sexta-feira, 23 de outubro de 2015

Benghazi: audiência de Hillary


                            
          A maratona da audiência de Comitê da Câmara de Representantes para interrogar Hillary Clinton sobre a tragédia de Benghazi se estendeu por mais de oito horas, com duas sessões, pela manhã (com início às dez horas) e tarde, alcançando a noite (cerca de vinte e uma horas) de 22 de outubro corrente.

         Presididos pelo deputado da Carolina do Sul, Trey Gowdy, que não mostrou a tradicional fidalguia sulina, os republicanos - nessa enésima convocação de Hillary - mostraram claramente qual era o seu objetivo. O de instrumentalizar o mais possível o drama da missão em Benghazi para tentar extrair o máximo de proveito político com o  eventual desgaste de Hillary Clinton. Salta aos olhos que o exercício - como de resto o sublinhara anteriormente Kevin McCarthy, líder da maioria na Câmara,  um dos republicanos mais categorizados (considerado inclusive para suceder ao atual Speaker) - é a instrumentalização do desejo do GOP de valer-se desse incidente diplomático para prejudicar no que for possível a  candidatura  de Hillary à presidência.

          Durante todo o exaustivo exercício, Hillary manteve a calma, a despeito de quesitos de inusitada agressividade, dentro do espírito de visceral antagonismo que preside às relações entre os dois partidos, e de forma ainda mais acirrada na Câmara.

          O escopo dos membros do GOP era o de tentar demonstrar que a então Secretária de Estado fora omissa no cumprimento de seu dever de ofício. Dentro de visceral assunção do espírito promotorial, tentavam sempre fazer com que ela perdesse a compostura. As sete investigações anteriores não bastaram para que a fúria inquisitorial dos promotorzinhos republicanos chegasse mais composta a essa nova escala do interminável processo.

         Eles dispuseram de um dia inteiro para investir com perguntas capciosas e agressivas, no esforço de fazê-la cair em contradição. Fruiram, inclusive,do  bônus de suplementar da audiência ter sido televisada para toda a Nação americana. Não contaram, todavia, com a circunstância de que Hillary é  uma calejada parlamentar. Por isso, ela não perderia a oportunidade de responder aos seus mais ferozes críticos, além de valer-se da tribuna congressual (o que não fazia desde princípios de 2013) para dar detalhadas explicações dos seus esforços diplomáticos nas principais esferas mundiais como Secretária de Estado, assim como de sua ação específica no caso, antes e depois do ataque à missão em Benghazi.

           Os republicanos voltaram ao ataque - a despeito de ser um tópico já demasiado batido - no que tange à questão do uso por Hillary do servidor privado de e-mail. Em acalorada intervenção, Hillary Clinton explicou pela enésima vez que tinha cometido um erro no uso dessa conta de servidor privado de e-mail, mas asseverou - confirmando observações anteriores - que ela nunca tinha enviado ou recebido qualquer comunicação marcada como classificada (confidencial). Para mostrar a sua boa fé na matéria não trepidou em pôr à disposição do público  todos os seus e-mails transmitidos pelo dito servidor.

            Também foram rejeitadas por Hillary as acusações dos republicanos que ela houvesse ignorado as necessidades de Benghazi em termos de segurança nos meses anteriores ao ataque de Benghazi. Os deputados democratas no Comitê em suas intervenções descreveram os republicanos como líderes de uma cruzada partidária contra Hillary, enquanto esses últimos raivosamente inculpavam os democratas de tentar bloquear o inquérito do GOP, máxime por causa de supostas falhas graves na segurança.

            Se a facção republicana tentou comprometer Hillary com o fato de enviar e-mails para o amigo da família Sidney Blummental (de que Obama bloqueara a nomeação para integrar o Departamento de Estado) e não haver e-mail seu para o embaixador Christopher Stevens, dada a maldade da acusação,  Hillary disse que não ficaria sentada em silêncio, enquanto o presidente do Comitê, Mr. Gowdy, tentava atacar-lhe a reputação. Foi um raro momento em que Hillary perdeu a calma, e foi bem dosado, dado o exagero e a falta de respeito em que incorrera o chefe do dito comitê.  Na maior parte do tempo, porém, Hillary conservou o perfil de autoridade e compostura. Já na sua declaração inicial, a ex-Secretária de Estado apelara para o Comitê que mostrasse espírito de estadista  "num inquérito que já se estende por muito tempo".

              Alternando a atitude entre irônica e admirada, mas não deixando entrever irritação ou raiva, ela recordou em várias ocasiões a coragem do embaixador morto, J.Christopher Stevens e de seus três colegas mortos na missão.

               Como é de esperar-se, de novo Hillary assumiu a própria responsabilidade pelos ataques nos quais os quatro americanos morreram, mas reiterou por mais de uma vez que, enquanto Secretária de Estado, ela não aprovara ou denegara solicitações de segurança extra na missão de Benghazi. A esse propósito, ela asseverou para os funcionários do inquérito na matéria que os Estados Unidos da América não deve recuar diante de diplomacia afirmativa (assertive) por causa do incidente de Benghazi. Por isso, para ela, a retirada não é uma opção.

                 A respeito da acusação de que teria contribuído para a morte do Senhor Stevens, um amigo pessoal, ela a qualificava como 'pessoalmente dolorosa' e 'profundamente acabrunhante'.

                  Nesse contexto, a Senhora Clinton censurou o governo pelo malogro de não realizar uma busca bipartidária da verdade. 'Isso foi o que aconteceu durante a Administração Reagan, quando o Hezbollah atacou a nossa embaixada'. No mesmo sentido, a Senhora Clinton aludiu a inquéritos bipartidários conduzidos nas Administrações Clinton e George W. Bush. Gostaria de voltar a esses tempos, disse ela.

                 O Senhor Schiff acusou ao final os republicanos de adotarem uma espécie de promotoria contra a Senhora Clinton, no intento de prejudicar-lhe a campanha presidencial. Para ele, a teoria básica dos republicanos é que a Senhora Clinton interferiu de modo deliberado em Benghazi e tal resultou na morte de pessoas. Sem embargo do fato de que as muitas investigações não hajam encontrado nenhum mérito nessa tese, é esta a impressão que, apesar de tudo, eles querem deixar.

                Ao final, a senhora Clinton reiterou: (Stevens) não levantou o tópico da segurança  com os integrantes de meu gabinete, pois ele tratou de segurança com o pessoal dela encarregado. Se ele o tivesse levantado comigo, estaria dizendo para você que ele o havia feito.

                     

( Fonte:  The New York Times )

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