São muitos os exemplos da atitude da elite dominante que apontam para o seu entranhado patrimonialismo. Esta pretensa confusão entre público e privado é uma herança longínqua do Estado brasileiro, mas tal não será desculpa para que se evite confrontar o problema, e não de forma para inglês ver.
Que o contágio haja sido, nos tempos coloniais, transmitido pela monarquia ibérica, e que, a despeito da resistência de alguns republicanos, tenha persistido até hoje, malgrado os diversos avatares do Estado brasileiro, diz muito das características desta elite.
Ver o bem público como oportunidade e não um encargo, já diz muito sobre o que se possa esperar da maior parte da elite, a que foi cometida sua gestão.
Muito se fala de reforma política. Contudo, é um discurso pré-eleitoral, que logo silencia após a diplomação dos eleitos. Todos sabemos que vige um sistema distorcido, seja no valor topográfico do sufrágio, com o desequilíbrio entre o Norte e o Sul, seja na esgarçada conexão entre representante e representado, em que muitos se prevalecem do voto confiado a poucos (e o fenômeno Tiririca pode ser havido como síntese dessa absurda situação).
Ainda nesse campo, com a ajuda do Supremo, se permite a proliferação das legendas de aluguel, com partidos que nada significam, excluídos os minutos que proporcionam de propaganda política, a qual oscila entre o absurdo e o grotesco. Se poucos hão de querer a ordem unida do unipartidismo, tampouco devemos descambar para o extremo oposto, que escarnece tanto da seriedade moral, quanto do bom senso político.
Para ficar nas tristes generalidas, cousa similar ocorre com os tributos. Ano após ano se empilha sobre as costas do brasileiro carga fiscal que seria abstrusa se não fosse iníqua. Desenvolvem-se engenhocas como a da impostômetro, para esfregar-nos na cara o que não é mistério para cada brasileiro.
Tampouco às promessas pré-comícios corresponde qualquer ação de governos constituídos e assembleias empossadas. Do odioso imposto e da proliferação das taxas, nada mais se diz. Ou ao contrário, como se a sarcina não fosse bastante, se aventa a possibilidade de ressuscitar o imposto do cheque. Revogado pelo Congresso, para imorredoura afronta do Presidente Lula, o providente Estado logo cuidou de substituí-la, para que o fardo carregado pelo povo não se tornasse mais leve.
Do respeito devido à separação entre as finanças públicas e os dispêndios privados, temos o confrangedor espetáculo de o quão pouco o levam em conta. Passada a faixa presidencial, o ex-presidente Lula viaja para São Bernardo do Campo no avião presidencial. Que se saiba, nenhuma voz na imprensa fez qualquer reparo a esse dispêndio destinado a um particular.
As férias do ex-presidente e consorte em próprio da União já não passaram em branca nuvem. Terá sido a convite do Ministro da Defesa, Nelson Jobim, mas ninguém quis informar quem está pagando as despesas da estada. Será à conta da Viúva, termo que sociologicamente semelha dizer muito sobre o respeito devido na sociedade brasileira à separação entre público e privado.
E há muitos outros exemplos, igualmente constrangedores, no campo das finanças. Veja-se o árduo embate entre o PT e o PMDB, pelas dotações da Saúde, notadamente a Fundação Nacional de Saúde (Funasa) e a Secretaria de Atenção à Saúde. Causa estranhável assombro tão acirrada disputa por esses postos. Afinal de contas, todos conhecemos o estado da saúde em nosso país, com o atendimento deficiente, as longas esperas, a falta de profissionais qualificados, e de estabelecimentos condignos, a par das carência no combate às endemias, como verificamos pelo crescimento do flagelo da dengue entre outros.
E, não obstante, as direções dos nossos dois principais partidos se engalfinham por assumir esses pesados encargos.
( Fonte: O Globo )
quinta-feira, 6 de janeiro de 2011
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