Talvez a mais importante legislação aprovada por esta legislatura seja a chamada Lei da Ficha Limpa. Tão logo sancionada e promulgada, a antiga P.L.P. 518/09 começa a produzir efeitos moralizadores e profiláticos.
A tal propósito, parece apropriado analisar-lhe o processo de criação, os seus primeiros resultados e as ilações que desde já podem ser dela elaboradas.
Dentre os institutos consagrados pela Constituição de 5 de outubro de 1988, a Constituição Cidadã, quiçá o da iniciativa popular de leis represente um dos mais benéficos.
Nesse particular, o projeto de lei preparado pelo Movimento contra a Corrupção Eleitoral nos ensina tópicos que não devem ser esquecidos: tais projetos, se consubstanciam aspirações de largos segmentos da opinião pública, se são adequadamente redigidos, e se são apresentados no momento político apropriado, tais projetos, repito, reunirão condições bastante fortes de serem aprovados pelo Congresso.
Com efeito, a própria tramitação da PLP 518 veio demonstrar a eficácia do atendimento de tais requisitos. A reticência – que disfarçava a má-vontade – do Presidente da Câmara na audiência concedida à comissão do MCCE, já assinalava dois traços que acompanhariam toda a progressão desse projeto da sociedade:(i) a surda oposição de grande número de congressistas e (ii) o desafio colocado pela iniciativa, diante da proximidade das eleições legislativas.
Essa oposição se traduziria nos intentos do colégio de líderes da Câmara de engavetar o projeto. Incrementada a pressão, se transigiu em permitir-lhe a tramitação, enquanto se buscou desvirtuar a PLP 518. Nas modificações introduzidas pelo substitutivo, no entanto, a mais importante elevou para os condenados em segunda instância a exclusão do processo eleitoral, o que atendia ao reparo feito pelo Deputado Michel Temer, quando da solene entrega do projeto. Por outro lado, essas emendas não lograriam deturpar o escopo precípuo da legislação.
A principal lição a ser colhida da aprovação da Lei da Ficha Limpa é que o conduto dos projetos de lei de iniciativa popular, se utilizado em conformidade com os requisitos políticos acima discriminados, deve continuar a ser empregado para os temas de maior consenso de opinião pública e que dificilmente terão condições de se transformarem em lei, se deixados à exclusiva iniciativa de deputados e senadores.
A Lei da Ficha Limpa demonstra que pode ser aprovado pelas Câmaras um projeto, mesmo contra a vontade das bancadas, desde que a opinião pública torne inequívoco o respectivo respaldo, assim como o desgaste na eventual recusa seja potencialmente demasiado, a ponto de levar Suas Excelências a votarem com patética unanimidade o que jamais sufragariam se consultado o respectivo interesse.
Corolário da assertiva acima, outra falácia que a promulgação da Lei da Ficha Limpa dissipou foi a tentativa de desmerecer da força da opinião pública, que se buscara escarnecer na expressão opinião publicada. Na sua especiosa restrição é uma corrente auxiliar de os que dizem lixar-se para a dita opinião pública.
Com a sábia aprovação pelo Tribunal Superior Eleitoral da imediata vigência da lei, assim como a correta interpretação de sua abrangência, os objetivos da Lei principiam a ser preenchidos, escoimando das listas eleitorais aqueles candidatos com a ficha suja. É importante evitar que firulas jurídicas – consubstanciadas em eventuais liminares – venham a dar sobrevida legislativa para a triste fauna que há de constranger as convenções partidárias, para lograr obter o ambicionado ingresso aos comícios de três de outubro.
Para tanto, o instituto legal carecerá sempre da ajuda dos veículos de opinião, a fim de alertar a sociedade e os juízes competentes, das tentativas de concorrer às eleições por aqueles elementos que intentam eludir a proibição que sobre eles recai. Mal sabem eles que a Lei da Ficha Limpa é a nova face de um antigo flagelo para os inimigos do Estado – o Ostracismo da democracia ateniense.
terça-feira, 29 de junho de 2010
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