quarta-feira, 15 de julho de 2020

Os riscos do interinato


                    
        É difícil recorrer a sistemas de caráter provisório para resolver problemas de natureza permanente. O Governo Bolsonaro é um exemplo dessa alegada resposta que costuma correr para o guarda-roupa, sempre que algum problema mais sério se configure no horizonte.
           O presidente, fraco politicamente, pensou encontrar  solução para os desafios que lhe surgissem nas curvas do caminho através do recurso sistemático a  instituição de índole perene, no caso as Forças Armadas.

           A história do Brasil mostra que não temos uma tradição democrática de longo fôlego. Para dar um mero exemplo, no século XIX, o nosso velho Imperador, ao cabo de longo reino, foi contraditoriamente derrubado por um cuartelazo, encabeçado por marechal que para tanto cavalgara sob a ordem perfilada e unida de um batalhão, em evento programado para decretar a queda da monarquia, a ponto de haver suscitado lúcidos juízos que bastara um pronunciamiento para derribar a solitária república de Latino America.

                A provocação de um Ministro do Supremo Tribunal Federal foi bater à porta do recurso habitual de um presidente politicamente fraco, que cuidara de vestir com militares o próprio governo. Sabemos os brasileiros, por problemas passados, que é expediente de vida potencialmente curta vestir os respectivos postos ministeriais com chamadas demasiado intensas a integrantes das Forças Armadas. Tampouco é segredo de Polichinelo que esteja atualmente no Alvorada um presidente politicamente fraco 

                 Temos agora o problema colocado pelo Ministério da Saúde. O presidente Jair Bolsonaro pensa resolver a sua fraqueza política com saques repetidos do celeiro das Forças Armadas. Com a saída do ministro Mandetta - que fora exonerado da Saúde sob falsos pressupostos  - foi chamado como sucessor o Ministro Teich, de resto  tampouco foi exitoso, e a cuja saída se seguiu o procedimento de recorrer às Forças Armadas, que é a saída preferida pelo presidente Bolsonaro. A "solução" provisória - chamar um general como interino para  Pasta importante, que tem pela frente a solução de  problema complexo, de natureza médica - não pode ser, portanto,  considerada como permanente.
                  Daí, a crítica feita pelo Ministro Gilmar Mendes, que terá carregado nas tintas como se fora genocídio a não-solução do problema de parte do presidente Bolsonaro. O caso de saúde é típico daquele erro inicial - exonerar Mandetta por ter uma visão demasiado pró-ativa da missão daquela Pasta. Para muitos, tal seria uma qualidade, mas para o inseguro presidente, tal constitui um defeito, que implicaria em recurso às Forças Armadas.
                  Não estamos em regime militar, mas ao servir-se de modo intenso dos aportes do Exército, o presidente Jair Bolsonaro atua como alguém que bata à porta das Forças Armadas quando confrontado com os mais diversos desafios. Com isso, Sua Excelência traz para o seio do governo uma mentalidade verde-oliva, com a tendência (um verdadeiro auto-reflexo) de interpretar como injúrias à instituição-mor quaisquer intentos que sejam passíveis debaixo desta lupa de serem configurados como tal às próprias Forças Armadas, quando, na verdade, tais críticas são apenas dirigidas a eventuais integrantes do gabinete de Bolsonaro, e não a reificações deste ou daquele problema determinado.
                     Dessarte, trazer as Forças Armadas como se fossem reificação de exposição a um problema, não passa de estratagema de oficiais-militares, colocados em altos postos de governo civil, que vêem ofensas e contumélias que atingem à instituição, e portanto implicam na solução mágica de atalhar um suposto desafio, ao trazê-lo para o seio das Forças Armadas, e dessarte, ao pôr abstrações em risco, os eventuais ameaçados estão, na verdade, a valer-se de arma institucional que generaliza a ofensa em apreço.  Em outras palavras, seria uma espécie de shazam, que reduz a cinzas aquelas intervenções havidas como ataques, como no exemplo em tela.  
                   
 ( Fontes: Folha de S. Paulo,  O  Globo )                     

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