Talvez
o título inglês - Joker - reflita melhor o sentido do filme, trazendo o espírito
de contestação, de forma acintosa e
agressiva, na raiva do diretor Todd Phillips quanto ao viés provocativo
na temática do personagem principal - o Joker,
que é o coringa do baralho, mas também aquele que agride o público com o seu
humor cáustico, enquanto essa gente formaria o quadro de cena burguês.
Não é à toa que a reação do
personagem principal vem ajaezada em agressivo humorismo, de que o riso, por
vezes gutural, por vezes no limite de um aceno iminente à compulsiva violência,
aparece como a ur - básica - reação
da figura que se esgueira pelas ruelas mais de Gotham city, da literatura em quadrinhos, do que propriamente de
New York, como a revolta desse Joker,
admiravelmente representado por Joaquin Phoenix que está aí, perante o
espectador - em todas as suas irrupções - para lembrá-lo da raivosa contestação
que traz, tanto no seu rictus facial, quanto nos seus eventuais
improvisos, que os novos proletários do século XXI verbalizam, agridem mesmo com o seu humor,
que é mais questionador do que revolucionário, a todos aqueles a quem
responsabilizam como se fossem cúmplices de um quadro em que o humor tem de ser
cruel e agressivo, como na reação que já se delineia nas primeiras cenas desse Coringa,
ainda um joão ninguém na selva
violenta de jovem e bastardo proletariado, que despeja a sua raiva no joker desconhecido e, por isso,
irrelevante. Com efeito, o espectador se vê transportado para uma meta-realidade, que o surpreende pelo
seu potencial agressivo e contestador.
Não será tampouco surpresa
que esta evocação da literatura em quadrinhos feita pelo diretor Todd Phillips
nos traga junto a atmosfera hobbesiana de uma pré-história com que nos
confronta o filósofo inglês, que tão bem descreve, em frases que mais parecem
uma série de estocadas aquele projeto de sociedade agressiva, brutal e cruel,
com vidas bruscamente cortadas, que o submundo da Gotham city dos quadrinhos constitui uma sobrexposição. E não há
negar que a obra de Todd Phillips, com esse coringa (joker) traz a violência antiga para o submundo de sombras, cortiços
e do labirinto do metrô,em que vive o proletariado do século XXI.
Não é por acaso igualmente
que as homenagens a Charlie Chaplin
estejam aí presentes - a despeito de sua
distância no tempo - por mais que o rictus
dos personagens do proletariado de Gotham
City, assim como as referências ao maior diretor de todos os tempos - que
mostram a permanência dessa emblemática figura de um cinema que é imortal na
sua contextualidade crítica - e decerto não foi por acaso que o establishment cinematográfico americano
reservaria a Chaplin, este gigante da Sétima Arte apenas um
modesto Oscar por conjunto de obra...
Deve-se ter outrossim em mente, que essa nova obra
prima do cinema americano possui também a capacidade de afrontar, de irritar, quem
sabe mesmo exasperar o estamento burguês que não cessa de mostrar o próprio
desagrado, em que certos personagens tendem a reclamar, a exprobar mesmo, as
formas para eles agressivas e perturbadoras que possam revestir esses novos figurinos da Sétima Arte, que nos mostram, bem longe
do tartamudear burguês, um estro tão presente na própria agressividade, que há
de exasperar talvez aos Messieux Dupont, irá gritar, seja nas praças, seja
nos novos meios de comunicação, o seu
estentórico presente! pelo qual toda
forma artística bate no chão comum o reclamo que atravessa os tempos, em que
afirma seja pela Sétima Arte, seja por outras que a precederam, e até mesmo
pela literatura em quadrinhos, como deparamos na Gotham City, que a beleza na humana expressão não conhece
restrições burguesas, como já no passado nos ensinam aqueles que rasgaram as
burocráticas compartimentações.
(
Fontes: Coringa, de Todd Phillips;
Charlie Chaplin; Hobbes; literatura em quadrinhos )
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