quarta-feira, 20 de setembro de 2017

Ordem pública e confronto de bandidos

                        
        Já me havia surpreendido a postura apática do porta-voz da Polícia Militar (PM) na Rocinha. O surrealismo esteve muito presente nessa entrevista do major Ivan Blaz.  Questionado acerca da inação da PM - mesmo dispondo de informações dando conta da iminência da invasão da Rocinha por um grupo de traficantes  - o dito Major da PM declarou que a polícia não agiu com mais força (para acabar com o confronto) porque uma intervenção "poderia expor a população a risco ainda maior".
         De o que se tratou e que a PM ignorou foi a invasão na Rocinha de um bando de cerca 50 traficantes ligados a Antônio Francisco Bonfim Lopes, o "Nem", ex-chefe do tráfico de drogas na Rocinha, preso hoje na Penitenciária  Federal de Porto Velho. Esse bando - que seguira em direção à maior favela do país para retomar-lhe o controle da venda de drogas no local - que hoje está em mãos de  Rogério 157 (Rogério Avelino da Silva), que é o antigo lugar-tenente de Nem.
         A batalha a céu aberto - que deixou um morto e três feridos- causou pânico geral em moradores, pedestres e motoristas, que circulavam pela Gávea, e por São Conrado, bairros divididos pela Rocinha, durante mais de seis horas! Ruas e túneis foram fechados.
         A PM se omitiu completamente de seus deveres elementares. Para frisar a extensão da crise de autoridade no Rio de Janeiro, há uma anti-efeméride a assinalar esse "evento".  Diante de um poder que se omite, não surpreende que os bandidos tenham ignorado solenemente tanto a UPP, quanto a circunstância de que ela completava naquela data cinco anos de implantação (20 de setembro de 2012). Isso diz muito da completa desmoralização das UPPs como instrumentos de controle nas favelas. A ideia do ex-governador Sérgio Cabral, hoje trancafiado na cadeia, está morta, e tal não pode ser melhor símbolo do sistema inaugurado pelo Secretário Beltrame que já partiu faz muito, na mais clara admissão do fracasso do controle da bandidagem no Rio, iniciado com as fanfarras do morro do Alemão, mas pontuado de forma premonitória com o bando de cerca de trezentos meliantes que naquele dia de hasteamento de bandeira e de festejos mil  saiu do morro e fugiu pela estrada de terra rumo à cidade baixa, sem que lhe fosse oposta a menor ação seja de repressão, contenção ou detenção. Para bom entendedor aquela debandada geral do crime - em carros puxados a cavalos ou burros, e todo o tipo de movente que imaginar-se possa escrevia já u'a mensagem que a mor parte dos assistentes da liberação do Alemão não entendeu - já pressagiava o que viria a ocorrer, seja a reviravolta em favor do statu quo, vale dizer do crime, organizado ou não.
               Agora o Rio, sem verbas e o que é pior, com a sua principal corporação de combate ao crime acuada e desmoralizada - há uma obnóxia campanha dos criminosos para a eliminação física dos PMs, e o número de PMs mortos impressiona deveras. Estamos diante de macabra campanha física de eliminação dos PMs, e apesar de tudo, o número continua a crescer.  Com a partida de Beltrame, um honesto homem em uma administração em que paira ainda a sombra do mega-corrupto, já condenado pela Lava-Jato  a dezenas e dezenas de anos de prisão, que é o ex-governador Sérgio Cabral, e sob a insegura liderança do vice-governador Pezão,  a situação do Rio de Janeiro é precária em muitos campos, a ponto do roubo generalizado de cargas de caminhão, conivência de parte do comércio com esse novo "fornecedor", e as crescentes dúvidas e reticências da alternativa da presença militar.
                O Rio, a Cidade-Maravilhosa do passado, virou um enorme campo em que a carantonha do crime se mostra sanhuda e provocante, já que as UPPs que seriam os comandos avançados da lei nas favelas, se transformaram na prática como se fossem esqueletos de uma presença antes temida e organizadora do Estado, hoje sem verba para nada. A PM está retratada nas explicações dadas por seu porta-voz, na tentativa de explicar a vergonhosa omissão na defesa do cidadão e da gente do bem, forçada a refugiar-se como ratos sob a invasão da bandidagem, que age de acordo com a realidade do governo Pezão. Inação do Estado, abandono do cidadão, domínio do crime.
                   Trazer as gloriosas forças armadas para cá, segundo a bula do Ministro da Defesa, mas onde está o comando da autoridade civil ? Para resgatar uma pistola roubada, mega-operação é montada. Mas para impedir que dois bandos de traficantes, que não somam cem pessoas, nem PM, nem Exército estão disponíveis! Quantas milhares de pessoas eles ameaçaram com o seu tiroteio?  Que brutal desrespeito pelos direitos do cidadão, que obedece as leis e que ganha o sustento com o suor de seu rosto, e não com a venda de entorpecentes ?
               Será que ordem pública merece menos atenção que a posse de uma simples pistola?


( Fontes: O Estado de S. Paulo; Rede Globo )

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