Ainda nos primeiros tempos no Russell, antes do
surgimento da Tevê Manchete, já havia na parte traseira do edifício-sede de
Bloch Editores - que dava para cenário ao fundo onde existiam velhos sobrados coloniais, maltratados pelo tempo e encarapitados nas colinas, e por trás da
Igrejinha da Glória, - uma área coberta e outra ao ar livre, com piso branco de
granito.
Ladeava e compunha esse espaço assim vestido,
e que traía no traço simples o gênio inconfundível de Oscar Niemeyer, um alvo,
magnífico salão natural, que, saído das entranhas do edifício, tinha ao fundo a
área construída onde se aninhavam as dependências de apoio de copa e cozinha.
Dessarte, aquelas construções singelas
em aparência, como que lançavam os visitantes para composição que encantava à
primeira vista, eis que o convidado se perguntaria se não estava em magnífico
salão, com o céu azul do meio-dia ao alto, com as mesas distribuídas pelo
branco assoalho do piso granítico, a que
ladeava espelho d'água, e ao fundo, como se fora cenário, repontavam velhos
casarões que formavam, por assim dizer, o entorno da construção em que se
entrelaçavam o sol do meridião, o horizonte do Rio antigo, o azul do teto
celeste, e o branco agressivo, daquele ambiente em que o gênio de Niemeyer
reponta na parte e no todo, em jóia arquitetônica que, de repente, para alegria
de quem ama o belo, se descerra aos olhos do visitante.
Ao invés dos refeitórios da imprensa,
em geral metidos em áreas confinadas, que careciam de ar condicionado, Adolpho Bloch, como se estivesse realizando
o gesto mais simples, a exemplo de o que fazia no antigo edifício da Frei
Caneca, ali naquele espaço da antiga praia do Russell, à beira da baía de
Guanabara plantado, seria sempre o anfitrião bem-humorado e, em geral,
sorridente, convidando a todos, com os seus expletivos e o sorriso franco, para
que fruíssem de o que se preparara para aquele almoço.
Como capitão de empresas, o jeitão
natural punha todos à vontade. Tinha decerto os seus preferidos, como Cony,
Murilo Melo Filho, Justino Martins e um que outro tipo estranho, que gozaria de sua
predileção por tempo determinado. No que me concerne, sempre me recebeu com a naturalidade de sempre, a
mim que lá aparecia mais para o fim do
mês, ou quando o Ministro de Estado estivesse fora.
Adolpho gostava de carnes, como veria nas suas preferências em
restaurantes parisienses - mas isso é outra estória. Nesta me ocupo de um
senhor grande anfitrião.
Era um prazer privar-lhe da
companhia, e da ocasional piada ou da última de fulano ou sicrano.
Todas as novidades ele dizia com um
piscar maroto nos olhos brilhantes, muita vez repetindo para que confirmasses a
tua concordância com a sua interpretação.
E então dizia : "Não é verdade, isto ?"
Pedia apenas concordância, e o fazia
naturalmente, sem querer impor nada. Eu só achava estranha a construção e me
perguntava de onde tirava aquela peculiar composição verbal.
Só muito mais tarde que me daria
conta de que a pequena frase vinha direto do russo, que o menino emigrante de
treze anos trouxera com ele, junto com algumas poucas peculiaridades de
expressão que haviam sobrevivido à dura travessia.
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