Peço perdão ao leitor por eventuais liberdades com o
tempo. Adolpho nunca foi alguém que procurasse ater-se a parâmetros inflexíveis
de conduta. É claro que em momentos importantes ele cuidava que uma determinada
ordem fosse obedecida.
Contudo, em geral, procurava ser
natural, e nesse sentido tratava a todos com simplicidade. Mas se, por acaso,
julgasse que lhe faltavam ao respeito, ou que estavam perdendo tempo com
besteiras, Adolpho poderia atalhar a questão e cuidar de pôr as coisas em
ordem.
Evidenciava, também, uma pertinácia
que me surpreendia. Não perdia tempo com tolices ou ninharias. Se porventura
acreditasse que achar o endereço de alguém - fosse fonte jornalística, pessoa
importante para dirimir certa questão, ou mesmo artesão conhecido - não era
coisa de somenos importância, o tio não hesitava.
Punha-se efetivamente em campo, como
pude verificar numa manhã de Teresópolis, quando por acaso eu o acompanhava.
Fiquei impressionado com a sua perseverança. Bateu em 'n' portas, em vários
pontos de bairros daquela cidade, e não seriam negativas - não, fulano não mora
aqui - que iriam desanimá-lo.
Com paciência e jeito, Adolpho ia
montando uma espécie de mapa falado do paradeiro daquela pessoa. Passamos
nisso, uns bons quartos de hora, e o que me parecera, a princípio, como
teimosia, se foi transformando para mim em
obstinada, persistente constância em
arrancar na medida do possível o paradeiro desse operário de quem o Tio julgava
importante o parecer quanto à possibilidade de determinado serviço.
Ao acompanhá-lo, o adolescente não
pôde reprimir um sentimento de admiração pela característica de não desistir
diante de dezenas de negativas. Se ele desse importância à solução do problema - mesmo que à primeira vista surgisse como
cousa de pouca monta - iria ser difícil afastar Adolpho daquela tarefa
determinada.
Como todo self-made man[1], Adolpho,
se julgasse que a busca valia a pena, ele não a terceirizaria, e enquanto a sua
intuição lhe soprasse que devia continuar, o meu tio não hesitava.
Quase escusado dizer que depois de
bater em tantas portas, acabasse por encontrar a quem procurava.
De tio Adolpho colhi, enquanto o
acompanhei de perto, muitas lições de vida e comportamento. Sem que a princípio
me desse conta, naquela manhã, ele, por intermédio de teimosia que, de início,
se me afigurou fora de propósito, me transmitiu para a vida lição simples, mas
de inegável utilidade prática: nada melhor para vencer em determinada tarefa do
que não desistir diante dos primeiros obstáculos.
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