terça-feira, 18 de outubro de 2016

Bons ventos para Hillary?

                              
       A três semanas da eleição presidencial, os cofres de campanha da candidata democrata Hillary Clinton colhem doações e contribuições que a deixam em condições de (a) cuidar de reforçar o próprio projeto de vencer no colégio eleitoral; (b) abrir perspectivas em cenários contestados, como Pennsylvania, Flórida e Carolina do Norte; e (c) avaliar cenários mais difíceis como Arizona, Georgia e Utah.

       A errática campanha do candidato republicano, Donald Trump, tem 'ajudado' o projeto da democrata não só em abrir bolsas anteriormente a ela fechadas, mas também em dar esperança de vitória a outros democratas.

        O estado de Arizona é disso um exemplo. Se é muito difícil derrotar a candidatura à reeleição do Senador John McCain (no Senado desde 1986), já a posição de Trump no Estado é frágil, não fora pelo grosseiro tratamento por ele dispensado a McCain.

         Por outro lado, há igualmente um entusiasta de Trump, o xerife Joe Arpaio, cujos comentários preconceituosos  acerca dos Hispânicos  e as agressivas táticas contra os imigrantes o fazem figura polêmica e não só na própria jurisdição, o condado de Maricopa. Arpaio, por isso, se torna alguém que pode ser derrubado no seu próprio terreiro, e além dele, dando u'a mãozinha aos democratas pela sua condição de elemento provocador de justa revolta no campo democrata e na faixa sensível à rejeição de tais elementos preconceituosos.

            Há outros Estados que já foram democratas no passado, e hoje pendem à direita, com os republicanos. Exemplo disto é o Texas - o vice de John Kennedy era Lyndon Johnson, um  político democrata daquele Estado.  O Texas deixou de ser democrata, quando o Sul se bandeou para GOP. Com o apoio do Partido Democrata à dessegregação e  à causa dos afro-americanos, o que fez com os estados do Deep South (o Sul profundo) aderissem ao Partido Republicano.

              Não há dúvida que um dos maiores 'partidários' de Hillary tem sido o candidato Donald Trump, através de seus comentários negativos, ataques à hierarquia republicana, e, em geral, ´por seu condão desagregador (a par da inconveniência dos comentários sexistas).

                Não é à toa que Trump aglutina apoios da direita preconceituosa, assim como coleta amizades dúbias, como a de Vladimir Putin. Por isso, o chamado flanco conservador que o apoiaria, não mais se sente em condições de fazê-lo e parte ou para o voto em branco, ou até mesmo, na teoria do mal menor, para a adversária Hillary Clinton.

                Se as previsões da política continuam a merecer guarida, tudo leva a crer que Hillary terá vitória folgada, juntamente com a possibilidade de recuperar a maioria no Senado. Quanto a milagres, eles são, por definição, pouco prováveis.

                É um escândalo  a permanência desde 2012 do gerrymander [1]na Câmara de Representantes. A sua existência dá vida a uma série de anomalias.  Ao fazer uma parte do Legislativo artificialmente (na verdade, penalmente) dependente do Partido Republicano, o governo da União Americana fica prejudicado, eis que se criam condições para a anormalidade (uma Câmara sempre republicana inviabiliza a regra básica do governo do Povo, para o Povo e pelo Povo, e foi o que se viu depois de 2012).  Tal condição anômala tem sido estigmatizada por parte da imprensa, a  exemplo da insigne politóloga Elizabeth Drew (V. artigo "A Democracia Americana Traída", em The New York Review of Books, 18 de agosto de 2016, no. 13).

                 E é por isso que a volta de Nancy Pelosi à curul presidencial da Câmara de Representantes se afigura atualmente uma impossibilidade prática, pela triste circunstância de que o extenso gerrymander torna isso virtualmente impossível.  É de perguntar-se por quanto tempo esse aborto constitucional será tolerado.  Uma vitória democrata em toda a linha - com a previsível exceção - tornaria possível pôr  termo a este aborto legislativo.

                 Hoje o desequilíbrio é tal, que não se poderia desconhecer a possibilidade teórica da vitória dos democratas também neste terreno minado, embora  isto seja muito pouco provável.


(Fontes: The New York Times, The New York Review of Books)



[1] Gerrymander - constitui o redesenho  pelo Legislativo Estadual do mapa dos distritos eleitorais em um determinado  Estado. Tal redesenho fraudulento costuma ser feito quando do recenseamento (um esquema decenal) e é realizado de forma a maximizar a representação de um partido e a minimizar a de outro. Assim, v.g., os distritos do partido A são desenhados de forma a garantir-lhe a vitória e devem ser mais numerosos do que os reservados ao partido B, em que a maioria do outro partido é 'desperdiçada' em grandes concentrações,  de forma a assegurar que a representação do partido A venha a produzir mais representantes do que os do partido B

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