O círculo de correspondentes de
Brasília, aferrando-se às fontes palacianas, bem sabe que, para ter trânsito na
Corte, precisa mimetizar a linguagem do poder. Assim, já no domingo, com os milhões de demonstrantes
baixando às ruas para reiterar o Fora Dilma! repetiam eles a lição
petista de, contra tudo e todos, afetar normalidade, como se gritar pelo Impeachment de Dilma faça parte do
léxico político de todos os dias...
Dentro da dinâmica da crise – e das
revoluções, pacíficas ou não – a tendência de todos os governos é enfatizar a
sua suposta legalidade e melhora nas próprias condições, em geral só
discernível por gente do palácio. A postura de avestruz é mais humana de o que
se pensa, e, em geral, o golpe que leva ao nocaute ou desorienta, vem de um
canto inesperado.
Dentro desta
lógica, a declaração do ex-Presidente Fernando
Henrique Cardoso, havido por gregos e troianos como moderado, veio lançar a
confusão nas fileiras do petismo, que pensava poder cinicamente abraçar a
demonstração, para melhor sufocá-la e desencaminhá-la.
O que disse
Fernando Henrique ? “Se a própria Presidente
não for capaz de gesto de grandeza (renúncia ou a voz franca de que errou, e
sabe apontar os caminhos da recuperação nacional), assistiremos à
desarticulação crescente do governo e do Congresso, a golpes de Lava-Jato.”
Em análise
sobre as manifestações de domingo último, FHC disse que “o mais significativo
das demonstrações é a persistência do sentimento popular de que o governo, embora legal, é ilegítimo. Falta-lhe a base
moral, que foi corroída pelas falcatruas do lulopetismo.”
E numa alusão
direta ao boneco do ex-presidente Lula vestido de presidiário, que foi levado
às ruas por manifestantes em Brasília, disse Fernando Henrique:
“a
Presidente, mesmo que pessoalmente possa se salvaguardar, sofre
contaminação dos malfeitos de seu
patrono (Lula da Silva) e vai perdendo condições de governar.”
Fernando Henrique Cardoso conclui a sua
declaração com o seguinte vaticínio: a desarticulação se manterá “até que com
algum líder com força moral diga, como o fez Ulysses Guimarães, com a Constituição na mão, ao Collor: você pensa
que é presidente, mas já não é mais.”
Sobre as
razões pelas quais FHC julgou oportuno intervir com tal contundência,
especula-se que seriam sobretudo o tamanho
das manifestações (maiores que as de abril) e a circunstância de terem
chegado ao Nordeste, principal reduto ‘lulopetista’.
Além disso, nem o entendimento de cessar-fogo
costurado no Senado há pouco mais de semana logrou tirar da inércia o governo
Dilma. Poderia ter até permitido a aprovação de medidas do ajuste fiscal. Mas
nada aconteceu.
As
respostas petistas ao manifesto de FHC são chãs. O líder do governo na Câmara,
José Guimarães (PT-CE) chegou a dizer: “Será que ele está girando bem?”,
enquanto aquele no Senado, Humberto Costa (PE) lamentou a declaração do
ex-presidente e disse “ Foi um ato de pequenez política.”
Na prática,
não houve contestação. As respostas são
chochas, e o sentimento de que as assertivas do ex-presidente calaram fundo, persiste.
( Fonte: O Globo )
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