domingo, 7 de junho de 2015

Trincheiras da Liberdade 14

                                

Vitória da democracia



              Recip Tayyip Erdogan, que se acreditava o futuro presidente com plenos poderes na Turquia, pelo não hoje recebido do eleitorado turco, vai ter doravante mais tempo para pensar onde foi que errou.

               Perdendo a maioria absoluta, terá que se submeter ao jogo democrático, e tentar fazer um gabinete de coalizão.

               Erdogan vinha enfrentando uma série de manifestações contrárias. Autoritário, pensou obter nos presentes comícios os votos necessários para mudar a Constituição da Turquia. Tradicionalmente parlamentarista, e apesar de todo o aumento de seu poder nos últimos anos, com crescente autoritarismo, Erdogan pensou ter a força popular necessária para introduzir o presidencialismo.

              Não foi o que os comícios decretaram. O AKP, partido islâmico moderado, que é liderado por Recip Erdogan, perdeu a maioria absoluta.  Antes da chamada às urnas, tinha 327 cadeiras no Parlamento. Agora tem 258,  o que corresponde aos 41% obtidos no pleito. Ainda é a principal força política na assembléia turca, mas não mais tem os votos que lhe habilitariam a reformar a Constituição.

               Essa jogada de poder ele a fez com plena consciência de que pretendia mudar o modelo tradicional político de governança, e de que a resistência seria grande. Para tanto, afastou o Presidente Gum, que ocupava o cargo de natureza cerimonial. Pensava valer-se do título de presidente, com a sua competência aumentada.

               Na sua ânsia de assumir a Presidência, fez com que Ahmet Davutoglu, de ministro de relações exteriores passasse a Primeiro Ministro, enquanto ele afastava o titular anterior da Presidência. Dessarte, embora sob Constituição parlamentarista, assumiu a presidência, ainda não dispondo formalmente dos poderes executivos. Contou para isso com a boa vontade do auxiliar Davutoglu, como Primeiro Ministro.

                Com esse esquema, Erdogan pensava pôr as coisas como acreditava devessem estar. O seu problema é que na sua húbris esqueceu de combinar com o Povo soberano... Ao não conseguir a maioria absoluta no Parlamento, o AKP – e, como é óbvio o próprio Erdogan – fica subordinado às contingências do jogo político. O regime político da Turquia deverá continuar como está: parlamentarista.

                 O segundo partido no Parlamento é o Partido Republicano do Povo, que é o principal opositor dos projetos do chefe do AKP. A oposição atual recebeu 25% da votação.  Outro partido que teve a sua representação aumentada foi a representação dos curdos, que por primeira vez logra superar a barreira constitucional dos 10% (obteve 13% dos sufrágios) para tornar-se partido legal, com representação parlamentar.

                  Para que a democracia se consolide na Turquia, é importante que a minoria curda tenha um partido no Parlamento. Como se verifica, a oposição pública a Erdogan não se refletiu em um incremento sensível do Partido Republicano do Povo.

                  No entanto, ao negar-lhe a maioria absoluta, a vontade popular ainda admite que Erdogan permaneça como Primeiro Ministro. Deverá, no entanto, submeter-se às regras do regime assemblear e não terá as mãos livres para instaurar uma autoridade executiva mais forte. Para o povo turco, portanto, não semelha provável consiga Recip Erdogan implantar o regime presidencialista que desejava para aumentar – e de forma considerável - o respectivo poder. Se tais previsões se confirmarem, ganha a democracia, e ganha a opinião pública, a que os projetos autoritários de Erdogan, já em curso de implantação, viessem a restringir ainda mais as liberdades cívicas na pátria de Ata Turk.          

 

( Fonte: The New York Times)

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