Os
candidatos pró-democracia obtiveram grande vitória, neste domingo, 24 de
novembro, nas eleições distritais, em Hong Kong. O apoio dado pelos eleitores, e a consequente
votação, fortalece os protestos pela autonomia do território,
aumenta a pressão sobre a governadora Carrie Lam, e manda um recado para os
trogloditas de Beijing, que são forçados a engolir a poção amarga da
democracia, que é a antítese do poder como é visto pelo sistema opressivo encimado
por Xi Jinping.
A
vitória da democracia foi construída apesar da repressão aos protestos,
traduzida pela política negativista do enfrentamento à liberdade, em todas as
suas formas. Ela igualmente fortalece não apenas as manifestações, senão e
sobretudo o resultado delas, expresso pela maioria obtida, com 347 das 452 cadeiras
de conselheiros distritais (antes tinham 124). É de notar-se que os aliados do
governo da China conquistaram apenas 60 assentos - os 45 conselheiros restantes
são independentes. Em outras palavras, a autonomia de Hong Kong está escudada
pela maioria absoluta dos conselheiros distritais.
A relevância dessas eleições mostra que as
demonstrações dos ativistas pró-democracia não foram em vão. A população
entendeu a sua mensagem e lhes dá a maioria nos conselhos distritais. Toda luta
contra a opressão presume persistência: e ela se vê por vez primeira
recompensada mais pela resposta da população, que começa a entender que os
regimes de força só entendem reações que de algum modo busquem construir as
bases de uma reação em que as perspectivas de sucesso não dependam dos
ocasionais caprichos de seus opressores.
Habituados à fase que poderíamos
chamar dos estertores do imperialismo britânico, já encanecido e incapaz politicamente
de reter o entreposto que outrora arrebatara, na fase de fulgor do
intervencionismo ocidental, lançara as condições para a cessão de Hong Kong, como
que lançando véus que disfarçassem de alguma forma o pendor autoritário que
caracteriza o comunismo chinês. Como todo véu, porém, eles não passam de forma
veleitária de emoldurar o verdadeiro significado da cessão do território.
A democracia, no entanto, esse
dom magnífico da civilização helênica, no seu aspecto por vezes frágil aos
olhos cínicos dos tiranos, pode representar um perigoso e falso embuste para os
déspotas de cada ocasião histórica.
A sua aparente singeleza tem o
viço de irreprimível encanto, porque é expressão do desejo corriqueiro de ter
voz no próprio quintal. As democracias têm na sua igualdade o filtro secreto
que lhes permite enfrentar os poderosos da vez, porque podem valer-se de todos
os mendazes artifícios de fraqueza circunstancial, enquanto sabem esconder, sob
o véu de gestos porventura enganosos, intenções que vão muito além dos sorrisos
da cortesã, ou da aparente torpeza do camponês.
(
Fonte: O Estado de S. Paulo )
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