Mais um livro de um
protagonista - ainda que efêmero - da Administração Trump e do final da de
Barack Obama.
Como todo livro desse gênero, nota-se
o esforço de Michiko Kakutani, a crítica a quem incumbe avaliar o trabalho de Comey
para os leitores do New York Times, de proceder a um ato de equilibrismo entre
os dois principais personagens da estória de que o autor participa.
Dessarte, Kakutani sublinha que tanto na
sua tese universitária de 1982, sobre religião e política, quanto na presente
memória se assinala até que ponto o trabalho
de Reinhold Niebuhr penetra na sua obra.
Assim, ela assinala longas passagens no trabalho
universitário de Comey dedicados aos
dois tipos de orgulho que, segundo
Niebuhr, podem afetar ao ser humano: tanto o orgulho moral, quanto o
espiritual, que podem conduzir ao pecado do auto-convencimento moral. E no seu livro, "Uma Lealdade mais alta"
Comey dá ao leitor um inventário de seus defeitos, afirmando que ele pode ser
"teimoso, orgulhoso, super confiante e levado pelo próprio ego".
Tais características podem algumas
vezes - e infelizmente - serem notadas na sua narração acerca do tratamento
dado por ele à investigação dos emails
de Hillary Clinton. Nessa conferência de imprensa, de julho de 2016, quem sabe
movido por tais imperativos morais, ele se permitiu descrever, de uma forma
muito próxima da grosseira, o seu (de Hillary) manuseio como "extremamente descuidado" de
"informação altamente confidencial e muito sensível", ainda que o Bureau haja recomendado que nenhuma acusação fosse registrada
contra ela.
Ainda há outro aspecto negativo
naquele anúncio por ele improvisado, eis que fora realizado sem coordenação com
a direção do Departamento de Justiça e deu mais detalhes do que as habituais
avaliações prestadas pelo Bureau.
Não obstante essa postura negativa, haveria
ainda outra e mais danosa "revelação" a 28 de outubro de 2016, onze
dias antes da eleição, no período imediatamente anterior à chamada votação
antecipada (que é um costume estadunidense) dos eleitores que desejam votar
antes da data reservada à eleição em novembro de 2016. Pois nesse dia ele mandou nova correspondência
ao Congresso, avisando que o FBI estava analisando outros e-mails (encontrados no computador do marido afastado de Huma
Abedin, a secretária de Hillary), que poderiam ser pertinentes à investigação anterior.
Essa iniciativa, no mínimo
controversa, foi feita porque ele, Comey pensara, influenciado pelas prévias da
mídia, que Clinton iria vencer. Nesse
sentido, para tomar mais aquela iniciativa,
ele se pergunta amiúde se não foi influenciado por aquela premissa: "É inteiramente possível que, por motivo
de estar tomando decisões em um ambiente em que assumia que Hillary Clinton
seria certamente a próxima presidente, a minha preocupação de fazer dela (sic) um presidente ilegítimo ao ocultar
a recomeçada investigação pesou mais forte de o que teria se a eleição
aparecesse como de mais difícil previsão ou se Donald Trump estivesse à frente
nas prévias. Mas eu não sei."
Nesse sentido, acrescenta esperar
"muito mesmo que o que ele fez não tenha sido um fator determinante na
eleição." A tal propósito, no seu
testemunho ao Comitê Judiciário do Senado, a três de maio de 2017, Comey chegou a dizer que a própria ideia de
que suas decisões possam ter tido um impacto no resultado da eleição
presidencial o deixaram sentindo-se "levemente
nauseado"...
Que uma pessoa de nível hierárquico
inferior - a despeito de sua suposta auto-apreciação - haja podido projetar uma
tal influência no resultado dessa eleição, se deveria talvez procurar em nível
mais alto da governança estadunidense, pois será sempre de estranhar-se que o
governo democrata haja permitido que funcionários de nível inferior ao de
gabinete tenham podido tomar iniciativas que foram muito além ao que costuma
ser a orientação do Departamento de Justiça ao ensejo de eleições
presidenciais, evitando tomar medidas que possam influenciar o resultado da
eleição.
( Fontes: The New York Times, What Happened, de Hillary Clinton )
Nenhum comentário:
Postar um comentário