segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

Do Poder e seus limites

Muito ainda há de escrever-se sobre o recente aumento omnibus decidido e votado no mesmo dia pelas duas Casas do Congresso. Antes de suscitar enganosas expectativas, é bom frisar que o omnibus supra-referido se reporta unicamente às hiper-estruturas do mando neste país. Com exceção dos eventuais beneficiados pelo chamado efeito cascata, a prática a que atônitos assistimos só interessa aos grandes Senhores da República, vale dizer, Presidente e Vice-Presidente da República, Ministros de Estado, Senadores, Deputados e Ministros do Supremo Tribunal Federal.
Longe está o tempo em que, a par dos deveres e responsabilidades dos altos cargos, dentre os seus direitos e prerrogativas sobressaía o do exemplo a ser prestado no respectivo exercício aos demais cidadãos.
Há cenas e espetáculos que carecem de mais vagar para que os possamos captar e entender em tudo o que significam. Quanto mais se medite sobre o deplorável comportamento de Suas Excelências, mais teremos motivo de sentir quão afastados eles se acham do Povo brasileiro.
Que insano corporativismo é este que se arrogam os mandatários da Nação. Com o menosprezo de os que se crêem poderosos eles dispõem, arrogantes e insensíveis, das formalidades e exigências que formam o tecido da existência de todos os demais brasileiros que da planície e de sua vida morigerada os elegeram.
Na distância do Planalto Central, nos palácios magníficos do traço de Oscar Niemeyer, e nos grandes espaços marcados por Lúcio Costa, eles se tomam por uma corte, em que o real privilégio lhes torna tudo possível, inclusive a despejada e despudorada auto-concessão de vantagens que como o ouro dos antigos regimes cai sobre os seus ombros e vai célere cavando largo fosso que os separa da perplexa sociedade civil. Inebriados pelo poder e suas tão fáceis benesses, os representantes do Povo mais que dele se apartem, na verdade na própria alucinação o ignoram, como se, cumprido o pontual dever cívico, não mais se reconheçam do autêntico Soberano as criaturas que sempre serão.
Quando falta o senso da realidade – e que maior prova disso nos deram os senhores congressistas nessa alegre festança com o dinheiro do contribuinte – tudo se pode esperar em matéria de desarrazoado. Dessarte, a falta de proporção com a realidade brasileira em tais inchadas, escandalosas remuneraçoes dá as mãos à equalização de o que deve ser específico.
Que Frankenstein é este onde ministros demissíveis ad nutum ostentam o mesmo salário que o Primeiro Mandatário da Nação ? Em que Presidente, Senador e Deputado percebam o mesmo salário, como se os quinhentos e tantos deputados, os oitenta e poucos senadores tivessem atribuições na mesma altura do Primeiro Magistrado ? Isto sem falar dos Ministros do Supremo, que fornecem o generoso cabide onde os demais se dependuram.
O teatro da semana passada – encenado na quarta-feira, único dia de presença assegurada de Suas Excelências na Capital Federal – dói ainda mais, na sua lembrança e repensamento, aos nos darmos conta de que nos largos recintos do poder não ecoou uma só palavra, um só protesto, que, por um instante, quebrasse a ilusória atmosfera de um regime de privilégio.

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