domingo, 7 de agosto de 2016

O Escândalo das Legendas Partidárias

                      

         Ocasionado por uma das mais ineptas sentenças do Supremo, em que Suas Excelências derrubaram a cláusula de   barreira, a primeiro de outubro de 2015, que lei ordinária, aprovada pelo Congresso se dispunha a implantar.
        Provocados por uma Adin (ação direta de inconstitucionalidade), naquele primeiro de outubro e por unanimidade, os então membros do Supremo julgaram inconstitucional a lei ordinária que pretendera restringir o número de partidos.
         Em países democráticos como a Alemanha Federal existe lei que cassa o registro daquele partido que não preenche a quota de 5% em eleições federais. Essa quota evita a existência de minipartidos. O partido liberal alemão (Freidemocratisch Partei) é um dos que mais tem sido atingido pela aplicação de tal lei. Qual é o remédio a que recorre este partido? A reinscrição para a próxima eleição. Muitas vezes o FDP logra superar tal barreira e volta ao Parlamento Federal, se atingida a quota de 5% nas eleições seguintes.
         A RFA será por essa causa considerada menos democrática? Claro que não. O objetivo da cláusula é o de evitar a excessiva fragmentação partidária, como ocorreu na República de Weimar, que gestou o nazismo.
          No Brasil, logo se fez sentir a apressada votação contrária à lei ordinária que pretendera estabelecer entre nós um modesto limite para o número de pequenos partidos. Tristemente, falta-nos hoje a presença de alguém como Sérgio Porto, mais conhecido pelo heterônimo Stanislaw Ponte Preta (1923-1968), para estigmatizar a besteira, a canalhice e também uma mistura dessas duas atitudes.  O Febeapá (festival de besteira que assola o país) se referia ao regime militar, mas estou certo que Stanislaw não deixaria hoje passar esse agressivo besteirol de confundir democracia com exploração partidária.
           Pois é exatamente isto que ora temos a ver.
           Não falo apenas dos dois senhores que concorrem ritualmente à Presidência da República em todos os últimos pleitos realizados no Brasil. José Maria Eymael (PSDC) já concorreu à presidência da república por quatro vezes, e Levy Fidelix (PRTB), por três vezes.
            Não pretendo aqui discutir o direito teórico desses senhores candidatarem-se à presidência. Esse direito lhes assiste. Mas o que tenho dúvidas é o tempo que lhes é concedido pela lei eleitoral, nesses pleitos que se ultimam sempre da mesma forma. Em uma das últimas vezes, o Senhor Fidelix investiu contra um dos jornalistas de que o áudio captara o comentário de estar ele incluído entre os candidatos que se valem de legendas ditas de aluguel.
              Note-se que, além de Eymael e Fidelix, há outros candidatos de partidos nanicos, mas que colocam o próprio nome para divulgar as respectivas legendas. Tratando-se do primeiro turno, e representando partidos que têm parlamentares no Congresso, a missão desses candidatos nanicos é uma de sacrifício, eis que se propõem divulgar a respectiva ideologia. Quanto a isso, dentro dos necessários limites constitucionais, não há o que contestar. Relaciono, a seguir, os nomes dos principais candidatos nanicos, no primeiro turno de 2014: Pastor Everaldo (PSC), Eduardo Jorge (PV),  Luciana Genro (PSOL), Zé Maria (PSTU), Rui Costa Pimenta (PCO) e Mauro Iasi (PCB).
              Existem atualmente 35 partidos no Congresso. E 34 estão em suposta formação!  No artigo de O Globo, aí estão as designações  desses protopartidos (que em muitos dos casos já apontam para uma deformação da finalidade política da agremiação): Partido do Servidor Público e Privado; Partido Carismático Social, Partido Militar Brasileiro, e Partido Piratas(sic).
               Se todas essas formações, muitas delas caricatas, forem homologadas pelo TSE, o Brasil chegará a 69 siglas. É importante ter presente que, mesmo sem receber nenhum voto,  tais agremiações terão direito  ao dinheiro do Fundo Partidário, condições de propaganda em rádio e tevê, e disputas sem cláusulas de barreira.
                Existe aqui - como assinala a matéria de O Globo - não há problema em que um país determinado tenha centenas de legendas, eis que várias  democracias tais números são tolerados. Como sublinha o cientista político da UFRJ, Jairo Nicolau "em nenhum país do mundo, exceto no Brasil, uma legenda só por obter registro, sem sequer concorrer numa eleição, tem direito a Fundo Partidário.  É uma questão de mercado, como assinala Nicolau: "Em vez de abrir uma loja de iogurte gelado, o sujeito acha mais interessante abrir um partido."
                 De acordo com Nicolau, o Partido da Causa Operária ilustra à maravilha o seu argumento: Elegeu apenas um vereador em 21 anos de existência, e contando com menos de três mil filiados, o  PCO amealhou R$ 1,3 milhão em 2015.
                 É o escândalo do desperdício. Bastar obter o registro - que se no caso do Partido autêntico de Marina Silva foi difícil conseguir- para todos esses mini-partidos é apenas um esforço burocrático - e eis que o partideco tem direito aos R$ 1,3 milhão do Fundo Partidário, sem qualquer contrapartida eleitoral.
                 O número dos partidos no Brasil cresce como um fenômeno burocrático, mas que tem consequências orçamentárias, eis que na prática se financia partidos fajutos, organizações fantasmas, que muita vez se constituem para obter o dinheiro do Fundo Partidário.
                 A perspectiva, portanto, se nada for feito - e até agora ninguém se mexeu para pôr ordem nesse galinheiro - é que em breve teremos 69 partidos!  Esses partidos, uma vez formados, comparecerão no horário nobre da tevê, invadindo por motivos espúrios o tempo do tele-espectador, como hoje tantas vezes ocorre, inclusive com o requinte de fazê-lo na hora do Jornal Nacional !
                   Diante disso tudo - a ridícula sentença do STF acabando com a cláusula de barreira, a explosão das legendas burocrático-oportunistas, e o desperdício do dinheiro público com a distribuição de R$ 1,3 milhão, a título de Fundo Partidário (mesmo que o grêmio em causa seja apenas aproveitador, sem qualquer representação política!)
                    Por quanto tempo esse novo Febeapá - agora na democracia - existirá para desperdiçar o montão de tributos que são criados a cada hora para extorquir o cidadão brasileiro  - e tudo isso começou num alegre e coletivo erro do Supremo,e agora com um Fundo Partidário, que na verdade existe na grande maioria apenas para explorar um descabido desperdício do dinheiro público!
                      Até quando, Catilina[1], abusarás de nossa confiança?, já dizia Marco Tulio Cícero,  Consul de Roma no 1º Século Antes de Cristo.
                       E Excelências do Supremo Tribunal Federal, e do Congresso da República, tanto Senadores, quanto Deputados, até quando continuará essa cultura do cínico desperdício ? 

 ( Fontes:  O  Globo; Marco Tulio Cícero, discurso contra Catilina)  




[1] Lucius Sergius Catilina (m. 62 AC)

Nenhum comentário: