terça-feira, 27 de julho de 2010

Os Galeões da Metrópole

É notícia que se repete, a intervalos regulares, com preocupante insistência. Por uma série de fatores negativos, o balanço de pagamentos continua a piorar. De um lado, a balança comercial não tem fornecido saldos apreciáveis, de molde a equilibrar o balanço de contas correntes (as trocas de mercadorias mais turismo e movimentações de capital).
Por força da apreciação do real, a diferença entre exportações e importações de bens tende a diminuir. Em junho, a balança comercial apresentou saldo positivo de US$ 2,277 bilhões, o que é muito pouco - como se verá adiante - para contrabalançar o desequilíbrio nas contas de capital e no turismo.
No campo das viagens internacionais, houve um dispêndio de US$ 909 milhões. Esse aumento de despesas de brasileiros no exterior se explica pelo barateamento do dólar estadunidense e pelo aumento dos rendimentos da população.
Por sua vez, também há déficit no pagamento de juros, com menos US$ 728 milhões no mês de junho.
Como soi acontecer, o ítem mais negativo do balanço de contas correntes está nas remessas de lucros e dividendos. Com a crise internacional, as sucursais no Brasil das matrizes estrangeiras aumentaram exponencialmente as suas remessas. Para minorar as dificuldades das sedes, diante do desafio da crise financeira internacional, as filiais aqui estabelecidas remeteram em junho um total de US$ 4,156 bilhões.
Estas remessas não foram compensadas pelas contas de capital. Assim, o Investimento Estrangeiro Direto (IED) correspondeu a apenas US$ 708 milhões. Por sua vez, os recursos de portfólio (ações e títulos) montaram a US$ 3,339 bilhões.
No mês de junho, o IED montou à metade prevista pela autoridade financeira. Se a tendência ao déficit nas contas correntes for confirmada nos montantes projetados, outra consequência negativa será que o equilíbrio do balanço de pagamentos não mais dependerá somente dos investimentos estrangeiros diretos (IED), senão das inversões de capital em ações e títulos, que correspondem a recursos muito mais voláteis (e por conseguinte, menos confiáveis).
Se uma situação desfavorável nas contas externas de um país é uma janela que reflete a atuação de muitas causas perversas, uma delas será necessariamente agravada pelo modelo neoliberal que presidiu à instalação no Brasil das montadoras de carros.
Por uma conjunção de fatores em que a falta de previsão macroeconômica atingiu totais de difícil superação permitiu-se que o Brasil viesse a assumir, dentre as economias emergentes, a não invejável líderança em grau de desnacionalização nas indústrias montadoras de veículos.
Se o governo atual contribuíu para manter a produção dessas montadoras mesmo no período da crise – o que se explica para proteger o emprego - mediante a desoneração fiscal, o agradecimento das citadas montadoras estrangeiras pela progressão nas vendas se expressou no incremento das remessas para as matrizes estrangeiras, muitas delas às voltas com grandes dificuldades por causa da mesma crise.
No passado, os galeões de Espanha e Portugal transportavam para as metrópoles o ouro e a prata das suas colônias sul-americanas. Hoje em dia, a tecnologia simplificou tais transferências de recursos, que além disso ora tem a segurança acrescida pelas transmissões on-line.
Os eventuais corsários e piratas terão de valer-se de outros instrumentos para lograrem participação nessas transfusões de riqueza.

( Fonte: O Globo )

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