domingo, 25 de junho de 2017

A delação de mão beijada

                                            

         Creio importante a pesquisa do Datafolha sobre a delação dos irmãos Joesley e Wesley Batista. Não é, decerto,  um bom exemplo que os donos da JBS tenham escapado da cadeia. E o Povo brasileiro não engoliu as desculpas: para 81% dos entrevistados, Joesley deveria ter sido preso (assim como o irmão).
         Tampouco caiu bem que a multa (pagamento de R$ 110 milhões para cada um dos irmãos) substituísse a prisão (que tem sido aplicada até hoje para todos os delatores premiados).
         Assim, sem denúncia formal, os delatores não correm risco de serem submetidos a medidas impostas a outros delatores da Lava Jato, como, v.g., ir para a prisão ou serem forçados a usar tornozeleira eletrônica.
         E as gentilezas não param por aí:  aos irmãos Batista foi permitido que viajassem aos Estados Unidos e pudessem manter o controle das empresas do grupo. Omito outros detalhes próprios de grão-duques russos, quando viajavam para fora dos limites do czar.
          Além disso - e já no regime da pára-legalidade - uma operação cambial bem-sucedida da empresa na seqüência da revelação dos áudios do Jaburu despertou ulteriores acerbas críticas.
          Grave é também julgado pelo colunista Demétrio Magnoli o referendo pelo Supremo do acordo de delação que o atual encarregado da Lava Jato, o ministro Edson Fachin, homologou, apesar das flagrantes ilegalidades de que Joesley antes de delatar oficialmente tenha sido instruído por um procurador e um delegado da Polícia Federal.
           Para o crítico Demétrio Magnoli prevaleceu o esprit de corps, eis que os ministros do Supremo (sete deles) resolveram não desautorizar o Ministro Fachin, assim como antes não desautorizaram a Lewandowski, que jogou a Constituição pela janela ao concordar com o truque do "fatiamento" para preservar os direitos políticos de Dilma.
             Magnoli aponta outras desenvolturas do Supremo. Com efeito, os ministros do Supremo parecem esquecidos que a Constituição de 1988 não admite a cassação judicial de mandatos parlamentares: só os eleitos podem cassar os eleitos. No caso de Eduardo Cunha, o princípio da independência e da harmonia entre si  dos três Poderes da União é validado pelo artigo 2º.
              Já é difícil de aceitar um processo inconstitucional como a "excepcionalidade" invocada por Teori Zavaschi, com as consequências que possa ter no futuro se admitida a supremacia do poder judicial. Nesse contexto, o Ministro Fachin acolhe recomendação do Procurador Geral da República, para determinar a suspensão do mandato de Aécio.
               Se se começar a mexer em cláusulas pétreas da Constituição, a pretexto de emergências, quem poderá negar o cenário dantesco em que "a exceção se converterá em norma, destruindo a independência dos Poderes"?
               O Brasil vive um momento difícil em que a anomia (falta de regras) ameaça o equilíbrio dos poderes. A citação do fatiamento da Constituição com a preservação dos "direitos políticos" da ex-Presidente Dilma Rousseff já mostrara o perigo do desrespeito à Constituição - que passara em brancas nuvens.
                Passou por aqui não faz muito Mads Jon Damgaard Andersen, cientista social e especialista dinamarquês no combate à corrupção. Ao partir, disse ele que "em dez anos, talvez a ideia de jeitinho mude". Não será acaso pouco tempo?




( Fontes:  Folha de S. Paulo, O Globo )   

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