Anomia é palavra de origem helênica
(grego antigo) e quer dizer falta de ordem, assim como o que resulta de tal
situação.
Pela leitura dos jornais, esses arautos
de boas e más notícias, saberemos que, socialmente falando, as coisas não
andam bem em Pindorama.
Pois, assim, como são sociais os
problemas do homem - e como estão as coisas no Brasil, chegou o momento de
gritar, seja por cima de telhados, seja em megafones, seja através da internet, que por aqui elas não andam nada
bem - é necessário parar um momento, olhar à volta, tentar ver o que surge no
horizonte de ameaçador, e modesta, porém seriamente, tratar de avisar dos perigos
que se acham na sociedade brasileira.
Primeiro, o arquipélago dos gulags no Brasil, isto é, a constelação
de todos os presídios, penitenciárias, cadeias e tudo o mais que possa ser
comparado à baixa constelação que motivou no século passado a Aleksandr Soljenitsyn a escrever sobre o
Arquipélago dos Gulags, na então União
Soviética, e no século XVIII, ao Marquês de Beccaria, Cesare Bonesana
(1738-1794), que inspirado pelo iluminismo (Jean-Jacques Rousseau, Montesquieu,
Diderot, e Buffon) publicou em Milão, após compreensível hesitação, a obra
prima Dos Delitos e das Penas.
Apesar de lançada em Milão, em 1764, não
poucas dúvidas teve o Marquês de Beccaria, diante da previsivel reação das
forças da reação e da supressão, a que desagrada sobremaneira que os problemas
sociais sejam tratados de forma aberta, clara e chegando às causas da referida
situação.
Os temores de Beccaria foram comprovados
diante da reação da direita conservadora, a que desagrada sobremaneira que além
dos problemas, as respectivas causas e suas agravantes sejam debatidos de forma
ostensiva.
Não tivesse Beccaria a proteção
necessária, o seu provável destino teria sido as mesmas prisões que expunha e
para que apontava correções humanas e, portanto, eficazes. De qualquer forma, o
legado do Marquês de Beccaria, dentro do fenômeno do Iluminismo, se
restringiria basicamente à essa obra imortal, a que a ameaçada perseguição da
direita ultra-conservadora evitaria qualquer seguimento.
O que é anomia? É a palavra grega para nos inteirar de outra
triste verdade, que é a ausência de leis e de regras pertinentes para enfrentar
e situar os problemas, de forma a que a sociedade os contenha e, eventualmente,
os corrija.
Não estamos no século XVIII - que pelas
suas condições de brutal anomia daria origem à reação do Iluminismo (que traria o século das luzes para a Humanidade) - mas
no Brasil quem negaria que um conjunto de forças como a corrupção, o desleixo e
a incapacidade das elites tem sido a parteira de série de fenômenos que parecem
parentes da brutal repressão do século XVIII ?
No entanto, vivemos sob o
constitucionalismo, a dita liberalidade no governo, a teoria de que a Lei é
igual para todos, e se olharmos à volta - empurrados por certo empirismo, que
nos leva a querer confirmar o que nos diz a elite dominante, a legislação e os
seus representantes - ficaremos surpresos pelos inúmeros exemplos que negam,
grosseira, frontal e acintosamente, o que está escrito na Constituição vigente,
nos Códigos de Justiça, até nas palavras dos leguleios.
Não podemos mais empurrar para baixo de
tapete imaginário e inexistente o escândalo dos presídios, os monstros que aí
se criam, o que aproxima as prisões de hoje dos calabouços do século XVIII, com
as mesmas condições de barbárie e de rasgada contradição a tudo que se escreve
nos manuais dos jurisconsultos e nos regulamentos desses presídios.
Reportei-me não faz muito às palavras
do Ministro da Justiça de Dilma Rousseff[1] - que, de resto, se
empenhou, e não pouco, na defesa de sua Presidenta,
a própria submetida a processo de impeachment.
Pois antes Sua Excelência Cardozo declarara que preferia morrer a ser encerrado
nas prisões brasileiras, prisões essas - acrescento eu - que estavam sob a
proteção e as normas ditadas pelo Ministério da Justiça, o qual, seja dito de paso
era da competência do dito senhor José Eduardo Cardozo !
( a continuar)
[1] Apesar
de Sua Excelência ter tido mais de um Ministro da Justiça, pelo tempo e a
dedicação evidenciados para com ela, José Eduardo Cardozo pode ser havido como o Ministro da Justiça de Dilma Rousseff.
Pois ele não hesitou em afirmar essa contradição institucional ínsita em suas
palavras!
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