Por vezes, eu encontrava Adolpho na praia, se me
levantasse mais cedo. Ele nunca foi
grande madrugador, pois apreciava a vida noturna. Nos tempos áureos da boîte
Vogue, ele a frequentara com grande assiduidade, a ponto que um jornalista que
não morria de amores por ele o cognominasse de Adolpho Vogue.
Naquele tempo - anos cinquenta - essa
boîte era um fanal na noite carioca. Na minha primeira adolescência, meus tios
ainda viviam na Antônio Vieira, 5, no Leme. Nessa época, nessa rua e na Gustavo
Sampaio, havia locais bastante movimentados, e a alta boemia lá comparecia.
Houve então o incêndio do hotel Vogue
- que abrigava também a boîte - e a tragédia que o cercou, inclusive com a
morte de hóspede, se não me engano, americano, que pelas deficiências dos
bombeiros de então, não pôde ser salvo - o seu quarto estava no terraço do
prédio - e, por isso, não mais suportando o calor das chamas, ele, com bastante
vagar, se foi acercando da mureta, a
despeito dos gritos da gente que presencia a progressão do incêndio. Para tal
público que acorre a esses espetáculos, muitos guardaram a impressão de que o
estrangeiro preferira deslizar lentamente para o abismo, do que ser queimado
vivo.
Um pouco mais tarde, o casal Bloch
trocaria o Leme pelo edifício Chopin, sexto andar. Naquela época, era um dos
melhores endereços do Rio, junto da piscina do Hotel Copacabana Palace, e da
sua pérgula. Várias vezes, acompanharia minha tia em suas visitas de inspeção
às obras de construção do prédio e do apartamento, que tinham escolhido. Com seu dom de decoração, Lucy dividiu à
própria feição o amplo apartamento, onde o casal iria morar por um bom tempo.
Na praia, quando o avistava, tratava de cumprimentá-lo, e nós dois
caminhávamos pelas areias, àquela hora, em geral desertas, ou com pouquíssimos
banhistas.
Perguntava-me dos respectivos
projetos, e quando lhe dizia que estava
escrevendo um livro, ele costumava encorajar-me, inclusive prometendo
publicá-lo quando estivesse pronto.
A princípio acreditei nas promessas,
mas mesmo com a editora já montada, de alguma forma ele se esquecia. Como nunca
tive o vezo de pedinchar, guardava para mim a circunstância de que a obra
estivesse pronta ou não.
De toda forma, quando publiquei
afinal um romance - apesar da
advertência de Castelinho de que não escolhesse aquele editor - foi minha Tia Lucy quem compareceu à noite de
autógrafos em Brasília, a que, para minha surpresa, muita gente amiga acorreu.
( Fonte: Carlos
Castelo Branco (1920-1993), escritor e colunista político do Jornal do
Brasil - Coluna do Castelo)
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