Mesmo para morador do
Rio de Janeiro, que sou, me ajuda de certo modo a empatizar com o desafio
climático, que a cada ano se acentua sempre mais.
O Rio, a chamada Cidade Maravilhosa, nunca foi um paraíso no verão, como os
habitantes dessa megalópole hão de prontamente convir. A sensação do calor
deixa de ser questão subjetiva, para tornar-se um problema comum, sentido por
milhões de habitantes, demorem eles seja em Bangu (um dos seus locais
tradicionalmente mais quentes), seja em bairros a beira-mar, como Ipanema,
Leblon e Copacabana.
No entanto, depois que para mim
cessaram, por força da aposentadoria, as
mudanças regulares que caracterizam a carreira que abraçara, tenho verificado
que o passar dos anos deixou de ser monótono para os que acaso demorem no mesmo
lugar - e não disponham de residências de vilegiatura.
Com efeito, a cada verão se acentua o
característico desconforto típico da sazão para o Rio de Janeiro. Lembro-me,
por exemplo, do longínquo tempo em que cursava o ginásio no Colégio
Anglo-Americano, na praia de Botafogo.
A canícula estival nos perseguia
naqueles anos desprovidos das amenidades do ar condicionado. Mas havia no clima
da Cidade Maravilhosa uma característica marcante, e que hoje não mais existe.
Naquele tempo, em plagas cariocas havia estações bem marcadas. Recordo-me - e
releve-me o leitor se porventura já leu essa observação em alguma outra página de minhas modestas
memórias. Mas o fato é que havia inverno na Cidade Maravilhosa e era para
valer.
Nas festas invernais juvenis a que me
convidavam, nesse bairro de Botáfogo, se realizavam-se de noite, em ambiente
aberto, o pulover era obrigatório.
Chegava mesmo a pôr um suéter de col-roulé,
de caxemira, para não sentir frio nas noites de julho... Ora, o leitor bem mais
jovem há de sorrir e até descrer dessa observação. E, no entanto, mesmo neste
Rio de Janeiro que podia dar inspiração a filmes tipo Rio 40 graus, a dança das
estações, que hoje só se observa em climas temperados, era um fato.
E seja dito de paso, que as mutações sazonais são boas tanto para a natureza,
quanto para o bicho homem.
Se hoje as estações passaram a serem
pouco mais do que variações no calor ambiente - com raríssimas ondas frias -
cresce a impressão entre as pessoas de boa vontade - pois, também, as há de
má-vontade, como pretendo oportunamente referir - que esse fator climático,
pela irresponsabilidade do homem, está obviamente saindo do controle humano,
como a curva da ascensão da temperatura o vem mostrando com monótona firmeza.
E para obviar as críticas dos
denegadores do fator climático - uma categoria que ainda persiste - acaso não
chegaram, em uma das decisões que mais militam contra o suposto bom-senso das
maiorias, a eleger um senhor que não só nega a ameaça do clima, mas também se
esmera em designar para os organismos fiscais do clima contumazes negacionistas
do desafio climático!
Pois o avanço da temperatura na
Terra atinge agora, como assinala o New York Times, um novo e inquietante
marco: nesta 4ª Feira, os cientistas assinalaram que a Terra atingiu a sua mais alta temperatura
gravada em 2016, com que quebrou o record
marcado em 2015, que por sua vez batera o récord assinalado em 2014...
Esta é a primeira vez na era
moderna do aquecimento global que as temperaturas ultrapassaram o record
anterior por três anos seguidos.
Tais revelações - como sublinha o
Times - nos chegam dois dias antes da tomada de posse do Presidente americano
que considera o aquecimento global um complô chinês. Como se tal asneira não
bastasse, este mesmo senhor promete fazer recuar os esforços de seu predecessor
em cortar as emissões de gases que retêm o calor.
Os dados disponíveis - e que se vão
acumulando a tal ponto, que mostram para pessoas de boa fé e aos próprios políticos que eles não mais
podem fazer com que o problema desapareça.
Como aponta o New York Times, em
2015 e 2016, o aquecimento planetário foi intensificado pelo modelo climático
conhecido como El Niño, no qual o Oceano Pacífico liberou
alta emissão de energia e de vapor da água na atmosfera. Mas o fator mais
importante em produzir records está
na tendência de longo prazo de alça nas
temperaturas, que segundo os cientistas está sendo determinada por níveis
crescentes de dióxido de carbono (gás
carbônico) e outros gases de estufa.
A onda de calor, portanto, nós a
sentimos no Rio de Janeiro, com a repetição de temperaturas cada vez mais altas
e mais incômodas para o comum dos mortais. No entanto, é no Ártico em que essa
elevação tem resultados cada vez mais sérios e, mesmo, dramáticos.
Não é por acaso que a ligação por
mar se tornou possível durante todo o ano, pela redução do gelo no Ártico de
modo mais dramático. No Atlântico Norte, os icebergs
se desprendem .Também o gelo está derretendo em proporções assustadoras, tanto
na costa, quanto derretendo a Groenlândia, quanto contribuindo para reduzir
gravemente o espaço do urso polar, que se torna existencialmente ameaçado. Além
disso, as focas - que constituem fator alimentar básico para o urso branco -
estão desaparecendo do ambiente polar, o que torna a situação do urso branco
bastante mais precária.
Mas como está tudo interligado, a elevação
do nível dos oceanos têm sérias consequências para os países já ameaçados, como
as ilhas do Índico e do Pacífico, e em seguida, nessa cadeia interconectada,
com o Atlântico, invadindo as costas (V. Países Baixos, por exemplo), e
afetando a muitos litorais, com a salinização de vastos territórios hoje
expostos, e que deverão ter boa parte de suas fontes hídricas prejudicadas.
( Fonte:
The New York Times )
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