quarta-feira, 14 de junho de 2017

Incêndio em Londres

                                

        A foto mostra o que os anglo-saxônicos chamam de high rise, um aparente pleonasmo (alta elevação), termos que empregam  para designar o que antes se designava de arranha-céu (sky scraper).
        Mas é claro que a foto mostra muito mais, e aí está o que impressiona. Um prédio de vinte e quatro andares inteiramente tomado pelo fogo. Diz a legenda que o edifício foi renovado recentemente, e que todas as precauções modernas foram tomadas, inclusive com material especial  anti-incêndio. Não obstante, doze pessoas morreram e setenta se feriram.
         Está (ou estava) situado na Londres Oeste, que parece ser  uma área elegante daquela cidade, por que passei naquelas rápidas estadas que costumam oferecer-te duas impressões: que viste a metrópole mas na verdade não a guardaste na memória, como outras em que viveste.
          A mania do high rise - o que para mim é um quase pleonasmo - se apossou não só da capital britânica, mas também de Manhattan, com verdadeiras agulhas, em que os arquitetos parecem desejar transformar os milionários que lá demoram literalmente em nefelibatas.  Se na antiga Hellas isso seria apenas uma expressão (caminhantes sobre nuvens), já na grande metrópole da costa leste dos Estados Unidos são verdadeiras agulhas de concreto que arranham as nuvens, ou as usam como écharpe, dando aos seus moradores, quem sabe, a ilusão de passear num ambiente que costuma também ser apresentado nos filmes como os domínios de um outro além, não sombrio e subterrâneo como o Hades dos helenos da Ilíada.
          É verdade que o modismo dessas agulhas pós-modernas também o associamos aos espaços arenosos da península arábica, com essas torres modernas que parecem querer fugir dos monótonos areais que as circundam.
         São também altíssimas e ao vê-las me assalta o alívio de nunca ter fruído da oportunidade de nelas quedar-me, inda que fosse por poucos dias.
          Apesar de não sofrer de acrofobia, sempre tive dupla impressão ao depará-las: da solidão extrema do concreto-armado ou lá o que for com que sejam construídas, além da angústia de não poder nunca dizer: querida, vou dar um pulinho no bar da esquina, talvez como aquele malandro carioca que disse à paciente esposa: querida, vou dar um pulo lá embaixo, pra comprar maço de cigarros.
         E não é que à noite, lhe telefona de São Paulo (descera de pijamas), para tranquilizar a cara-metade, prometendo: logo, logo estou de volta, meu amor.
 

( Fontes: The New York Times; e de outras estórias ) 

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