quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

Depois da Festança, a Conta

O último ano do governo do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi muito diferente dos primeiros, quando houve, em termos de finanças públicas, administração séria, com a preocupação da ortodoxia monetária.
Já em 2009 a orientação era bem diversa, os malabarismos e os artifícios financeiros buscavam suprir a inchação das despesas e a falta de recursos fiscais para tanto. Entrávamos no dúbio campo das capitalizações e dos truques contábeis, em manobras de fôlego curto, eis que os índices cedo denunciam os que, em matéria economico-financeira, não se atêm ao elementar dever de casa.
As artes de Lula e de seu Ministro Mantega se deviam sobretudo às pressões do ano eleitoral e, dentre elas, a maior que se resumia em fazer de Dilma Rousseff sua sucessora.
Em virtude de altíssima popularidade, do próprio carisma e por força dos erros da campanha adversária, o colimado objetivo foi atingido. Para tanto, inclusive, contou com a ajuda da deusa fortuna, eis que, se Marina Silva lograsse ultrapassar nos dias finais que antecediam ao três de outubro o candidato José Serra, outro poderia ter sido o resultado do segundo turno.
Hão de dizer que a condicional se, por não tratar da realidade, não introduz argumentos quantificáveis na política. Forçoso será reconhecer que o argumento é irrespondível, por mais que a dinâmica das pesquisas procure dizer-nos o contrário.
Feita a digressão, voltemos à situação atual. Dilma herdou de Lula economia aquecida, com baixo superavit fiscal, inflação com tendência para alta, menores saldos positivos na balança comercial e déficit no balança de contas correntes, que é suprido com aportes crescentes de aplicações a curto prazo, de caráter especulativo.
Decerto a nossa presente inflação não é do porte daquela chavista da Venezuela. No entanto, continua com viés de alta: há um mês atrás, o mercado projetava inflação de 5,29% para o corrente ano. Agora, a alça prevista dos preços se eleva para 5,42%, o que a distancia ainda mais da meta oficial, estipulada em 4,5% pelo governo.
O desequilíbrio entre receita e despesas para 2011 forçou a nova administração a anunciar cortes no orçamento. Não obstante, o controle maior da inflação tem de ser realizado pelo incremento da taxa Selic – a taxa oficial bancária estabelecida pelo Comitê de Política Monetária – e é por tal razão que o Copom, ora presidido por Alexandre Tombini, elevou a taxa básica de 10,75% para 11,25% ao ano, que é o maior patamar desde março de 2009.
O BC diante das pressões inflacionárias, com o aquecimento da demanda e a incapacidade da oferta de satisfazê-la plenamente, a única saída está no encarecimento do crédito. Por sua vez, o governo Dilma pode colaborar, cortando despesas.
Assinale-se, contudo, que dada a inchação da máquina pública (incluídas as estatais) e a falta de elasticidade dos dispêndios de custeio, muita vez os esforços de incrementar o superavit fiscal primário (o montante reservado para o pagamento dos juros da dívida pública), se tem efeito benéfico para a redução da pressão inflacionária, tende a diminuir o montante disponível para investimentos.
A Presidenta Dilma Rousseff, no seu discurso de posse no Congresso, aludiu a duas reformas – a política e a tributária. O pouco entusiasmo da classe política com essas duas reformas se traduziu no ensejo pelo débil e formal aplauso com que a menção foi saudada.
É árdua a discussão sobre qual reforma seria a mais urgente. Ambas na verdade o são, mas se nos deparamos com uma escolha de Sofia, a palma deveria ir para a política. Saneados os meios e os quadros políticos, com o voto do eleitor tendo o mesmo peso político do Oiapoque ao Chuí, com os partidos políticos reduzidos a menos de meia-dúzia, com o Congresso atuante e respeitado como Poder Legislativo, o Senado livre dos suplentes e dos atos secretos, da Câmara com representantes distritais plenamente responsáveis perante o Povo que representa – se alcançar-se tudo isso, o demais se poderá pretender por acréscimo, inclusive a reforma tributária e demais instrumentos no combate à corrupção, que é o maior, mais iniquo e pernicioso imposto que grava a nossa gente.

( Fonte: O Globo )

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