As duas oitavas de final de ontem vieram corroborar, uma vez mais nesta Copa do Mundo, inquietante característica deste torneio. A má qualidade das arbitragens tem sido uma constante na Copa da África do Sul. Esse peculiar traço, no entanto, é muitas vezes acompanhado por consequência ainda mais grave: os grosseiros erros dos juízes não constituem apenas lamentáveis ocorrências, condenáveis pelos intrínsecos defeitos. Na verdade, através de suas decisões equivocadas, os árbitros aparecem como agentes determinantes dos respectivos resultados.
As duas partidas de ontem evidenciam esta falha gritante do certamen da FIFA. No jogo Alemanha x Inglaterra, o juiz uruguaio Jorge Larrionda não validou o gol do inglês Lampard, que, sob os olhos do goleiro alemão, cruzara a meta em 36 cm. Por sua vez, em Argentina x Alemanha, o primeiro gol argentino, de Tevez, foi em flagrante impedimento, não marcado pelo italiano Roberto Rosetti.
Mas o mal que os senhores árbitros – e os inúteis bandeirinhas – cometeram não foram atos apenas censuráveis, porém sem ulteriores consequências. Com efeito, Larrionda impediu que a Inglaterra empatasse em 2x2 o embate com a Alemanha, e, por seu lado, validando o ilegal gol argentino, Rosetti deu senhora ajuda à esquadra de Maradona. Até aquele momento era o México e não a Argentina que mais ameaçava o arco adversário. Além disso, dando injusta vantagem para os portenhos, Sua Senhoria Rosetti deu marcada contribuição para desestruturar emocionalmente o time mexicano, como qualquer assistente da partida pôde amplamente verificar.
O próprio semblante do juiz italiano Roberto Rosetti nos minutos seguintes ao gol em flagrante impedimento poderia ser arrolado, se a matéria fosse revista em corte desportiva, como prova indicial do descomunal erro do bandeirinha Stefano Ayroldi, por ele avalizado. Acossado pelos jogadores mexicanos que reclamavam da injustiça, no seu rosto não se lia a certeza de decisão inconteste, mas a ânsia de quem se apressara em confirmar a falha do companheiro de equipe arbitral, e que agora não tinha a coragem de rever o açodado gesto.
O jornal O Globo relacionou seis clamorosos erros arbitrais nesse Mundial, todos eles com influência direta no resultado final da partida. Por ora, o Brasil está entre os ‘beneficiados’ por esta característica melancólica (o braço de Luis Fabiano utilizado impunemente no segundo gol contra a Costa do Marfim, não visto pelo francês Stéphane Lannoy).
São os juízes os principais responsáveis por tais situações ? A resposta é não. A FIFA de Sepp Blattner tem mantido, por intermédio de sua Comissão arbitral, postura que pode ser interpretada, ou como a encarnação da ineficiência do personagem Mr. Magoo, ou a negativa de valer-se da tecnologia para contrabalançar o poder discricionário dos juízes.
Qualquer pessoa com mínima noção da progressão do conhecimento tem elementos para prever qual será o lado vencedor nesta contenda. A asserção do monge Roger Bacon de que conhecimento é poder, tem aqui o seu corolário de que também o é a negação do conhecimento.
É óbvia que tal posição retrógrada e epimeteica da Fifa será descartada mais dia, menos dia. Já se sabe que através de um chip se pode determinar se a bola cruzou ou não a linha de gol e de fundo. A International Board – composta de quatro membros da Fifa e de quatro britânicos[1] - pode mudar a regra por maioria de seis votos e é de todo interesse que assim proceda.
Dado o caráter falível do julgamento de árbitros e bandeirinhas – como esse Mundial semelha desejar realçar ao extremo – é mais do que oportuno abandonar anacrônicas resistências contra a tecnologia e dela valer-se para que ganhe o esporte e sobretudo a lisura de seus resultados.
Que Dunga venha a campo favorecer a posição tradicional, não surpreende. Mas o senhor Joseph Blattner não poderia continuar a omitir-se diante de crassos e evitáveis erros de arbitragem. Não se trata apenas de obstaculizar a atuação do quarto árbitro, a quem até se proibiu de valer-se de um aparelho de televisão.
É preciso escancarar a porta para valorizar o acerto e não o erro, a realidade e não o que passa na cabeça de um juiz e/ou bandeirinha. A sua presença continua a ser necessária, mas, no próprio interesse deles, carece de ser apoiada pelos modernos recursos da tecnologia. Há 44 anos atrás, a discussão ainda era cabível se o gol dos ingleses (contra os alemães) em Wembley existira ou não. Hoje em dia, tornar possível a coonestação de decisões erradas, só pode ser atribuído à eventual aliança da burrice retrógrada com interesses inconfessáveis de preservação de poder.
Está escrito em letras garrafais nas paredes dos estádios que a tola onipotência dos juízes (e ineptos bandeirinhas) tem os dias contados. Senhor Blattner, mostre, por uma vez , ideia de grandeza e abra portas e janelas para a justiça tecnológica nos campos do velho esporte bretão.
(Fonte: O Globo )
[1] Representantes das Associações pioneiras do esporte – Inglaterra, Escócia, Irlanda e País de Gales.
segunda-feira, 28 de junho de 2010
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