quando a
realidade (por causa em geral de suas dimensões, ou da indolência da autoridade
envolvida) não é suscetível de ficções temporárias, quem prometeu e não cumpriu, uma vez entalado
na contradição, partirá para a assunção da realidade em último caso, como v.g. no que concerne ao vexame da baía
de Guanabara, em que se prometeu atacar a poluição que decorre sobretudo de
despejo de esgotos não-tratados pelas cidades e povoações ribeirinhas, mas
também de desleixo (como ocorre v.g.
com o rio Tietê em São Paulo, que é sufocada pela agressiva ignorância
ribeirinha através do lixo e da incúria. Nesse caso, a autoridade parte para a
brutal franqueza, que é a maneira traumática (cortar o nó Górdio) de
'solucionar' o problema, como se partir para a grossura diminuísse o logro.
No que
tange à desigualdade social, se ela não merecer o cuidado da autoridade
respectiva, cuidado esse que pode revestir diversas formas, todas elas
implicando esforço e continuidade,
a consequência será mais
sujeira. Fala-se muito em integração da
favela com a cidade. Nada contra. Mas não nos esqueçamos de que essa integração
é uma rua de duas mãos: envolve respeito pelos seus habitantes, respeito esse
da PM e de todas as autoridades do Estado e, também, respeito dos habitantes dessa comunidade, que colaboram com a coleta de lixo e todos os demais
pormenores da vida citadina (que as novelas da Tevê costumam dissimular ou até
mesmo omitir)...
( Fontes: Rede
Globo, O
Globo )
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