segunda-feira, 23 de maio de 2016

Problemas de Hillary

                                        


          Hillary Clinton  pode ver na gangorra um símbolo de sua campanha. Há poucas dúvidas de que o inefável Bernie Sanders represente o papel do principal suspeito nessas oscilações malucas que tem constituído a sina de Hillary nessa estranhíssima campanha primária para a eleição do Presidente dos Estados Unidos ao mandato de 2017-2021.
          Mas esse processo de wear and tear[i] - na prática, o que sofrem as perspectivas de sua pré-candidatura pela contínua oscilação nas votações das primárias - reflete, em verdade, a caprichosa disposição do eleitorado democrata diante de dois personagens diversos.
          Com efeito - e os resultados estão aí para justificar as supostas surpresas - o challenger (e nunca  adversário algum terá sido tão desafiador e surpreendente do que o peculiar velhinho Sanders) -  se Hillary tem mantido a liderança (e provavelmente, por mais surpresas com que tenha ainda de lidar, a sua vantagem persistirá até a Convenção de Filadelfia) essa campanha parece ser dirigida por um sádico diretor, que se compraz em alternar as perspectivas, seja de modo direto (ora criando dúvidas imediatas sobre a sorte da postulação de Hillary), seja de modo indireto (induzindo o adversário implacável a até acenar com o seu retiro, diante de imprevista reação de sua nêmesis).
           Excluída a magna prova da Califórnia - e mesmo assim é altamente dúbio que nesse estado Sanders logre vitória esmagadora - a campanha continuará numa guerra de atrito, em que a parte mais fraca - o independente do Vermont - colherá as vantagens que usualmente recáem sobre os desafiadores: aborrecer, importunar, até irritar, mas nunca abater a adversária. A única exceção a tal regra viria de erro improvável de Hillary - que é a óbvia meta de Bernie - e que não deverá ocorrer, porque a candidata terá o necessário discernimento de não dar um tiro no pé.
             Entre outras palavras, Hillary não pode perder o norte da própria candidatura. Em um exercício quase Zen, a candidata carece de prosseguir, mêmore sempre de que só ela, por desrazão ou extremo cansaço, pode dar tal contribuição às avessas, que é a razão precípua da persistência do seu adversário.
             Hillary não pode esquecer um momento sequer que o seu adversário nas primárias não tem condições materiais de destruir-lhe a candidatura (porque é disso que se trata). Somente de forma indireta, levando a que ela se dê um tiro no pé (v.g.,as célebres gafes de candidatos à presidência - e para simplificar dêem-se apenas as declarações dos Romney[1], para sepultar as respectivas candidaturas presidenciais), Bernie Sanders, o maverick (voluntarioso) do Vermont, que sequer democrata é, pode sonhar lograr o seu escopo.
                Os cometas no céu infinito faziam muita impressão na Antiguidade - havidos que eram como arautos de desgraças e calamidades - e a Humanidade na época, ainda presa às peias da ignorância e da superstição, surgia como o público ideal a um fenômeno que a pobre gente pensava lhe dissesse respeito.
                 Na verdade, a indiferença do fenômeno não poderia ser maior. O maligno cometa não podia ser objetivamente mais indiferente ao que se passasse no planeta Terra.
                 Também Sanders, a seu modo, é um cometa. Apesar de embevecer a muita gente, a distância entre os dois pré-candidatos democratas não pode ser afetada pelas emoções e ilusões que a sua passagem costuma provocar. E ao contrário da eternidade celeste, os tempos na presente campanha eleitoral tem datas firmes e locais bem sólidos e acessíveis.


( Fontes subsidiárias: The New York Times, O Estado de  S. Paulo, O Globo)


[1] O pai, mencionando a circunstância da lavagem cerebral (brainwashing), e o filho, declarando que quarenta e sete por cento dos eleitores democratas dependiam da munificência do Estado.



i. usar e rasgar

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