domingo, 28 de junho de 2015

Volta ao dracma ?

                                              

        Não é de hoje que a crise grega se arrasta e - o que é pior – se vai tornando na aparência cada vez mais intratável.

        Os últimos desenvolvimentos não induzem decerto ao otimismo. Assim, os países da Zona do Euro rejeitaram a proposta do governo helênico de prorrogar a dívida que vence nesta terça-feira, com vistas à realização de referendo na República Helênica no vindouro dia cinco de julho, que é um domingo.

       O presidente do Eurogrupo, o holandês Jeroen Dijsselbloem, afirmou que o governo de Atenas “fechou as portas” ao propor o referendo.

       O raciocínio de Dijsselbloem se funda em que o gabinete Tsipras, ao inserir a variante da consulta popular, trazia para a questão um elemento imponderável, dada a complexidade da matéria, e a impossibilidade de uma opção objetiva, que realmente atentasse para todos os interesses em jogo.

       Talvez o grande problema nesse confronto esteja na postura radical do governo Tsipras, que julga possível valer-se de mecanismos financeiros, sem no entanto considerar a possibilidade de um esforço de composição, como foi realizado por outros países como a Irlanda, em similar situação precária aplicou os remédios sugeridos e conseguiu vencer a crise.

        A  proposta de votação popular – que introduziu o imponderável na negociação – que o Primeiro Ministro anunciou na noite desta sexta-feira, 26 de junho, e foi aprovada pelo Parlamento helênico, em sessão extraordinária – e põe extraordinária nisso – na madrugada do domingo corrente, 28 de junho.

        Qual é o principal desafio hodierno à Grécia ? Ela precisa evitar o calote de Euros 1,6 bilhão ao Fundo Monetário Internacional. Como não dispõe do caixa indispensável, quer desbloquear o acesso a Euros 7,2 bilhões, que é a última parcela do socorro de Euros 240 bilhões que vem recebendo do FMI e do Banco Central Europeu (BCE) a partir de 2010.

        Os credores exigem compromissos fiscais, cortes de gastos e reforma profunda na Previdência. Nesse contexto, o gabinete Tsipras fez proposta de ajuste de Euros sete bilhões e novecentos milhões. No entanto, os credores não aceitaram a proposta helênica.

         Em discurso no Parlamento, Alexis Tsipras, do Syriza (partido de esquerda, derivado do antigo Synapismo) resolveu esquecer os números, a dívida grega, e as medidas – enfrentadas e vencidas por outros países-membros em dificuldade financeira – de adequação à realidade (cortes nos gastos e reforma para valer na Previdência).

         Confrontado com a frieza dos números, resolveu partir para o emocional: “querem forçar a Grécia a aceitar um acordo ‘humilhante’”. E mais: “A Grécia não vai render-se. Não é uma decisão de romper com a Europa, mas querem que assinemos um acordo de recessão e morte lenta.”

         O ex-Primeiro Ministro Antonis Samaras, do Nova Democracia (centro-direita) declarou que o  referendo  (proposto pelo Gabinete Tsipras) é um “ suicídio”: os eleitores vão votar sem saber o que vai ocorrer se o resultado for contra um acordo com os credores.

         Entrementes, os ministros responsáveis pelas dezenove economias da Zona do Euro se reuniram em Bruxelas, no sábado 27 de junho,  para avaliar o pedido para prorrogar por um mês a dívida grega. Como não foi atendido, o Ministro grego Yanis Varoufakis abandonou a reunião.

        Nessa oportunidade, o holandês Dijsselbloem, declarou: “O referendo proposto foi um avanço negativo, e a Grécia rompeu as negociações com tal postura.” Segundo o chefe do Eurogrupo, não há garantias de que o governo vá implementar o acordo, mesmo na hipótese de que a população vote em favor desse acordo.

        Dando continuidade ao seu pessimismo, Dijsselbloem asseverou: “Acho que nós temos de nos dar conta de que a situação da Grécia vai piorar muito rapidamente.” E aditou: “ Não sei como o governo grego acha que vai sobreviver e lidar com tais problemas”.

        Se não adiar a dívida de alguma forma, a República Helênica parte para o calote e pode ficar sem ajuda externa, aumentando as possibilidades de ser forçada a abandonar a Zona do Euro.

         O primeiro e imediato problema a ser enfrentado será conter a insolvência dos bancos locais. A corrida bancária já é uma realidade de parte do povo grego, que deseja retirar do caixa bancário os próprios depósitos em euro. As previsíveis e intermináveis filas diante dos caixas eletrônicos no sábado 27 de junho é uma realidade que se depara  ante   todas as agência, e que torna a insolvência não mais uma probabilidade, mas uma certeza. Os saques, tangidos pela crise e pela inflexibilidade das Partes, superaram cinco bilhões de euros nas últimas duas semanas. Por isso, alguns bancos já impõem limites às retiradas.

           Eleito em janeiro sob a bandeira de oposição às medidas impostas pela Comissão Europeia, e portanto sob o vínculo de ser contra as medidas de austeridade, o grego Alexis Tsipras chega à hora da verdade: ou assente a um acordo que contradiz as suas propostas e o seu discurso da campanha, ou então, ao repisar o Não,  leva o país para uma direção que  o distancia cada vez mais da zona do euro.

           Tudo indica que o Primeiro Ministro acalente uma aposta de considerável risco político:  se a população optar, por meio do referendo,  pela negociação,Tsipras teria em tese de aceitar algo, segundo suas palavras, “humilhante” para a Grécia.

           Assinale-se, ainda, que o gabinete helênico rejeitou na sexta-feira, uma última oferta dos países da Zona do Euro, no sentido de prorrogar por mais cinco meses a dívida em troca de uma ajuda de Euros 16,3 bilhões. Essa injeção in extremis dos países da Zona do Euro, dependeria, no entanto, de a República Helênica concordar com as reformas...

            Até a votação do referendo a situação interna no sistema bancário e financeiro continua a evoluir. Dada a dimensão da corrida aos bancos, o governo grego determinou o fechamento dos bancos já no fim de semana. Por outro lado, o mercado de ações não funcionará na segunda. Além disso, imporá restrições nas retiradas de fundos e na transferência de numerário.

            O motivo principal da decisão da área financeira do Governo grego  de fechar temporariamente os bancos e impor os chamados controles de capital se deveu à iniciativa do Banco Central Europeu motivada pela corrente crise financeira helênica: o BCE fez saber que não estendeu programa de empréstimos de emergência que vinha dando suporte financeiro a bancos gregos nas últimas semanas, enquanto o Governo Tsipras se esforçava em chegar a acordo acerca da dívida com os credores internacionais.

             Como se verifica, o sistema financeiro europeu age em sincronia com a instância política de Bruxelas, como seria  de esperar. Sobrevinda a ruptura nas negociações da dívida – a causa do dissídio foi a declaração, considerada dissonante, do Primeiro Ministro Alexis Tsipras, de que deixava para o Povo grego decidir se devia ou não aceitar a última oferta dos credores.

             Ao expirar o prazo do programa de salvação, se realizará no próximo domingo cinco de julho o referendo que decidirá se o Povo grego aceita ou não as condições dos credores.

              Como outros países integrantes da União Europeia e da Zona do Euro, a República Helênica tem que tomar providências para superar as condições deficitárias de sua economia. As causas são conhecidas, e o principal erro está na falta de vontade política de sanar as causas do déficit estrutural para permitir a recuperação da economia helênica.

              O Governo Tsipras chegou ao poder sob uma bandeira de contestação irrealista à situação em Bruxelas. Ainda que gradualmente, Atenas precisa criar condições na própria economia e na sua previdência que atendam à necessidade de eliminar gastos abusivos ou desproporcionais, e procurar viver em uma economia que tenha perspectiva de equilíbrio e de contas sustentáveis.

               Talvez inebriado por uma importância que não corresponde à realidade, o gabinete de esquerda radical de Alexis Tsipras não se afigura infelizmente como êmulo de outros governos comunitários que souberam apertar o cinto e vencer o desafio. Demagogia nunca resolveu crise alguma.

               É necessário, no entanto, afirmar que não foi por acaso que povo helênico votou pelo governo do Syriza. Tal se deve ao fracasso do governo de direita da Nova Democracia que dispondo de condições relativamente mais favoráveis, tampouco teve a coragem de cortar os déficits na economia grega e corrigir o seu sistema previdenciário.

                O povo helênico, dentre as suas inúmeras qualidades,  é  gente trabalhadora. Sabe que para a economia doméstica não lhe venha a causar dívidas, os seus encargos devem sempre corresponder aos respectivos proventos. Não há milagres tanto nas finanças domésticas, quanto nas públicas. A diferença entre elas é apenas de dimensão. Por isso, a responsabilidade e a boa gestão das respectivas finanças caseiras é uma boa sinalização para ser aplicada  também na economia política nacional.

                 Se a gente grega, que tanto admirei quando de minha presença em Atenas em missão diplomática, aprecia e valoriza a oportunidade de pertencer à zona do euro, e dos benefícios consequentes, quero crer que é hora de enfrentar o problema com firmeza e boa disposição. Decisões apressadas e que possam parecer demagógicas devem ser evitadas, porque se tantos países, grandes, médios e pequenos, logram equilibrar as próprias contas, ou, recuperar o equilíbrio perdido, não por passes de mágica, mas pelo trabalho, o esforço conjunto e a busca de solução que garanta para a boa gente helênica uma situação estável, em que os direitos sejam respeitados, mas que não se procure viver acima dos respectivos meios.

                  A minha permanência aí, transcorrida nas comuns relações de respeito e amizade dos povos helênico e brasileiro, me dá confiança para acreditar que essa boa gente, que tanto valoriza o euro e as oportunidades que oferece, encontrará o caminho para continuar na Comunidade Europeia e na Zona do Euro.

 

( Fontes:  The New York Times, Folha de S. Paulo )                            

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