domingo, 4 de julho de 2010

Colcha de Retalhos XLIX

A Relevância das Pesquisas

Publicada na sexta-feira, dia 22, a pesquisa do Datafolha, em plena Copa do Mundo, e logo no dia do fatídico jogo contra a Holanda, não mereceu, a meu juízo, a análise e as inferências que o seu resultado deveria suscitar.
A anterior pesquisa do Ibope provocara verdadeiro terremoto na opinião de políticos e do público em geral. De um céu azul e sem nuvens, o Júpiter Ibope fulminara com seus raios a candidatura José Serra. Com efeito, ao cabo de longa liderança, ela repentinamente se descobria superada pela pupila do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Rios de tinta correram nos jornais, e muitos colunistas apontaram sobretudo os maus ventos trazidos pelos números na região Sudeste, onde se evaporava a pregressa vantagem de Serra sobre Dilma Rousseff.
Desse modo, os dados do Ibope, como uma grande nuvem negra, prenunciavam a mudança nas preferências, e a virada na tendência, para alguns considerada como inexorável, com a candidatura Serra ora ultrapassada pela de Dilma.
A esse propósito, a pesquisa do Datafolha, mantendo José Serra à frente, com 39% (no primeiro turno) e 47% (no segundo turno), mostra que, no final de contas, parafraseando Mark Twain, houvera, de parte do Ibope, muito exagero nos seus cálculos sobre a alegada derrocada da candidatura tucana.
Ao tomar ciência dos prognósticos de Datafolha, dois pensamentos me vieram à mente. O deputado Ciro Gomes, quando inviabilizada a sua candidatura à presidência pelo PSB, observara com sua característica franqueza que, no Brasil, somente eram confiáveis as pesquisas do Datafolha. Recordei-me, outrossim, de que em uma disputa antiga pelo governo de São Paulo, a candidatura de Marta Suplicy pelo PT sofrera um dano considerável ao ser mantida, em mais de uma pesquisa do Ibope, no patamar dos catorze por cento, contra o candidato Mario Covas.
Que os tais catorze por cento não refletiam a real força da candidatura petista se veria depois. Nesse ponto, no entanto, interveio fator que contribuiria para desestabilizar a candidatura de Marta, ao negar-lhe a possibilidade de um crescimento, que era detectado por outros meios.
Daí a importância da lisura na apuração das preferências eleitorais. Como se verifica, a influência de um instituto de pesquisa pode ir muito além de uma aferição acadêmica em determinada situação.
Por isso a correção de um instituto como o Datafolha é importante. Vindo depois dos surpreendentes dados do Ibope, contribuem para redimensionar as tendências apontadas pelo Ibope e congêneres.
A esse respeito, é ainda mais interessante a nova pesquisa do Ibope. Dez dias depois de atribuir a Dilma Rousseff cinco pontos de vantagem sobre José Serra, agora, e logo depois dos dados do Datafolha, divulga o empate entre os dois candidatos, em 39%.


Reflexões sobre a Copa do Mundo.

A iniciativa da Fifa de sediar uma copa do mundo na África é digna de louvor. A despeito do número de seleções africanas que participaram da primeira fase (África do Sul,Argélia, Camarões, Costa do Marfim, Gana e Nigéria), apenas uma passou para as oitavas de final. A seleção de Gana eliminou os Estados Unidos e alcançou as quartas de final.
Na partida com o Uruguai, duramente disputada, teve singular oportunidade de vencer, dispondo de um pênalti ao final da prorrogação. No entanto, seu cobrador oficial, Gyan Asamoah, desperdiçou esta chance única – que faria, de resto, justiça ao desempenho da seleção contra a Celeste.
Concluída a prorrogação, se passou à série dos pênaltis. Desta feita, talvez por partilhar com quatro outros companheiros o encargo de bater uma penalidade máxima, o jogador não teve dificuldade em marcar. Não foi bastante, tanto pela patética ineficiência do goleiro Kingson (que sistematicamente se projetava para um lado antes mesmo da batida do pênalti), quanto pela maneira apressada, quase displicente, com que dois outros batedores ganenses falharam na cobrança.
Menciono tais detalhes porque me parecem importantes para identificar traços mais gerais na atuação dos africanos. As seleções africanas continuam a revelar valores individuais, mas ainda evidenciam sérios defeitos no conjunto e na execução de táticas de jogo. Em uma de suas partidas, os zagueiros da África do Sul, cumprindo decerto instrução de Parreira, adiantaram a sua linha defensiva. O problema não esteve no recurso,mas na execução falha. Quando três jogadores avançaram, mas um não o fez, a jogada tática não só se inviabilizou, facilitando o gol adversário.
Como assinalei acima, semelha que pesou demasiado a responsabilidade de carregar Gana para a primeira semifinal jogada por seleção africana. Também espanta que não se dispense ao goleiro qualquer treinamento para a hipótese – bastante possível nos jogos de mata-mata – de que a decisão vá para os pênaltis. A presença de Kingson no arco de Gana no arco não contava para qualquer defesa, pela forma infantil com que atuava. Até um totó de Loco Abreu seria convertido, porque o goalkeeper se lançara para o outro lado...
Há, por último, um aspecto que não pode deixar de ser mencionado. Sem desmerecer do trabalho de Parreira, é preocupante como tendência que o técnico das seleções africanas (com exceção da Argélia, que não faz parte da África Negra) seja sempre um estrangeiro. Além de dificultar o contato do técnico com a equipe durante a partida, esse traço pode ser considerado como resquício de uma certa deferência com ranço colonialista. A África crescerá ainda mais como presença nos mundiais do futuro se as suas seleções superarem essa fase de relativa ‘tutela’ estrangeira.

A ‘ Derrocada’ da Argentina

Existe uma certa artificialidade nas apreciações dos jogos da Copa do Mundo. Nunca a deformação de tal análise se mostra tão marcada quanto no que concerne ao jogo de ontem entre a Alemanha e a Argentina.
Maradona suportou com estóica dignidade o infortúnio da sorte. A propósito, e seja dito en passant, que diferença dos esbravejamentos e dos golpes contra os objetos inanimados à sua volta dados pelo inconformado Dunga ! Como este diretor técnico, exibindo tal descontrole, poderia esperar outra coisa de seus jogadores ?
Se em futebol é difícil brigar com a realidade de um resultado, como o de quatro a zero, peço licença para discordar dessa frieza burra dos números.
Todos sabíamos que Maradona dispunha de Messi, um grande craque – o maior deste Mundial – de um bom ataque e de uma defesa fraca. Infelizmente, para o futebol sul-americano, os alemães do técnico Löw souberam inverter essa ordem dos fatores, criando um gol relâmpago de Müller, aos três minutos da partida.
Tal vantagem foi administrada pela esquadra alemã durante todo o jogo. Sem embargo, sobretudo durante o primeiro tempo, a Argentina teve superioridade territorial. Desafortunadamente, não pôde converter em gols esta maior presença em campo.
Por outro lado, a suposta ‘goleada’ da Alemanha corresponde ao seu esquema de jogo. Atua na defesa, e trata de controlar o predomínio adversário, na espera de oportunidade de contra-ataque.
Já no segundo tempo, obrigada a atacar, a Argentina abriu espaço para as incursões alemãs. Tal se viu ainda mais facilitado pela falta de atenção na marcação do volante Schweinsteiger, o principal armador das jogadas ofensivas do time alemão.
A severidade do score final não reflete o que foi a partida. Apenas um gol dos portenhos poderia ter desestabilizado a motoniveladora germânica. Se infelizmente isto não foi possível, tampouco para mim se afigura motivo para que desmereçamos a atuação dos comandados de Maradona.

( Fontes: O Globo e Folha de S. Paulo )

2 comentários:

lila disse...

Torço pelos negros, torço pelo levante da África como um todo. Como eu desejava, tal como transcorreu no filme "invictus" que algum time africano chegasse à final. Mas isto é um sonho. A realidade- técnicos brancos, jogadores negros - não é um resquício de ranço colonialista mas a não superação do domínio e tutela dos brancos.

Mauro M. de Azeredo disse...

A comentarista confunde causas com efeitos. Na verdade, a presença de técnicos europeus à frente de seleções africanas é sim resquício colonialista, eis que somente é aplicável pela não superação de uma mentalidade que reserva determinadas tarefas aos brancos. Ao descrever a realidade presente a comentarista apenas reconhece a validade da tese exposta, eis que a tutela remanescente é a causa eficiente da sobrevalorização do aporte de técnicos estrangeiros.