sábado, 6 de agosto de 2016

Abertura das Olimpíadas no Rio

                             

         É vizinho do impossível agradar a todos, e mais ainda àqueles habituados a pronunciar vereditos sobre o restante da Humanidade, empoleirados em posições que acreditam colocadas sob o eterno favor da Endinheirada Fama e do rio Hudson, bafejado este pela circundante  fortuna da grande metrópole americana.
        Depois de muita luta, o Rio de Janeiro logrou o seu lugar não ao Sol, mas junto aos favores da mídia universal e com a vênia dos suaves, macios e repousantes raios reflexos dessa nossa eterna companheira das noites, como o será dos românticos, do sertão ou alhures, esta  Lua que no céu sempre flutua. Não te importes, conterrânea Gisele, que a tua caminhada, como expressão da graça, beleza e desenvoltura da mulher brasileira, se faça no radioso entorno da abertura da festa universal das Olimpíadas de que participaram mais de centena de delegações, algumas delas simbólicas, e outras que semelham envergonhadas de exibir a formosura de metade de suas populações.
        A festa da apresentação das Olimpíadas nessa cidade que teima ser maravilhosa deveria ser continuada pela luz que se quer eterna, e que nos chega do Peloponeso, quando nos domínios de Olímpia, na velha Hellas se ordenava reinasse a Paz, ainda que por poucos dias, para que os atletas do mundo helênico que naqueles tempos abraçava o Egeu, o mar Tirreno e a própria Anatólia, participassem dos desforços tradicionais. Aos campeões se cingia com coroas de louro, e para os verdadeiramente grandes se elevavam no entorno de Olímpia monumentos cinzelados conforme as antigas dimensões do renome dos heróis helênicos, que hoje modestos nos parecem, quando esquecemos a força desses feitos, que marcavam presença na angusta geografia de proezas e ao mesmo tempo fincavam na terra o mármore que supunham eterno para dizer aos pósteros que não se olvidassem das vitórias passadas.
         Em termos de oportunidade, me parece de fundada ainda que postergada justiça, que o nosso compatriota Vanderlei Cordeiro de Lima, maratonista em Atenas, acendesse ontem a Pira olímpica. Na verdade, caberia ao nosso maior herói Edson Arantes do Nascimento, o imortal Pelé, cumprir essa honrosa formalidade. Ele, no entanto, por causa de seu futebol, e do temor que infundia aos muitos jogadores com que se defrontou para lograr o feito único dos mil gols (que completara no Maracanã, contra o goleiro Andrade), temor esse que se repetiria em demasiadas faltas contra ele aplicadas, Pelé, o maior craque de todos os tempos, sofre hoje da coluna - registro individual e implacável da violência dos fouls que lhe foram feitos ao longo de sua brilhante carreira. Por isso, ele não teve condições físicas de realizar o singelo atear da pira olímpica.
         Na falta do campeão, foi muito oportuna a escolha de Valdemar Cordeiro de Lima, maratonista na Olimpíada de Atenas, e que dispunha nesse prélio de folgada vantagem. No entanto, nas vizinhanças do estádio onde romperia a fita que simbolicamente eterniza o feito do mensageiro que levou aos atenienses a boa nova da vitória contra os Persas em Maratona, surgiu em espaço não-policiado um estranho padre que vinha oficiar não uma missa, ou sequer benzer o corredor, mas sim abraçá-lo como um tamanduá para quebrar-lhe o elã e facilitar a vitória de outrem.
          Revoltou a nós brasileiros que esse bizarro sacerdote se julgasse autorizado a desvirtuar a vitória já quase certa - dada a vantagem de que dispunha o nosso corredor.  Quebrado o seu ritmo - e sem ajuda de nenhum elemento de policiamento ausente, e por conseguinte conivente - ficaria para Vanderlei apenas o bronze dessa antiga corrida.  Ignoro quais eram os propósitos desse fantasmagórico oficiante que se julgava intitulado a decidir - fora do campo e da justiça - quem deveria ser o vencedor de mais aquela maratona.
           Não nos escapa a ironia de que o mensageiro - que simboliza o primeiro maratonista, ao levar para Atenas a notícia da vitória sobre Xerxes e o exército persa - tinha o nome Filipedes, e morreu após dizer "enikamen (vencemos)". De qualquer forma, esse vencedor moral da Olimpíada de Atenas, o brasileiro Vanderlei foi honrado com homenagem, antes destinada a Pelé, e que o grande craque não pode cumprir por seu estado de saúde.  
           Uma palavra final sobre a apresentação da festa olímpica. Utilizando o entorno do Maracanã, esse grande símbolo do amor do brasileiro pelo futebol, nos é difícil descrever a beleza e a simbologia da apresentação feita na linguagem da pós-modernidade para a reedição desse festival de paz da Humanidade, que são as olimpíadas. Nada mais oportuno de que realizá-la na linguagem do virtual. Esse novo fraseado da arte representou por cerca de uma hora a mensagem de paz que o esporte simboliza, sem deixar de lado o aporte de nossa cultura e do nosso cântico de homenagem à música e à dança.


( Fontes: Rede Globo, The New York Times )                  

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