A imprudência do Primeiro Ministro
David Cameron parece ter-lhe selado o
próprio destino político e, por infelicidade do antigo Reino Unido, também a
sua permanência na União Europeia.
Com o seu rictus característico - em momentos de tensão - com o lábio
superior comprimido pelo inferior, diante do púlpito montado junto à simbólica
porta do 10, Downing Street, Cameron já anunciou a próxima renúncia, golpeado
por crise de que foi o principal criador.
Com grande leviandade, Cameron para
contornar uma crise menor, anunciara a convocação de referendo sobre a
permanência ou não na U.E. Essa falta de prudência, conjugada com má avaliação dos riscos envolvidos, seriam a
perda de David Cameron.
Tampouco foi pequena a diferença entre
o Brexit (apontando a saída da U.E.)
e o Remain (a permanência). Além de ser
marcada pela estúpida imolação de ainda jovem deputada trabalhista, Jo Cox, as
consequências da dilaceração de união de 43 anos se apresentam a desencadear-se
sobre a incapacidade política de Cameron, que já é reflexo da decadência como
poder político e econômico do Reino Unido, condição que reponta desde o fim da
Segunda Guerra Mundial.
O insularismo inglês, e a sua condição
de Grande Potência, desapareceu no século XX, como decorrência das duas Grandes
Guerras no Continente europeu, que projetaria, após 1945, um mundo com duas
superpotências, i.e., os Estados Unidos e a União Soviética. As antigas
européias, a França e a Inglaterra receberam prêmios de consolação, com
afirmação de potência que não mais correspondia à realidade. Por sua vez, a
inclusão da China representou, por um tempo, uma sinalização de potência
futura.
O século XXI nos mostra a Rússia em
processo de recuperação, embora a sua potencialidade por ora esteja mais na
audácia de Putin, do que na realidade fática. A União Européia continua um fato econômico, sob a liderança de Alemanha parcialmente recuperada da
insânia hitlerista.
A miopia de David Cameron ainda não produziu
todos os efeitos negativos que a estúpida decisão de brincar uma vez mais com o
referendo torna possível (Tony Blair convocara outro similar, em 2006, em que
logrou vencer, mantendo a permanência do Reino Unido na União Européia). Como a
Escócia - que recentemente tentou a via independentista - sufragou no referendo
de ontem a permanência na U.E., semelha muito provável que o velho reino de
Maria Stuart tente uma vez mais sua separação da Inglaterra. Também na Irlanda
do Norte, prevaleceu o sufrágio em favor da permanência na organização de
Bruxelas.
Cameron já é um morto-vivo
político, eis que o seu sucessor - que semelha ser Boris Johnson - está com
a própria candidatura nas ruas.
Não surpreende que os movimentos
de extrema-direita - como o de Marine Le Pen, na França - já se assanhem com a
perspectiva de projetos análogos, posto que semelhe difícil que os povos
europeus como o francês se entusiasmem com tais anacronismos.
Quanto ao redimensionamento do
Reino Unido - com a ulterior ameaça das defecções escocesa e da Irlanda do
Norte - a precipitação cambial da libra esterlina diz bastante do nervosismo do
mercado quanto às novas perspectivas que a falta de visão política (para não
dizer sólida mediocridade) de David
Cameron tornou, de súbito, uma triste e,
na aparência, irremediável consequência.
( Fontes: The New York Times,
O Globo, Lev Trotsky )
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